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Futebol concorre com religião, diz teólogo Hans Küng

(mm)30 de maio de 2006

Às vésperas da Copa do Mundo, sociólogos, psicólogos e teólogos alemães debatem o fenômeno do futebol e analisam o comportamento das pessoas diante do amor pelo esporte.

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Futebol mexe com as emoções e gera sentimento de solidariedadeFoto: AP

O futebol é muito mais do que esporte e negócio. Para muitos fãs, a vitória significa alegria extrema e a derrota, um sentimento de luto. É quando algo secundário se transforma no que há de mais importante no mundo. Até mesmo um 0 a 0 durante os 90 minutos de uma partida pode exercer uma tremenda fascinação, cuja origem parece misteriosa.

Para alguns torcedores, sejam homens ou sejam mulheres, o futebol tem uma dimensão religiosa ou pseudo-religiosa, como afirma o teólogo Hans Küng. "O futebol é um sério concorrente da religião, podendo até mesmo se tornar uma religião. Há até quem fale do deus futebol", disse durante um debate no jornal Frankfurter Allgemeine Zeitung.

Para ele, o ritual no estádio, o templo do futebol, apresenta claros paralelos com uma liturgia. "A grande questão é que o fenômeno individualmente não é algo crucial, mas o clima como um todo, que sugere a cada torcedor que aquilo que ele está vivenciando é o máximo", afirmou Küng.

Contraponto para sociedade regulada

EM 2004 Lettland gegen Deutschland Fußballfan
O estádio, o templo do futebol, promove uma atmosfera envolventeFoto: AP

Na opinião do sociólogo Gunter Pilz, de Hannover, uma partida tem uma importante função psíquica. "Um estádio de futebol é um local que promove experiências de emoção, paixão e uma atmosfera inebriante. Isso leva a um equilíbrio da carga de instinto e afeto do ser humano civilizado na nossa sociedade regulada e estruturada", explica. Para isso, o que acontece no campo sequer precisa ser emocionante. Em muitos casos, a tensão se transfere do gramado para as arquibancadas.

O sociólogo Rolf von Lüde, de Hamburgo, parece compartilhar da mesma opinião. "No futebol, os espectadores dividem a emoção da vitória ou da derrota". Até mesmo pessoas racionais, que controlam suas emoções, podem se deixar levar pelo sentimento de "nós", da solidariedade associativa (para com o próximo) ou nacional (para com a seleção). "Num evento como o futebol, isso se dá de tal maneira que produz um sentimento de grupo, envolvendo todas as camadas sociais."

Até certo ponto, as regras simples do futebol são provavelmente também a razão para a sua popularidade em todo o mundo, diz o sociólogo Dirk Kaesler. Além disso, o futebol pode ser jogado em qualquer lugar, bastando apenas ter uma bola.

Válvula de escape para agressões

Tudo isso contribui para o fato de o futebol ser o esporte mais popular do mundo, o que pode gerar situações até inusitadas. "Em que outra situação veríamos um cidadão alemão enrolado na bandeira do seu país?", questiona. Na Alemanha, não é comum a demonstração do orgulho nacional por meio de roupas ou de bandeiras devido ao temor de que o gesto seja confundido com nacionalismo.

BdT Schießkino für Jäger
Jogadores correndo atrás de uma bola são comparados a caçadoresFoto: dpa - Bildfunk

Explicações para o fenômeno do futebol são, de acordo com o psicólogo Laszlo Pota, de Hambugo, encontradas no início da história da humanidade e podem ser resumidas numa expressão: "descarregar a agressão". "Os homens, tal como caçadores e colecionadores, descarregam seus instintos caçadores na comemoração após a conquista de títulos ou troféus".

Pota explica assim o "instinto do caçador" associado ao futebol: "Vinte e duas pessoas caçam uma bola de couro que, simbolicamente, substitui o animal a ser caçado, sem matar e com apenas um risco mínimo de ferimento". Acrescente-se a isso a luta. "Diferentemente de uma luta armada homem contra homem, a luta no gramado termina sem derramamento de sangue".

Domínio masculino?

Mesmo em tempo de igualdade de direitos e com mulheres alemãs campeãs mundiais, o futebol continua servindo como "um demarcador entre os sexos". "Os homens acham que só eles realmente dominam o esporte", diz Pota.

Segundo o psicólogo Holger Brandes, de Dresden, apesar da dissolução de tradicionais estruturas no mundo do trabalho e do lazer, o esporte ganha força como área de afirmação específica da cada sexo. E entre as modalidades esportivas, sobretudo na Europa e na América Latina, o futebol se consolidou como "prática masculina".