Governo português busca alternativas após Justiça frear reformas
9 de abril de 2013Portugal era visto como o aluno exemplar na crise da dívida da União Europeia (UE). Em 2011, o país recebeu uma injeção financeira de 78 bilhões de euros, comprometendo-se, em troca, com um drástico programa de corte de despesas. O resultado foi satisfatório, como os credores repetidamente enfatizaram.
Agora, o revés. O Tribunal Constitucional (TC) português decidiu que quatro das nove medidas do pacote de austeridade têm de ser modificadas. Em decisão divulgada sexta-feira passada, o TC reprovou, entre outros, cortes no seguro desemprego e no auxílio de férias para funcionários públicos.
A decisão obriga o primeiro-ministro Pedro Passos Coelho e seu governo conservador a pensar em alternativas. O líder português já prometeu que não haverá novos aumentos de impostos, mas anunciou que serão realizados cortes nas áreas de segurança social, educação, saúde e nos órgãos públicos.
Provavelmente os portugueses voltarão às ruas para protestar. Mas analistas afirmam que o caminho do corte de despesas é o único a ser seguido. "O objetivo é tornar a economia novamente dinâmica", opina o economista Jens-Boysen Hogrefe, do instituto econômico IfW. Ele diz que aumentos de impostos são contraproducentes – a única saída é reduzir despesas.
Segundo cálculos divulgados pela imprensa portuguesa, a decisão do tribunal retira 1,3 bilhão do total de 5 bilhões de euros que deveriam ser cortados do orçamento de 2013.
O economista Matthias Kullas, do Centro para Política Europeia de Freiburg, afirma que, apesar da decisão do TC, os cortes no seguro desemprego e no auxílio de férias dos funcionários públicos ainda não foram totalmente descartados. "Isso não significa que esses cortes de benefícios permaneçam proibidos se outros benefícios também forem encurtados", diz. Para ele, o tribunal se incomodou com o fato de os cortes terem sido distribuídos de forma desigual entre os setores da população.
Derrota, sem nocaute
Na avaliação de Kullas, o governo português tem feito até agora um bom trabalho, especialmente no que toca à consolidação orçamentária – e deve, portanto, permanecer no comando da nação.
O diretor executivo da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Alemã, Hans-Joachim Böhmer, tem opinião parecida. "A decisão judicial é, claro, uma derrota, mas não chega a ser um nocaute para o governo", pondera Böhmer. Ele diz que o que ocorreu foi um procedimento democrático normal de um órgão constitucional que tem o direito e o dever de julgar outros órgãos constitucionais.
Böhmer, que vive há 15 anos em Portugal, afirma não acreditar que o governo Passos Coelho cairá. O presidente português, Aníbal Cavaco Silva, já se pronunciou contra uma renúncia do atual governo de centro-direita.
Mas mesmo se o governo for substituído por outro, as medidas de austeridade devem continuar no mesmo rumo, dizem os especialistas econômicos. Afinal de contas, o país se comprometeu em maio de 2011 a fazer uma economia equivalente a 5% de seu Produto Interno Bruto (PIB) entre 2012 e 2014. Na época, os socialistas estavam no poder. Os outros dois principais partidos, os conservadores do PSD, liderados pelo primeiro-ministro Coelho, e o também conservador Partido Popular (PP) concordaram com o plano.
Embora os socialistas – hoje na oposição – tenham negociado as condições para os empréstimos de emergência, agora eles pressionam o governo. A rígida política de austeridade do governo "que empobreceu o país e impôs enormes sacrifícios aos portugueses, sem que eles possam ver os resultados" deve terminar, propuseram, recentemente, os partidos de esquerda, ao encaminharem uma moção parlamentar de desconfiança contra o Passos Coelho, que, no entanto, foi derrubada.
O plano de resgate corre perigo
A moção de desconfiança e a decisão do TC não são os únicos contratempos que atingiram nos últimos dois anos o governo de Portugal como fruto de suas severas medidas de austeridade. "Havia já problemas na implementação das medidas. Mas Portugal luta especialmente contra uma severa recessão, que está relacionada com as medidas de austeridade e que está longe de ser superada", destaca o especialista do IfW, Boysen-Hogrefe, observando que isso não era previsível em 2011, época da adoção do plano de resgate.
"Podemos agora até começar a duvidar que Portugal estará realmente em condições de voltar aos mercados financeiros até o fim do próximo ano", conclui. Não é improvável, segundo ele, que a troica de credores, formada pela União Europeia, pelo FMI e pelo Banco Central Europeu, venha a fazer concessões aos lusitanos com relação a um ou outro detalhe do acordo. Uma visita ao país já está programada para as próximas semanas. A Comissão Europeia, porém, já mandou avisar que não concorda com um relaxamento das medidas de austeridade.