Poucos hospitais dos EUA têm segurança máxima
17 de outubro de 2014O medo e indignação de Jowita Lynn são grandes. Ela trabalhou dez anos como enfermeira de pronto-socorro e conhece o duro trabalho da medicina de emergência. Entretanto nunca se sentiu tão vulnerável como desde o inesperado contágio de duas colegas em Dallas pelo vírus do ebola. "Faltam-nos equipamentos indispensáveis, treinamento e experiência para tratar esses pacientes", disse à DW. De olhos arregalados e voz firme, reforça: "Temos medo, não estamos preparados."
Jowita trabalha para o Providence Hospital em Washington. Com mais de 400 leitos, ele é um dos maiores centros hospitalares da capital americana. E tem como compromisso oferecer o melhor tratamento possível a seus pacientes, no espírito da "alegria, cuidado e respeito" cristãos.
Lynn, no entanto, não está tão segura disso. Acima de tudo, ela vê pouco respeito e cuidado com os funcionários, por parte dos diretores do hospital. "Honestamente, eu não acredito que a diretoria esteja levando a sério a questão do ebola."
Em Baltimore, a uns cem quilômetros da capital americana, Hugh Hill trabalha há muitos anos como médico-chefe do setor de emergência no Johns Hopkins Bayview Medical Center. Ele diz considerar justificadas algumas queixas dos enfermeiros. É possível que em certos hospitais não existam vestuários e dispositivos de segurança adequados, admitiu em conversa com a Deutsche Welle, "mas isso vai ser corrigido muito em breve", garantiu.
No que concerne a si e a seu próprio hospital, contudo, Hill faz questão de estar preparado para um possível primeiro paciente de ebola. "Quando veio a notícia do surto da doença, respondemos com triagens, perguntamos às pessoas sobre suas viagens. Desde o caso em Dallas, reavaliamos todas as nossas medidas de proteção, fizemos novos planos e, na semana passada, começamos a treinar nossos funcionários no uso das roupas de proteção e limpeza das instalações."
Início tardio do treinamento
Hugh Hill admite, no entanto, que seu hospital iniciou tarde demais o treinamento das medidas de proteção. Segundo ele, somente após a infecção da primeira enfermeira em Dallas reconheceu-se a necessidade de fazer "mais".
"Pensávamos realmente que as medidas de proteção já introduzidas fossem adequadas", diz, tentando explicar o atraso. "Tivemos de aprender que esse vírus é altamente infeccioso e, especialmente pouco antes de morrerem, os pacientes portam consigo uma carga viral elevada."
Segundo Hill, o Hospital Johns Hopkins treina sua equipe médica no assim chamado buddy system (sistema amigo), em que três funcionários estão envolvidos quando um enfermeiro veste uma roupa de proteção.
"Um lê as regras e assegura que o vestuário de proteção seja colocado e retirado de acordo com os regulamentos. Outro também está de roupa de proteção e que não faz nada além de garantir que não haja nenhuma contaminação". O terceiro, por fim, é o cuidador propriamente dito, que entra em contato com o paciente.
Hill não tem certeza se os demais usam esse trabalhoso método. Enquanto em outros lugares as regras são projetadas na parede, em seu hospital são lidas em voz alta, para que cada detalhe seja escrupulosamente respeitado. Na hora de vestir as luvas, por exemplo: "Agora coloque as luvas e puxe-as sobre o pulso."
Duras críticas às autoridades sanitárias americanas
Segundo o doutor Hill, seu hospital "até agora, infelizmente, não praticou isso" e precisa de mais tempo para treinar toda a equipe. Só foram treinados seis funcionários do serviço de emergência, mas até o fim da próxima semana, serão "centenas" em toda a instituição. O médico diz sentir-se bem amparado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), em Atlanta, que fornece recomendações a hospitais e departamentos regionais de saúde.
Jowita Lynn discorda. Ela não vê garantia da aplicação das recomendações do Centro. "O CDC muda constantemente de opinião. E o meu hospital ainda não conseguiu implementar nem as regras originais, quanto mais as seguintes."
Em Washington, conta a enfermeira, as recomendações do CDC foram simplesmente entregues em papel impresso, sem esclarecimentos e muito menos treinamento. Seu veredicto é duro: "Não temos nada com que trabalhar." Além disso, em seu hospital em Washington,
"Aprendemos continuamente"
Hugh Hill, por sua vez, mostra compreensão para as mudanças nas apostilas das autoridades sanitárias americanas. "Aprendemos continuamente sobre esse vírus. E acho que todos os especialistas dos EUA concordam que é preciso reajustar a nossa resposta à doença, após o que aconteceu em Dallas."
Apenas quatro hospitais nos EUA possuem padrões de segurança máxima: entre eles, os de Atlanta e Washington, para os quais os pacientes de ebola foram transferidos. Outros grandes hospitais teriam possibilidades boas, mas "não perfeitas", diz o médico-chefe do Johns Hopkins.
Como os quatro centros altamente especializados possuem número limitado de leitos, outros, como o seu, em Baltimore, também devem se preparar o melhor possível. Ele acrescenta que para tal não existe um procedimento padrão nos Estados Unidos, cada hospital se prepara individualmente para um futuro caso de emergência.
Seu hospital, por exemplo, adotou o seguinte procedimento: quem recorre ao serviço de emergência é questionado, primeiramente, sobre suas viagens. E, se tem febre ou sintomas semelhantes aos da malária, atribuíveis também ao ebola, é transferido imediatamente para o setor de isolamento. "Nós ligamos então para o departamento de saúde local, para a nossa própria equipe de especialistas em doenças infecciosas e comunicamos à equipe especial do Johns Hopkins, a qual envia seu pessoal até nós, no prazo de uma hora."
Nunca se vai chegar à perfeição, ressalta Hugh Hill, "só podemos nos aproximar dela". Ele diz compreender que os cidadãos dos EUA estejam preocupados. Mas ele e seus funcionários continuarão indo ao trabalho, mesmo estando agora mais cientes do perigo.