Merkel em Wolfsburg
23 de setembro de 2008"O governo alemão está do lado da Volkswagen", afirmou a premiê alemã, Angela Merkel, nesta terça-feira (23/09), ao discursar para 20 mil funcionários da montadora. Merkel referiu-se à polêmica envolvendo a Lei da Volkswagen, que garante ao acionista público – o estado da Baixa Saxônia – direito de veto em questões decisivas dentro do grupo.
"Vamos defender isso perante a Comissão Européia com todas as forças e clareza", disse Merkel na sede da Volkswagen, em Wolfsburg. A premiê ressaltou que o governo alemão está "profundamente convencido" de que a lei não afeta, de forma alguma, a capacidade da Volkswagen de competir no mercado.
Oposição da UE
O argumento da Comissão Européia é o de que a tal lei impossibilita o "livre trânsito de capitais", já que o direito de veto de uma minoria acionária, dentro da Alemanha, é caracterizado somente quando esta minoria detém 25% das ações de uma empresa.
Este não é o caso do acionista público da Volkswagen – o estado da Baixa Saxônia – com apenas 20,1%. Charlie McCreevy, comissário da UE para o Mercado Interno, vê a lei como avessa ao "Direito europeu". McCreevy anunciou que a Comissão deverá apelar para novos procedimentos jurídicos contra a regulamentação.
Desavenças no mesmo partido
A questão envolvendo a Volkswagen já se transformou em um debate público, colocando, inclusive, políticos de uma mesma facção (a União Democrata Cristã) em lados opostos. Enquanto o governador da Baixa Saxônia, Christian Wulff, defende a Lei da Volkswagen com unhas e dentes, seu colega de partido Günther Oettinger, governador do estado de Baden-Württemberg, critica a lei que fortalece o direito de veto do governo estadual da Baixa Saxônia dentro do conselho administrativo da Volskwagen, mesmo contra a vontade de Bruxelas.
A postura do Oettinger, há de se notar, pode ser lida como uma defesa da Porsche, sediada em Baden-Württemberg. Pois a montadora de carros de luxo acaba de se tornar acionista majoritária da Volkswagen. E, como tal, gostaria de dar definitivamente adeus à lei que permite ao acionista público vetar decisões importantes dentro do conselho administrativo. Na visão da presidência da Porsche, a Lei da Volkswagen limita o leque de ação dos executivos.
"Santo Christian"
Os sindicatos, por outro lado, acreditam que o fim da lei pode significar corte de empregos e cerceamento dos direitos aos funcionários. Há poucos dias, 40 mil empregados participaram de uma manifestação em Wolfsburg em defesa da manutenção da lei que garante à Baixa Saxônia o direito de veto.
O governador Christian Wulff, por sua vez, apelou às lideranças da Porsche em prol de um acordo. O diário econômico Handelsblatt chegou a ironizar chamando o político de "Santo Christian", ao comentar a posição de "salvador" que o governador assumiu na questão.
"Até mesmo o ex-adversário Ferdinand Piëch precisa hoje de Wulff. Depois de ter rompido com a família Porsche, o patriarca da montadora só consegue, hoje, se manter no posto de diretor do conselho administrativo da Volkswagen com o apoio da Baixa Saxônia", comenta o jornal.
No mais tardar depois da última reunião do conselho administrativo em Wolfsburg, em que Piëch se posicionou claramente contra o clã dos Porsche – seus próprios parentes – ficou claro que somente uma aliança entre os governos federal e estadual com Piëch será capaz de frear o domínio da Porsche sobre a Volkswagen.
Merkel: da água para o vinho?
A chanceler federal Angela Merkel evitou entrar no que chamou de "brigas internas" entre a Volkswagen e a Porsche, mas declarou sua defesa irrestrita da lei em debate. Esta postura levou o diário Financial Times Deutschland a apontar uma mudança na trajetória da premiê.
"Se deveria editar as imagens do discurso de Merkel na convenção da CDU, em 2003, e de sua fala agora em Wolfsburg. Melhor não se poderia observar, em poucos minutos, sua transformação de uma reformista radical em alguém completamente social-democrata."
Segundo o jornal, ver a chanceler federal democrata-cristã "abraçada" aos sindicalistas em Wolfsburg é, para o Partido Social Democrata (SPD), um osso duro de roer. O mesmo a dizer em relação à presidência da Porsche, que vê ruindo por terra suas intenções de fazer com que a Volkswagen se assemelhe cada vez mais à montadora de luxo de Stuttgart.