Espanha considera conceder visto para compradores de imóveis
27 de novembro de 2012Somente em 2006 foram construídas na Espanha 900 mil moradias. Na época, os lucros eram grandes para corretores e construtores, as pessoas se encontravam num delírio de consumo, comprando casas e apartamentos a preços astronômicos.
Afinal, os bancos concediam crédito a juros módicos. Até mesmo quem não possuía nenhum capital próprio e, a rigor, não estava apto a arcar com um imóvel, era atendido. A maioria dos compradores partia do princípio de que os preços iriam subir sem parar.
Vender a qualquer preço
Mas aí a bolha estourou. Atualmente há na Espanha cerca de 1 milhão de moradias inabitadas, segundo estimativas. Elas se espalham pela costa, em torno das metrópoles ou no planalto castelhano: casas prontas ou inacabadas, construídas em tempos de boom, hoje símbolos da profunda crise do país.
A avaliadora imobiliária Tinsa calcula que, desde o início da crise, os preços dos imóveis caíram 30%. No entanto, a economia espanhola depende do setor de construções. Agora, governo e empresariado torcem pela salvação vinda do exterior – e promete um brinde para os compradores estrangeiros de casas e apartamentos.
"Propusemos que estrangeiros que comprem um imóvel por mais de 160 mil euros recebam automaticamente o visto de permanência", revela Jaime García-Legaz, secretário de Estado do Comércio. A iniciativa se dirige, sobretudo, a investidores russos e chineses, que necessitam de visto para a União Europeia.
Imigração para ricos
O primeiro-ministro Mariano Rajoy apoia: "O setor de construções precisa avançar, os imóveis têm que ser vendidos – e a bons preços". Juan Rosell, presidente da confederação do empresariado CEOE aplaude o plano de Madri: "Tudo o que possa reavivar as vendas de imóveis deve ser seriamente considerado".
Em contrapartida, o sindicato CO fala de uma "política classista": o governo estaria facilitando a imigração para estrangeiros ricos, ao mesmo tempo em que restringe os direitos dos operários imigrantes.
Também a oposição espanhola critica a sugestão. Marisol Pérez Domínguez, porta-voz para assuntos de política de migração do partido socialista PSOE, acusa Madri de atrelar a concessão do visto de permanência a considerações econômicas:
"O governo devia, antes, era parar com a onda de despejos, para que não haja cada vez mais casas vazias e cada vez mais gente na rua."
Latino-americanos entre maiores vítimas
Críticas severas partem também das associações de imigrantes. Gilberto Torres, porta-voz da Ferine, afirma tratar-se "um escárnio para os muitos milhares que há anos trabalham na Espanha, e que agora têm que partir, por não poderem mais pagar as parcelas de suas casas".
Durante o boom imobiliário, muitos imigrantes latino-americanos também compraram imóveis a preços exorbitantes. Quando a crise começou, eles foram os primeiros a perder seus empregos, e agora se encontram sob ameaça de despejo.
Torres ressalta que, da oferta do governo, só iriam mesmo se beneficiar aqueles que têm poder aquisitivo muito mais elevado do que o imigrante médio. Os latino-americanos estão saindo prejudicados, e sua situação é especialmente grave, aponta o ativista.
A organização espanhola SOS Racismo igualmente condena a proposta. Segundo ela, este é "mais um passo do governo para regulamentar a migração de um ponto de vista puramente econômico". Até agora, Madri escolhia quais eram os estrangeiros desejados no país segundo o ponto de vista do mercado de trabalho. Agora, ao que tudo indica, chegou a vez do mercado imobiliário.
Estratégia ineficaz
Os planos de Madri ainda não estão fechados. No entanto, a Espanha não seria a primeira nação a adotar uma regulamentação dessas. Portugal, Irlanda, os Estados Unidos e o Canadá já facilitam a obtenção do visto definitivo para investidores.
Em agosto, Portugal até ampliou suas leis de imigração com um parágrafo correspondente, e o visto só é concedido a partir de um valor de compra de 500 mil euros. Mas até o momento não se registrou nenhuma corrida aos imóveis lusitanos.
Autoria: Nils Naumann (av)
Revisão: Francis França