Em meio a impasse com EUA, Kim se volta para a Rússia
24 de abril de 2019O trem blindado do líder da Coreia do Norte, Kim Jong-un, viajou 684 quilômetros de Pyongyang até Vladivostok, no extremo oriente da Rússia. De lá, o líder norte-coreano seguirá de limusine até a ilha Russky, onde se encontrará com o presidente da Rússia, Vladimir Putin, nesta quinta-feira (25/04).
Este será o primeiro encontro entre os dois, e não por falta de interesse do presidente russo. Desde que Kim começou sua investida diplomática, em 2018, a Rússia já o convidou várias vezes para uma visita.
O Kremlin divulgou que, além das relações bilaterais, o foco principal da cúpula será a desnuclearização da Península Coreana. Mas o especialista russo Konstantin Aslomov, do Centro de Estudos Coreanos da Academia de Ciências da Rússia, diz que o mais importante para o seu país não é a desnuclearização, mas a estabilidade na Península Coreana.
"Não precisamos de mais um conflito nas nossas fronteiras", explica. Por isso, é importante ajudar a manter o diálogo.
O encontro entre Kim e Putin ocorre num momento em que as negociações entre a Coreia do Norte e os Estados Unidos estão travadas. A segunda cúpula entre o presidente Donald Trump e Kim, em fevereiro, em Hanói, foi encerrada de forma abrupta e com a delegação americana afirmando que a Coreia do Norte exigira o fim de todas as sanções econômicas, algo que os norte-coreanos negaram.
Depois disso, o governo em Pyongyang anunciou, no início deste mês, que testou uma nova "arma tática guiada", dando a impressão de que quer exibir força. Um porta-voz do Ministério do Exterior do regime também exigiu que o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, seja excluído das conversações e pediu "alguém que mostre maior tato e maturidade na hora de se comunicar".
Aslomov avalia que Kim está apenas "diversificando sua política externa" com o seu encontro com Putin, e que o evento não pode ser visto como uma tentativa do Kremlin de mostrar que pode ser um negociador mais eficiente do que os Estados Unidos.
Mas outros analistas veem o encontro como um movimento de poder. "Basicamente, trata-se de uma atração secundária na saga entre Pyongyang e Washington", avalia Dmitry Trenin, chefe do Carnegie Research Center em Moscou.
Trenin diz que a cúpula com Putin permite à Coreia do Norte mostrar que tem outras opções na política externa. Já para a Rússia, trata-se de "somar pontos diplomáticos com uma demonstração de relevância".
De qualquer forma, a Rússia está mantendo todas as partes envolvidas informadas sobre o processo. Ao que tudo indica, o encontro entre Kim e Putin foi debatido por diplomatas russos com representantes de Washington na semana passada.
A Rússia também parece estar mantendo a China informada. Logo depois do encontro com Kim, Putin viajará para Pequim para participar de um fórum sobre a iniciativa "Nova Rota da Seda", a menina dos olhos do presidente chinês, Xi Jinping. Oficialmente, Putin e Xi não falarão sobre a Coreia do Norte, mas é pouco provável que isso não aconteça.
Em 2017, a China e a Rússia criaram um mapa para encerrar a crise da Coreia do Norte. Antes do encontro com Kim, o Kremlin enfatizou a importância do plano e afirmou que, por enquanto, tudo corre como o planejado: a primeira fase do plano, na qual a Coreia do Norte encerra seus testes de mísseis e os Estados Unidos encerram seus exercícios militares conjuntos com a Coreia do Sul, já teria sido executada.
Agora começa a segunda parte, afirmou o Kremlin, na qual estão previstas negociações mais complexas. Moscou disse que pretende apoiá-las.
A Rússia poderá se tornar uma intermediária importante para a Coreia do Norte nas negociações envolvendo o arsenal nuclear do regime. Os dois países têm uma longa história de colaboração. A União Soviética foi a primeira aliada da Coreia do Norte e a principal apoiadora do avô de Kim, Kim Il-sung, o primeiro líder norte-coreano.
Os interesses econômicos de Kim certamente ajudarão na aproximação entre os dois países. Em 2018, o comércio entre eles caiu muito devido às sanções do Conselho de Segurança à Coreia do Norte. A Rússia também teve de reduzir o número de trabalhadores norte-coreanos em seu território de cerca de 30 mil para 10 mil. Os valores que eles enviavam para casa eram uma fonte vital de acesso a moeda estrangeira para a Coreia do Norte.
Agora, segundo Aslomov, Kim está em busca de oportunidades econômicas para impulsionar a economia estagnada de seu país. O especialista avalia que Putin e Kim provavelmente debaterão o que pode ser feito na cooperação econômica em setores que ainda não estão sob efeito de sanções.
Há ainda um outro aspecto que pode dar à Rússia um papel importante nas negociações sobre a desnuclearização da Península Coreana. A Rússia sempre se opôs à política ocidental de convencimento e pressão econômica sobre a Coreia do Norte – Putin, afinal, sabe bem o que é ser alvo de sanções econômicas.
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