Europa adverte direita recém-eleita na Polônia
24 de outubro de 2005A eleição de Lech Kaczynski à presidência da Polônia seria "tudo menos uma benção", ou seja, não passaria de um "pesadelo anacrônico", um "motivo para chorar". A imprensa européia não mediu palavras ao descrever o desconforto causado pela opção eleitoral dos poloneses, que elegeram um conservador exacerbado como chefe de governo, com mais de 50% dos votos, segundo indicaram as primeiras estimativas divulgadas após o fechamento das urnas, no domingo (23/10).
Nacionalismo e discriminação
A defesa de valores católicos e nacionalistas por Lech Kaczynski ultrapassa o limite dos programas políticos conservadores dentro da União Européia. Além de condenar o aborto, Kaczynski proibiu – como prefeito de Varsóvia – manifestações pelo reconhecimento de direitos civis dos homossexuais no ano passado e neste ano.
O jurista defende a reintrodução da pena de morte na Polônia e ressalta a intenção de defender a soberania de seu país na Europa, sobretudo como desafio aberto à Alemanha e à Rússia.
Ao cumprimentar Kaczynski pela vitória eleitoral, o presidente da Comissão Européia, José Manuel Barroso, aproveitou a oportunidade para lembrar que a reintrodução da pena de morte é proibida na comunidade. Barroso também advertiu que a discriminação de homossexuais é uma prática política repudiada na UE e viola os compromissos assumidos por Varsóvia perante Bruxelas.
"Acompanhar com atenção a situação na Polônia"
Um porta-voz da Comissão Européia explicou que as declarações de Kaczynski sobre a pena de morte contrariam o artigo 6º do acordo de aceitação dos países-membros na comunidade: "A UE se baseia em princípios de liberdade, nos direitos humanos e no Estado de direito, coisas a serem observadas por todos os países-membros".
"Um país onde vigore a pena de morte não pode nem começar a negociar seu ingresso na UE" continuou o porta-voz. "Isso também vale para a discriminação de pessoas em função de sua opção sexual. Pretendemos acompanhar com grande atenção a situação na Polônia."
A virada radical dos poloneses para a direita foi interpretada em parte como reação dos eleitores ao envolvimento dos últimos governos de esquerda em escândalos de corrupção. Kaczynski capitalizou a insatisfação do eleitorado, elegendo o combate à corrupção como um dos lemas de sua campanha eleitoral. O que também agradou ao eleitorado foi o discurso nacionalista de Kaczynski, pontuado por animosidades contra a Rússia e a Alemanha.
Distância de Berlim
Kaczynski se recusou a dialogar com as associações alemãs de desterrados e rejeitou suas reivindicações de indenização como "ameaça à Polônia". Na visão dos analistas políticos, isso pode abalar as relações com Berlim. "Resta saber até que ponto Kaczynski estará disposto a cultivar as relações com a Alemanha. Nos últimos anos, seu partido Lei e Justiça (PiS) evitou conscientemente uma proximidade com partidos alemães", declarou Thomasz Dabrovski, do Centro de Relações Internacionais, em Varsóvia.
Pode ser que haja conflitos de interesse entre a Polônia e a Alemanha dentro da União Européia. No entanto, a coalizão com os liberais da Plataforma Cívica (PO) deverá relativizar qualquer atitude mais radical por parte de Kaczynski. O líder liberal Donald Tusk, derrotado nas eleições deste fim de semana, sempre manteve contato e boas relações com os democrata-cristãos alemães.
O premiê alemão, Gerhard Schröder, se pronunciou explicitamente sobre as relações bilaterais ao parabenizar Lech Kaczynski pela vitória eleitoral: "Estou convencido de que as relações teuto-polonesas, importantes para ambos os países e para a Europa, vão continuar se desenvolvendo de forma frutífera em prol dos interesses e valores comuns e para o bem dos alemães, poloneses e europeus".
O porta-voz da Chancelaria Federal, Bela Anda, lembrou do empenho de Schröder em cultivar as relações com a Polônia e da contribuição da Alemanha, junto com a França, para viabilizar o ingresso do país na União Européia.