De novo na moda
19 de dezembro de 2011Após o divertido Deutsch, Biografie einer Sprache (Alemão: biografia de uma língua), de 2009, o linguista Karl-Heinz Göttert agora promove uma expedição pelos dialetos alemães com sua nova obra, intitulada Alles außer Hochdeutsch (Tudo menos Hochdeutsch, nome dado à variante oficial do alemão).
No livro ele aborda, entre outros temas, como os dialetos mudaram, por que o saxão tem pior fama do que outros dialetos do alemão e por que em tempos de globalização os dialetos ganham ainda mais apelo emocional em todo o mundo.
Deutsche Welle: Antigamente se olhava torto para quem falava dialeto. Era considerado algo provinciano e um sinal de falta de formação educacional. De onde vem essa nova valorização dos dialetos?
Karl-Heinz Göttert: Desde os anos 70 existe uma maior aceitação dos dialetos e acredita-se que isso tenha a ver com a globalização. A globalização traz, obviamente, uma maior uniformidade. Mas, como costuma acontecer nesses casos, quando um extremo se fortalece, alguma coisa acontece também no outro extremo. Nesse caso é uma necessidade de maior regionalidade. E assim percebemos que as pessoas lidam de maneira mais desinibida com isso. Políticos, por exemplo, fazem uso do dialeto para expressar uma certa emoção.
O dialeto como uma expressão linguística da pátria (Heimat)?
Heimat é uma palavra que se usa com uma certa relutância na Alemanha devido a determinadas associações históricas. A maioria das pessoas fala em regionalidade ou identidade. Mas identidade é difícil de ser definida como algo global, não se pode desenvolver uma identidade global. Alguns duvidam até mesmo da possibilidade de se ter uma identidade europeia. Identidade alemã também é algo difícil. Por outro lado, pode-se constituir e também viver uma identidade de Colônia, por exemplo.
Por que é possível sentir-se mais em casa usando o dialeto do que a língua padrão?
A língua padrão uniformiza. Também precisamos dessa unidade. O idioma oficial é a língua de 82 milhões de pessoas [na Alemanha], mas também traz consigo uma certa artificialidade. É possível discutir até mesmo se existe uma língua padrão pura. Eu diria que ela não existe, pois em cada lugar ela soa diferente. De certa maneira ela tem algo de fatigante. A descontração existe principalmente na língua regional, com a qual se está acostumado desde criança.
Por que alguns dialetos não são tão bem vistos quanto outros? Por exemplo, o da Saxônia.
Eu acho isso terrível. Da parte da ciência não há critérios de natureza linguística para classificar algo como bonito ou feio. Mas isso existe. E de onde vem? Nesse caso, a língua é associada a outras coisas, a uma imagem. E é difícil se livrar de uma imagem. Os saxões tinham até o século 18 um papel de liderança na Alemanha. Então vieram os prussianos e se sobrepuseram militarmente. E aí tudo mudou: os saxões passaram a ser discriminados sistematicamente. E tiveram repetidamente azar. No século 20, por exemplo, na então Alemanha Oriental, os piores líderes eram falantes do saxão. E assim os pobres saxões foram sempre de novo perseguidos por esse preconceito.
Em nível europeu existe a Carta das línguas regionais e minoritárias, que também foi assinada pelo governo alemão em 1999. De acordo com ela, línguas e dialetos ameaçados de extinção precisam ser protegidos. O que o senhor acha disso? É possível proteger uma língua viva?
Eu sou cético com relação isso. Acho maravilhoso que se proteja dialetos. Existe, por exemplo, o Saterfriesisch – falado no norte da Alemanha, próximo a Oldenburg, por duas mil pessoas. É um dialeto muito antigo. E quem gostaria de vê-lo morrer? Mas por outro lado é preciso ver que proteção tem sempre algo de museu. Mas não queremos que as línguas sejam algo de museu, queremos usá-las na comunicação. A proteção se torna, assim, um exercício de equilíbrio.
Também há dialetos em outras línguas?
Obviamente não sei sobre o mundo inteiro. Mas na Europa há muitos paralelos. Os alemães podem pensar "nós somos um povo estranho, aqui temos várias línguas, enquanto os franceses falam francês, os italianos, italiano, e os ingleses, inglês". Obviamente isso não faz sentido. Os ingleses não falam simplesmente inglês – eles ainda têm o galês, o irlandês e o escocês. Em Londres mesmo há o cockney, um dialeto. O inglês em si é muito variado. Dê uma olhada nos Estados Unidos, na Austrália, na África do Sul, na Índia. Em todos esses países se fala inglês, mas com muitas variações – nesse sentido pode-se falar em grandes dialetos. Em outras palavras: isso existe em todos os lugares. Eu diria até mesmo que não há língua de certa magnitude nesse mundo que não tenha dialetos.
De volta às pessoas deste mundo globalizado: elas precisam falar um monte de outras línguas, por exemplo a língua dos computadores. Elas precisam saber como se expressar na rede, no celular. Há várias línguas especiais que uma pessoa tem que dominar. Como vai se comunicar o homem do futuro?
O conceito de que o ser humano é unilíngue é totalmente ideológico – para não dizer romântico, pois ele vem do século 19. O ser humano não é unilíngue, e isso nós vemos no mundo inteiro.
A propósito, quando se pergunta a estudantes na universidade qual a sua língua materna, isso é um problema para alguns deles. Eles não sabem qual é a sua língua materna porque cresceram falando duas línguas. O homem globalizado do futuro é extremamente poliglota. Ele fala, primeiro, uma língua franca, como o inglês. Depois ele fala uma língua materna, que aprendeu em casa. Então ele tem contato com várias linguagens computacionais. Depois ele tem determinados interesses, que o levam a algum país específico, e ele aprende a língua de lá. Isso significa que as pessoas do futuro serão poliglotas.
O senhor tem algum dialeto preferido?
Sim, o meu Kölsch (falado em Colônia)! É o único que consigo usar. Até porque eu não falo direito o Hochdeutsch (risos). E nem é preciso. Quando eu me encontro com colegas que também falam Kölsch, em apenas três segundos deixamos esse cansativo alemão padrão de lado. E adoramos relaxar, tomando uma cerveja ou um vinho, e conversar em nosso dialeto.
Autora: Gabriela Schaaf (msb)
Revisão: Alexandre Schossler