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"Fluxo de refugiados e pandemia foram os maiores desafios"

7 de novembro de 2021

Em entrevista exclusiva à DW, chefe de governo alemã ressalta importância de sinais tranquilizadores à população "num mundo bastante turbulento". E exorta jovens a fazerem pressão, em seu movimento pelo clima global.

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Angela Merkel durante entrevista à DW
Uma Chancelaria Federal sem Merkel, depois de 16 anos: "Vocês vão se acostumar"Foto: R. Oberhammer/DW

Relaxada e obviamente em paz consigo mesma: assim a chefe de governo da Alemanha, Angela Merkel, se apresentou numa entrevista exclusiva, conduzida na sexta-feira (05/11) pelo chefe do noticiário da DW, Max Hofmann, no prédio da Chancelaria Federal, em Berlim.

Ela não precisou refletir muito para responder quais foram os desafios mais difíceis em seu mandato: o afluxo de refugiados à Alemanha, em 2015, e o combate à pandemia de coronavírus. "Esses dois eventos me desafiaram pessoalmente: o grande número de refugiados que chegavam – que eu não gosto de chamar de crise, pois pessoas são pessoas".

A pressão para escapar, principalmente da Síria e dos países vizinhos, era muito forte na época, afirmou a chanceler federal alemã. Sobre a pandemia de coronavírus, desde o segundo trimestre de 2020, comentou: "Aí se viu o quanto ela afeta diretamente as pessoas, pois se trata de destinos humanos."

Pouco tempo ainda como chanceler federal

Desde a recente a constituição do novo Bundestag (câmara baixa do parlamento alemão), a chefe de governo de longa data ocupa o cargo apenas em caráter interino. Durante 16 anos, de seu escritório na Chancelaria ela tinha vista para o Reichstag, a sede do Legislativo alemão.

Nas eleições federais de setembro de 2021, ela não foi a candidata a chanceler federal por seu partido, a União Democrata Cristã (CDU). O pleito foi vencido pelos social-democratas, que ficaram com poucos percentuais à frente da CDU e de sua irmã União Social Cristã (CSU), da Baviera.

"Não se alcançou o suficiente contra as mudanças climáticas"

Merkel também classificou como uma espécie de crise em seu tempo como chanceler federal o fato de cada vez mais indivíduos questionarem o multilateralismo. "Ele foi sempre importante para mim, e eu sempre tentei fortalecer as organizações internacionais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, a Organização Mundial do Comércio (OMC) e outros." E na questão cada vez mais urgente da luta contra as mudanças climáticas, a política conservadora admitiu que não se alcançou o suficiente.

"Devemos seguir mais a ciência"

Merkel foi ministra do Meio Ambiente antes de se tornar chanceler federal, e liderou a primeira Conferência do Clima da ONU em Berlim, em 2005. Agora ela diz: "Nós ficamos mais rápidos. Mas nunca foi como agora, quando a distância em relação às avaliações científicas cresceu mais ainda. E isso tem que mudar agora, nesta década: temos que seguir novamente as avaliações científicas, e isso significa ficar bem perto do 1,5 ºC de aquecimento global."

Merkel: fluxo de refugiados e pandemia como maiores desafios

Jovens "têm que fazer pressão" pelo clima

Essa, porém, não foi uma admissão de fracasso pessoal na política climática. Pois a chefe de governo acrescentou ser necessário obter maiorias para cada medida de proteção climática, e que há muitos temores das consequências sociais de cortes severos, por exemplo, no consumo privado.

Merkel participou recentemente da Conferência do Clima da ONU, a COP26, que transcorre em Glasgow, Escócia, até 12 de novembro: "Glasgow já produziu alguns resultados, mas, da perspectiva deles, os jovens têm todo direito de achar que as coisas ainda andam lentas demais".

Como franqueza surpreendente, ela urgiu: "E então eu digo aos jovens: vocês têm que fazer pressão." E disse considerar "terrível" os cientistas terem que advertir com urgência cada vez maior contra as inundações, enchentes e secas em todo o mundo.

Visita de despedida à França

Merkel visitou recentemente vários chefes de Estado e de governo em viagens de despedida. O presidente da França, Emmanuel Macron, por exemplo, a convidou à cidadezinha de Beaune, na Borgonha, presenteando-a, mais tarde, com a Grã-Cruz da Legião de Honra, a mais alta condecoração do país.

Na entrevista à DW, a chanceler federal disse abertamente que ficou emocionada com a homenagem: "Sei que também há quem não esteja tão feliz com a minha política. Mas quando se está na França – e na história, é claro, muitas vezes não tivemos sentimentos tão amigáveis um pelo outro –, fiquei bastante feliz de tanta gente ter vindo saudar o presidente francês Emmanuel Macron e a mim. Foi uma experiência bonita, tenho que dizer."

Merkel e seu possível sucessor: bom sinal num mundo turbulento

Na reunião do G20 na Itália, no fim de outubro, por várias vezes Merkel se apresentou demonstrativamente ao lado de seu provável sucessor, Olaf Scholz, do Partido Social-Democrata (SPD) – que é vice-chanceler federal e ministro das Finanças interino do governo que ainda está no poder, e está atualmente negociando em Berlim uma coalizão governamental com o Partido Verde e o Partido Liberal Democrático (FDP).

Sobre a reunião do G20, Merkel diz que achou importante emitir uma mensagem à população: "Se eles sentem que há um bom contato entre a atual e o provável futuro chefe de governo, esse é um sinal tranquilizador num mundo bastante turbulento. E eu achei isso certo."

Hora da despedida: "Vocês vão se acostumar"

Questionada sobre o que fará ao deixar o poder em breve, Merkel respondeu: "Ainda não sei o que farei depois. Eu já havia dito que primeiro vou descansar um pouco e ver o que me vem à cabeça." Ler e dormir muito estão entre seus planos.

A democrata-cristã já enfatizou várias vezes que acredita ser bem capaz de se distanciar do poder, e repetiu a afirmativa na entrevista à DW, com uma ressalva: "Estou feliz por um lado, mas também poderá vir um pouquinho de melancolia."

E quando o entrevistador da DW disse ser impossível imaginar que, depois de 16 anos, ela não estaria mais na Chancelaria Federal, Angela Merkel comentou, com sua usual sobriedade: "Vocês vão se acostumar."