Desmatamento e clima elevam risco de incêndios
11 de janeiro de 2020Depois de meses de extremo calor e seca na Austrália, vieram os incêndios florestais. O fenômeno aflige o país todos os anos, mas desta vez eles têm sido particularmente extremos – e o verão no Hemisfério Sul está apenas começando.
Até então, 8 milhões de hectares foram destruídos pelas chamas, 25 pessoas e milhões de animais perderam a vida. Regiões inteiras ficaram sem energia e nuvens de fumaça cobrem metade do continente, de acordo com uma avaliação preliminar dos fogos devastadores.
Mas a Austrália não é o único lugar com incêndios florestais. Em 2019, a plataforma online de vigilância Global Forest Watch Fires (GFW) contabilizou em todo o mundo mais de 4,5 milhões de incêndios com ao menos um quilômetro quadrado de extensão. Isso representa um total de 400 mil incêndios a mais que em 2018.
"O número e tamanho dos incêndios variam de ano para ano, mas a grande tendência é que o risco aumentar globalmente", disse Susanne Winter, gerente de programas florestais da organização Fundo Mundial para a Natureza (WWF) na Alemanha, em entrevista à DW.
Os motivos por que os fogos se iniciam e mantêm são complexos, mas especialistas apontam para uma conexão entre o aumento do risco de incêndios e as temperaturas mais altas dos oceanos como resultado das mudanças climáticas.
Estima-se que os gases causadores do efeito estufa elevaram a temperatura média da Terra em 1 grau Celsius desde o século 19. A superfície do mar também registrou um aquecimento de 0,8ºC.
Quanto mais quente ficam os oceanos, menos energia e CO2 a água é capaz de absorver da atmosfera e armazenar. Como explica Karen Wiltshire, vice-diretora do Instituto Alfred Wegener de Pesquisa Marinha e Polar, os oceanos "são como o ar condicionado do planeta".
As consequências podem ser devastadoras. Caso os mares continuem a se aquecer, terão enorme impacto climático, desde temperaturas extremas, tempestades e secas, até inundações e estações chuvosas tardias, desestabilizando os ecossistemas.
Quando ventos fortes atravessam paisagens quentes e secas, como as da Austrália, o risco de incêndios aumenta significativamente. Mas esse risco também tem aumentado em regiões em que antes o clima era temperado e fresco.
Fogo até no Ártico
Além dos grandes incêndios na Europa e na Califórnia, o ano de 2019 também registrou incêndios no Ártico, "o tipo de incêndio que nunca tínhamos visto", afirma Clare Nullis, da Organização Meteorológica Mundial (OMM).
O Alasca contabilizou temperaturas recordes de até 32ºC, que criaram condições para o alastramento. De acordo com a OMM, a expectativa é de uma quantidade de incêndios florestais no Hemisfério Norte em escala recorde para os últimos 10 mil anos.
Em Alberta, no norte do Canadá, em meados de 2019 centenas de incêndios queimaram durante meses mais de 800 mil hectares de terra. Segundo estimativas das autoridades russas, na Sibéria foram queimados cerca de 9 milhões de hectares de floresta – uma área maior que Portugal. A fumaça tóxica cobriu aldeias e cidades.
Incêndios são, na verdade, um processo natural de regeneração e renovação dos ecossistemas. No entanto, 96% dos incêndios no mundo têm sido deflagrados deliberada ou acidentalmente por seres humanos. Apenas 4% dos incêndios se iniciaram naturalmente – por exemplo, devido a raios –, de acordo com um relatório da WWF.
Muitas áreas são limpas por meio do método de corte e queima, a fim de preparar o terreno para agricultura, pecuária ou indústria, particularmente na Amazônia.Na Indonésia, mais de 27 milhões de hectares de floresta foram destruídos desde 1990, em favor da indústria de papel e óleo de palma.
África e Amazônia
Dados do Global Forest Watch Fires mostram que estão ocorrendo muitos incêndios na África, desde o Sudão do Sul à África Ocidental. Especialistas dizem que a alta densidade demográfico levou ao consumo cada vez mais intenso dos recursos naturais, significando que os ecossistemas têm cada vez menos tempo para se recuperar. E os incêndios também estão se tornando mais comuns.
"A principal razão para isso é o uso generalizado do cultivo itinerante", explicou Winter. "Proprietários de terra e agricultores usam o fogo para limpar seus campos, a fim de se livrar rapidamente da vegetação e tornar o solo fértil em curto prazo." Alguns desses incêndios podem sair do controle, levando a incêndios florestais de proporções maiores.
Em 2019 houve a maior incidência de incêndios na América do Sul em nove anos. Grandes áreas de floresta foram derrubadas para agricultura na Região Amazônica, e "isso não foram causas naturais", frisa Nullis.
"Os incêndios florestais no Brasil são politicamente motivados", observa Winter, "é claro que não podemos compará-los aos incêndios na África." Ele lembra que 30 anos atrás a Amazônia era tão úmida que incêndios como os vistos atualmente não seriam possíveis. No entanto a região está se tornando cada vez mais seca, devido ao desflorestamento crescente.
O desmatamento, as mudanças climáticas e o risco de incêndios florestais estão todos diretamente conectados. "O que ocorre aqui é um efeito de retroalimentação", explica Winter. "Mais desmatamento significa um aumento nas mudanças climáticas, o que aumenta as chances de a vegetação secar, o que, por sua vez, aumenta o risco de incêndios, e assim por diante."
E os incêndios incrementam a concentração dos gases-estuda na atmosfera. Segundo o Greenpeace, todos os anos cerca de 8 bilhões de toneladas de CO2 são liberadas por incêndios. Isso equivale a cerca da metade das emissões causadas pela queima de carvão em todo o mundo.
Os incêndios na Austrália já liberaram metade do volume de CO2 que o país produziria durante um ano típico. E as colunas de fumaça agora estão se espalhando pelo Pacífico, em direção à Argentina e ao Chile.
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