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EUA fez campanha para barrar golpe no Brasil, diz jornal

23 de junho de 2023

Emissários do governo Biden teriam pressionado políticos e militares brasileiros a respeitarem o resultado das urnas, agindo com discrição para evitar que a ação "coordenada" fosse percebida como interferência.

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Vidraça danificada durante a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. Ao fundo há um grupo de manifestantes trajando verde e amarelo em frente à sede do Supremo Tribunal Federal.
Vidraça danificada durante a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília, em 8 de janeiro de 2023. Ação foi protagonizada por apoiadores de Jair Bolsonaro que não reconheciam o resultado eleitoral.Foto: Adriano Machado/REUTERS

Preocupado com a retórica golpista de Jair Bolsonaro (PL) e os ataques constantes do ex-presidente ao sistema eleitoral brasileiro no período que antecedeu a eleição ao Palácio do Planalto, o governo dos Estados Unidos teria empreendido uma bem-sucedida campanha para pressionar políticos e militares brasileiros a respeitarem os resultados das urnas, afirma reportagem do jornal britânico Financial Times (FT) publicada nesta quarta-feira (21/6).

A "discreta campanha de pressão" teria sido levada adiante com o objetivo não de beneficiar um candidato específico, mas sim de garantir o respeito ao processo eleitoral e ao resultado das urnas – qualquer que ele fosse –, e teria tido um papel importante ao evitar uma ruptura democrática no Brasil.

O governo de Joe Biden temia ver no Brasil algo parecido com a invasão do Capitólio, em 6 de janeiro de 2021, protagonizado por uma turba de apoiadores do ex-presidente derrotado Donald Trump.

Ação "coordenada" não deveria ser percebida como interferência indevida

Segundo a reportagem, os EUA queriam demonstrar sua força na região ante a crescente influência chinesa, mas agiram com discrição para evitar que a "campanha coordenada" fosse percebida como interferência indevida – algo que ocorreu em 1964, quando os americanos apoiaram o golpe militar que depôs o presidente João Goulart e instituiu uma ditadura que duraria 21 anos.

Indagado sobre a reportagem, Bolsonaro reagiu acusando os EUA de interferência nas eleições, e afirmou que acionaria "um colega" para apurar as informações veiculadas pelo FT, sem especificar a quem se referia.

Ainda segundo a publicação, os americanos agora estariam descontentes por considerarem que esses esforços não teriam sido reconhecidos adequadamente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), cuja política externa até agora tem sido marcada por declarações e gestos do petista considerados incômodos, como os posicionamentos sobre a guerra na Ucrânia.

Biden temia ruptura democrática

A reportagem cita conversas com seis funcionários e ex-funcionários do alto escalão norte-americano, que detalham uma campanha para garantir uma transição democrática caso Bolsonaro perdesse, iniciada em agosto de 2021, após uma visita ao Brasil do assessor de segurança nacional de Biden, Jake Sullivan.

Sullivan teria ficado preocupado com a visão de Bolsonaro sobre as eleições americanas e receoso de que ele, como Trump, pudesse tentar sabotar as eleições – na mesma época, Bolsonaro pressionava pelo voto impresso, e botou tanques militares na Praça dos Três Poderes no dia em que a proposta foi votada pelo Congresso.

A partir daí, os americanos teriam transmitido uma série de recados publicamente e em reuniões de caráter reservado. Militares teriam ameaçado "rasgar acordos com o Brasil, de treinamento a operações conjuntas", pessoas próximas de Bolsonaro foram acionadas para dissuadi-lo de eventuais pretensões golpistas e emissários de Biden deram declarações públicas de apoio às autoridades eleitorais e ao sistema de votação brasileiro.

Manifestações públicas de apoio às autoridades e ao sistema eleitoral brasileiro 

Em um desses episódios, em julho do ano passado, o Departamento de Estado saiu em defesa do sistema eleitoral brasileiro publicamente um dia após Bolsonaro questionar a integridade das urnas eletrônicas em reunião com diplomatas estrangeirosum dos motivos pelo qual o ex-presidente agora corre o risco de ter a inelegibilidade declarada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Manifestação pública de apoio semelhante também teria sido feita a pedido do ministro do Supremo Tribunal Federal e à época presidente do TSE Luís Roberto Barroso, segundo o FT.

Os EUA também teriam ajudado as autoridades eleitorais brasileiras com contatos com fabricantes de componentes da urna eletrônica para garantir a entrega de chips.

Antes do primeiro turno, parlamentares da esquerda norte-americana haviam pedido a Biden o reconhecimento imediato do resultado das urnas. E ele veio – tanto no primeiro, quanto no segundo turno, quando Luiz Inácio Lula da Silva sagrou-se vencedor, embora por uma margem apertada de votos.

Passada a diplomação do petista, manifestantes invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília em 8 de janeiro – documentos apreendidos por autoridades brasileiras em poder de auxiliares de Bolsonaro sugerem a articulação de um possível golpe de Estado.

Biden, à época em viagem oficial ao México, telefonou para Lula e, segundo a reportagem, articulou a emissão de um comunicado trilateral entre EUA, Canadá e México em favor da democracia brasileira.

ra/bl (ots)