Desperdiçar comida é um ato também contra o clima
25 de abril de 2019Chove a cântaros no dia em que Jonas Korn escolheu para resgatar da lata de lixo as sobras da padaria. É sábado, meio-dia, encerramento de expediente na padaria Falland, no sul de Leipzig, cidade do extremo leste alemão. A vendedora já separou cinco assadeiras com bolos, rosquinhas e tortas de frutas em um longo balcão na entrada da loja. Atrás dela, dez caixas empilhadas com pãezinhos e croissants. "Com isso, daria para encher uma lata de lixo de 120 litros", diz o estudante de 26 anos.
Para que os produtos de panificação não vendidos não acabem na lixeira, mas possam ser distribuídos e consumidos em tempo hábil, Jonas tem a companhia de três outros membros da organização Foodsharing. A plataforma online conecta mais de 50 mil salvadores de alimentos a empresas que preferem entregar comida de graça em vez de jogá-la fora.
"De acordo com estimativas de 2011, um terço de todos os alimentos produzidos globalmente acaba no lixo", diz Rosa Rolle, líder de projeto Perda e Desperdício de Comida da FAO, a agência da ONU para alimentação.
No total, são 1,3 bilhão de toneladas de alimentos por ano que não são consumidos. Coletivamente, estima a FAO, os resíduos alimentares têm uma pegada de 3,6 gigatoneladas de dióxido de carbono.
Não estão incluídas aqui as emissões de CO2 decorrentes do desmatamento de florestas - por exemplo, para dar lugar à pecuária ou a plantações de soja ou óleo de palma. Se a produção de alimentos fosse um país, seria o terceiro maior emissor de CO2 do mundo, atrás dos EUA e da China.
A maior parte do desperdício de alimentos vem dos países industrializados de alta renda. Segundo estimativas da FAO, os europeus jogam fora uma média de 95 quilos de comida por pessoa por ano. Nos países africanos de baixa renda ao sul do Saara, são apenas seis quilos.
Alguns grupos de alimentos exigem mais recursos do que outros. A carne é, de longe, o maior vilão do clima entre os alimentos, em parte porque o gado e outros ruminantes geram grandes quantidades de metano - um gás de efeito estufa que é cerca de 25 vezes mais nocivo ao meio ambiente do que o CO2. No caso das vacas, são várias centenas de litros de gases por dia. Como resultado, cerca de 13 quilos de CO2 são liberados por cada quilo de carne bovina, diz a organização ambientalista Greenpeace. Para um típico pãozinho, no entanto, são apenas 0,75 quilos de CO2.
A carne jogada fora é muito mais problemática em termos climáticos do que a maioria dos alimentos vegetais. Isso torna ainda pior o fato de que 20% das carnes e salsichas produzidas no mundo todo acabem no lixo. Tal montante equivale a 75 milhões de vacas por ano, segundo a FAO.
"Apesar de alguns avanços e boas iniciativas de redistribuição, muitos alimentos ainda acabam em aterros. Lá eles acabam contribuindo ainda mais com a liberação de gases prejudiciais ao clima na atmosfera", diz Rolle. Independentemente de se tratar de pão ou carne, o problema é que, uma vez em aterros sanitários, os resíduos alimentares continuam a promover mudanças climáticas, pois lá apodrecem e acabam por liberar gás metano.
"Na UE, por exemplo, este ainda é o caso da pequena nação insular de Malta", diz Stefanie Siebert, da ECN, associação que reúne os interesses de empresas europeias da indústria de resíduos biológicos. Embora o gás metano de aterros possa ser capturado e usado para gerar eletricidade, isso só acontece quando o local é fechado. "Enquanto resíduos ainda estão sendo transportados para o aterro, os gases prejudiciais ao clima escapam para a atmosfera", explica. Mas quais são as alternativas?
"Em primeiro lugar, temos que tentar evitar o desperdício de comida", afirma Siebert, acrescentando que ter uma compostagem própria no jardim certamente já é uma boa contribuição. Mas no final das contas, isso não será possível sem uma reciclagem ecológica do desperdício de alimentos em nível industrial. Isso poderia se dar, por exemplo, em usinas de biogás, onde os produtos de decomposição gasosa do desperdício de alimentos podem ser usados com muito mais eficácia do que no aterro.
Dessa forma, são gerados continuamente eletricidade e calor, que, a depender do sistema, também podem ser injetados na rede. O que sobra é o produto de fermentação, uma espécie de escória: "Este produto residual das usinas de biogás é bastante líquido", diz Siebert. Compostado com material lenhoso, pode ser usado para fazer um composto de alta qualidade. Mas, até agora, apenas 17% dos resíduos orgânicos dentro da UE passam pelo processo de compostagem ou fermentação.
Isso também acontece em Leipzig, mas para Jonas Korn e seus três colegas não há razão para desperdiçar comida: "Se fosse, assim, poderíamos jogar todo o supermercado na usina de biogás de uma vez", brinca Korn. Cada um dos quatro carrega de três a quatro sacolas grandes e cheias da pequena padaria. "Muito disso como eu mesmo, muito distribuo no meu círculo de amigos e conhecidos", diz Carolina, uma jovem que também se encheu de sacolas diligentemente. Mas a prioridade, enfatiza Korn, é para instituições sociais.
Ele se certifica mais uma vez que todas as sacolas estão bem seguras no reboque da bicicleta. A chuva não deu nenhuma trégua. "Espero que não fique tudo molhado", reflete por um instante, antes de sair pedalando.
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