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Exposição reconstrói história do Cremlin

Neusa Soliz16 de fevereiro de 2004

A exposição "O Cremlin. Glória de Deus e Esplendor dos Czares" documenta, em Bonn, 850 anos da história do centro do poder na Rússia. Animação computadorizada permite uma viagem virtual pelo tempo.

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Vista do Cremlin no século 19Foto: Staatliches kulturhistorisches Museum

Um ovo de Carl Fabergé é o primeiro objeto de luxo – dos 300 da mostra – com que o visitante se depara logo à entrada da Bundeskunsthalle em Bonn, museu que se destaca por uma oferta inigualável de exposições. A obra-prima de ouro, prata e esmalte é uma caixinha de música, em trabalho de filigrana, em forma de catedral com cúpula dourada.

Poder secular e religioso no Cremlin

Presentes pomposos como esse ovo de Fabergé que o czar Nicolau II deu à esposa em 1906, eram comuns na família real. Principalmente por ocasião da Páscoa, a festa máxima da Igreja Ortodoxa Russa, segundo a curadora da exposição, Agnieszka Lulinska. Assim como outras preciosidades – ícones e instrumentos litúrgicos –, ele é um exemplo da estreita relação entre o poder secular e o religioso, "uma constante na turbulenta história do Cremlin".

Em russo antigo, Cremlin significa fortaleza. Um forte marcou, de fato, o início da central de poder há mais de 800 anos. Mas por Cremlin se entende todo o complexo de 28 hectares em torno da Praça Vermelha em Moscou, com seus vários palácios, catedrais e monastérios. Ele é cercado por um muro de dois quilômetros, com 20 torres.

Os czares, arquiduques e a nobreza residiram nessa área, onde também se localizavam quartéis e a sede do patriarca e altos clérigos da Igreja Ortodoxa. O Cremlin foi, portanto, a central de comando do império russo e, posteriormente, da superpotência União Soviética.

Passeio virtual através dos séculos

Na exposição pode-se realizar um passeio virtual pelo tempo e visitar desde o primeiro núcleo do Cremlin, em 1147, com suas ruas de madeira. Uma animação computadorizada de 25 minutos reproduz as mudanças através dos séculos. Por exemplo, como o núcleo se transformou numa citadela de pedras, dois séculos depois, quando Moscou se tornara o centro político do país. Mesmo após a mudança da capital russa para São Petersburgo, em 1712, os czares continuaram a ser coroados no Cremlin, que nunca perdeu sua áurea de mito.

Der Kreml Gottesruhm und Zarenpracht, Ausstellung in der Bundeskunsthalle in Bonn
Adoração da Cruz, quadro a óleo atribuído a Ivan Saltanov, século 17Foto: Staatliches kulturhistorisches Museum

Destruído por Napoleão em 1812, foi reconstruído e passou a ser a sede do governo soviético com a revolução comunista de 1917. Nos anos 60 do século passado, ali foi construído um gigantesco salão para os congressos do Partido Comunista, enquanto outras construções foram transformadas em museus. Desde a dissolução da União Soviética, o Cremlin abriga a sede do governo russo e seus órgãos mais importantes.

A animação computadorizada é um projeto da Universidade Técnica de Darmstadt, na Alemanha, em conjunto com a Universidade Estatal de Ciências Humanas de Moscou. Para realizar a animação, seus autores utilizaram quatro mil documentos, inclusive trabalhos científicos ainda não publicados. Seu coordenador, o professor de arquitetura Manfred Koob, diz que a amizade entre a equipe russa e a alemã foi fundamental para o trabalho, "para se chegar à alma da construção", ou entender a idiossincrasia russa.

O tesouro escondido dos mongóis

Jóias, coroas, roupas e mantos faustosos estão expostos na Bundeskunsthalle até 31 de maio, assim como armas e armaduras, livros, mapas históricos e os presentes que delegações estrangeiras levaram aos czares. Muitos objetos são mostrados ao público pela primeira vez. O Museu do Cremlin, ao qual pertence o acervo, é o mais antigo da Rússia e completará 200 anos em 2006.

Ausstellung Der Kreml Gottenruhm und Zarenpracht
Objeto em ouro que faz parte do acervo do Museu Estatal Histórico-Cultural do Cremlin em MoscouFoto: Staatliches kulturhistorisches Museum

Os objetos mais antigos na mostra são anéis, pulseiras e medalhões medievais. Eles só podem ser admirados em Bonn porque os habitantes do Cremlin resolveram enterrá-los, diante do perigo da invasão mongólica, que devastou toda a região. E ali as jóias permaneceram por 700 anos, até o tesouro ser desenterrado, em 1988.

"Nos 200 anos do seu domínio, os mongóis isolaram a Rússia da Europa", explica a curadora. Uma sessão especial trata da imagem da Rússia na Europa Ocidental no início da Idade Moderna. Ela foi marcada por estudiosos alemães que publicaram as observações feitas durante viagens ao grande reino.

Presentes e manto real

Os presentes de delegações estrangeiras aos czares demonstram não apenas a importância da diplomacia nos séculos 16 e 17, como também a alta qualidade dos ourives e artesãos de Augsburg e Nurembergue. Entre eles estão louça para lavagens rituais, troféus, bandejas, armas e arreios com ricos ornamentos.

Ao ver o luxuoso manto de brocado de ouro com enfeites de arminho, da czarina Maria Alexandrovna, o visitante tem uma idéia de como foi a coroação do último czar no Cremlin, em 1896. Na última sala da exposição, pode-se admirar diversas insígnias do poder, assim como um trono de 1797.