Em carta, economistas exigem medidas de combate à pandemia
21 de março de 2021Centenas de economistas e banqueiros renomados divulgaram uma carta aberta neste domingo (21/03) em que exigem dos governantes brasileiros medidas efetivas contra o avanço do coronavírus no país. O documento já possui mais de 500 assinaturas.
Entre os nomes que referendam a carta estão os ex-ministros da Fazenda Pedro Malan, Maílson da Nóbrega, Marcílio Marques Moreira e Ruben Ricupero, e os ex-presidentes do Banco Central Armínio Fraga, Affonso Celso Pastore, Gustavo Loyola, Ilan Goldfajn e Pérsio Arida.
Também há pessoas ligadas ao mercado financeiro, incluindo o conselheiro do Itaú Unibanco, Pedro Moreira Salles, e o presidente do Credit Suisse, José Olympio Pereira.
Segundo a imprensa brasileira, a carta será enviada na próxima semana aos chefes dos três poderes: o presidente Jair Bolsonaro e os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, do Senado, Rodrigo Pacheco, e do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux.
Os economistas e banqueiros alertam para a "situação econômica e social desoladora" enfrentada atualmente pelo país, que se tornou "o epicentro mundial da covid-19, com a maior média móvel de novos casos" no mundo, e menciona o quadro "alarmante" do sistema de saúde brasileiro, com o esgotamento dos recursos na grande maioria dos estados e insuficiente número de leitos de UTI, respiradores e profissionais de saúde.
O grupo detalha também como a pandemia assolou a economia brasileira, com uma taxa de desemprego por volta de 14%, "a mais elevada da série histórica", e observam como a contração do PIB, de 4,1% em 2020, afetou "desproporcionalmente trabalhadores mais pobres e vulneráveis".
"Esta recessão, assim como suas consequências sociais nefastas, foi causada pela pandemia e não será superada enquanto a pandemia não for controlada por uma atuação competente do governo federal", destacam os signatários da carta.
Os economistas ainda denunciam que o governo do presidente Bolsonaro, um negacionista da covid-19, "subutiliza ou utiliza mal os recursos de que dispõe, inclusive por ignorar ou negligenciar a evidência científica no desenho das ações para lidar com a pandemia".
Por isso, defendem a adoção de políticas públicas com base em dados, experiência internacional bem-sucedida e evidências científicas.
"Estamos no limiar de uma fase explosiva da pandemia, e é fundamental que a partir de agora as políticas públicas sejam alicerçadas em dados, informações confiáveis e evidência científica. Não há mais tempo para perder em debates estéreis e notícias falsas. Precisamos nos guiar pelas experiências bem-sucedidas, por ações de baixo custo e alto impacto, por iniciativas que possam reverter de fato a situação sem precedentes que o país vive."
Para conter o coronavírus, eles sugerem e detalham quatro medidas "indispensáveis": acelerar o ritmo de vacinação; incentivar o uso de máscaras, com distribuição gratuita e orientação educativa; implementar medidas de distanciamento social no âmbito local com coordenação nacional; e criar um mecanismo de coordenação do combate à pandemia em âmbito nacional.
Vacinação como prioridade
Para o grupo, a saída definitiva da crise requer a vacinação em massa da população, que se coloca como uma questão ainda mais urgente devido ao surgimento de variantes mais contagiosas do coronavírus. "Infelizmente,estamos atrasados", diz o texto, lembrando que, no ritmo atual, o Brasil levaria mais de três anos para vacinar toda a população. "As consequências são inomináveis."
"Vacinas são relativamente baratas face ao custo que a pandemia impõe à sociedade", afirmam. "Elas têm um benefício privado e social elevado, e um custo total comparativamente baixo. Poderíamos estar em melhor situação, o Brasil tem infraestrutura para isso. Em 1992, conseguimos vacinar 48 milhões de crianças contra o sarampo em apenas um mês."
Segundo os economistas, o problema está "na negligência com as aquisições" de doses da vacina por parte do governo. "A insuficiente oferta de vacinas no país não se deve ao seu elevado custo, nem à falta de recursos orçamentários, mas à falta de prioridade atribuída à vacinação."
Em meio aos esforços para a aquisição de doses e a aceleração da imunização, o grupo classifica como urgente e essencial o reforço de medidas de distanciamento social, bem como a introdução de incentivos e políticas públicas para uso de máscaras mais eficientes, "em linha com os esforços observados na União Europeia e nos Estados Unidos".
Colaboração nacional
"O quadro atual ainda poderá deteriorar-se muito se não houver esforços efetivos de coordenação nacional no apoio a governadores e prefeitos para limitação de mobilidade", diz o texto.
O pedido pela colaboração entre governos federal e estaduais ocorre num momento em que Bolsonaro tenta derrubar, junto ao STF, decretos dos governos da Bahia, Distrito Federal e Rio Grande do Sul que determinam restrições na circulação de pessoas.
Na ação, o presidente argumenta que o fechamento de atividades não essenciais durante a pandemia só pode ser determinado por lei aprovada no Legislativo e não por decretos de governadores.
Na contramão do resto do mundo, Bolsonaro vem minimizando a gravidade da doença e atacando essas medidas restritivas desde o início da crise, preferindo, em vez disso, apostar em drogas que se comprovaram ineficazes contra o vírus, como a cloroquina.
"Falso dilema"
Ao se declarar contrário a medidas de lockdown, o presidente alegou diversas vezes que a economia não pode parar. Para os economistas, no entanto, trata-se de um "falso dilema entre salvar vidas e garantir o sustento da população vulnerável".
"Na realidade, dados preliminares de óbitos e desempenho econômico sugerem que os países com pior desempenho econômico tiveram mais óbitos de covid-19", afirma a carta, lembrando que mesmo países que optaram inicialmente por evitar o lockdown acabaram adotando-o diante do agravamento da pandemia, como o Reino Unido.
"Estudos mostraram que, diante da aceleração de novos casos, a população responde ficando mais avessa ao risco sanitário, aumentando o isolamento voluntário e levando à queda no consumo das famílias mesmo antes ou sem que medidas restritivas formais sejam adotadas", acrescentam.
"A recuperação econômica, por sua vez, é lenta e depende da retomada de confiança e maior previsibilidade da situação de saúde no país. Logo, não é razoável esperar a recuperação da atividade econômica em uma epidemia descontrolada", destacam os especialistas.
Eles defendem ainda que, enquanto a pandemia continuar assolando o país, medidas que apoiem a população mais vulnerável, como o auxílio emergencial, são fundamentais. Ações de apoio às pequenas e médias empresas também se fazem necessárias, afirmam.
O Brasil atravessa hoje seu momento mais grave da epidemia de covid-19. Nesta semana, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) afirmou que o país passa pelo "maior colapso sanitário e hospitalar da história".
A média móvel de mortes ligadas à doença chegou a 2.234 neste sábado, batendo um novo recorde pelo 22º dia consecutivo. O sistema de saúde está em colapso, e hospitais enfrentam escassez de leitos e alertam para falta de medicamentos para intubação de pacientes.
ek (ots)