Muro de Berlim
13 de agosto de 2009Em fevereiro de 1989, Chris Gueffroy, de 20 anos, foi morto a tiros por um soldado da Alemanha Oriental, que patrulhava a fronteira. Ele foi a última pessoa assassinada quando tentava pular o Muro de Berlim.
A história de Gueffroy é bem conhecida, mas muitas outras pessoas perderam a vida ao tentar fugir da Alemanha Oriental cruzando o Muro de Berlim. Há pelo menos 136 casos, dizem historiadores do Memorial Muro de Berlim e do Centro de Pesquisa em História Contemporânea de Potsdam.
Para esses pesquisadores, mais importante do que o número – em torno do qual existem, há anos, divergências – , são as biografias das vítimas e as circunstâncias em que elas foram mortas. Em um trabalho inédito, essas informações foram reunidas agora em livro.
"Em 22 de agosto de 1961, um dia antes do seu 59º aniversário, Ida Siekmann pulou do terceiro andar de sua residência, na Bernauer Strasse 48, e feriu-se mortalmente. A construção do Muro havia a separado de sua irmã, que morava apenas alguns quarteirões distante, no lado ocidental da cidade", relata o historiador Hans-Hermann Hertle.
Siekmann é uma das 136 vítimas fatais do Muro de Berlim cujas biografias foram reunidas por Hertle e outros historiadores de sua equipe. O grupo de pesquisadores passou anos coletando informações, ouvindo parentes e esmiuçando o arquivo da Stasi, a polícia política da Alemanha Oriental.
Contra a idealização da Alemanha Oriental
Na opinião do ministro alemão da Cultura, Bernd Neumann, o livro é muito mais do que uma simples reunião de fotos e textos. "Trata-se de dar um rosto e um nome aos mortos, recuperando assim a dignidade dos mesmos. E, por meio dessas biografias, apontar quais eram os mecanismos da ditadura e suas consequências. Esse é o valor especial do livro."
Para o professor Martin Sabrow, diretor do Centro de Pesquisa em História Contemporânea de Potsdam, os historiadores trabalham contra a idealização da Alemanha Oriental e contra o esquecimento. Na fronteira, lembra Sabrow, ocorreram atos brutais que não devem ser esquecidos.
"Ali foram descarregadas armas em pessoas desarmadas, inconscientes, à beira da morte. Ali pedia-se mais uma Kalashnikov, depois que a própria arma não tinha mais munição suficiente", diz Sabrow.
Histórias únicas
Cada história de fuga era única, contendo sua própria tragédia. A maioria dos refugiados havia entrado em conflito com o regime comunista ou não aguentava mais viver na Alemanha Oriental.
"O jovem casal Christel e Eckhard Wehage não conseguiu encontrar, durante anos, um emprego numa mesma localidade, muito menos uma casa comum. Obrigados a desistir, resolveram, no dia 10 de março de 1970, sequestrar à mão armada um avião no aeroporto de Schönenfeld, em Berlim Oriental, para que ele os levasse a Hannover. Mas os pilotos se fecharam no cockpit e aterrissaram novamente em Schönenfeld. O casal cometeu suicídio ainda dentro do avião", conta Hertle.
O regime comunista e as mortes
Entre os resultados mais impressionantes da pesquisa está a descrição da maneira como o regime comunista lidava com os mortos e seus parentes, diz Hertle. Se um cidadão alemão-oriental fosse morto ao tentar fugir do país, funcionários da Stasi mentiam aos parentes sobre a causa da morte, inventando um "acidente de trânsito", uma "fatalidade" ou até falsificando a certidão de óbito. Ou simplesmente ocultavam a morte.
"Em ao menos 11 casos, a morte não foi confirmada ou foi negada mesmo após haver uma consulta por parte dos parentes. Os nomes das vítimas, ainda que conhecidos pela Stasi, foram mantidos em sigilo. Em geral, não era permitido aos parentes ver o morto pela última vez. Em vez disso, eram forçados a concordar por escrito com a cremação e sepultamento. Em alguns casos, a urna foi enviada aos parentes pelo correio", diz Hertle.
Crianças entre as vítimas
Mas nem todos os 136 mortos perderam a vida durante uma tentativa de fuga. E muitas pesoas foram assassinadas, apesar de nem mesmo terem tido a intenção de fugir. Eles chegaram por engano muito perto da fronteira, por terem, por exemplo, se perdido.
Há também muitas crianças entre as vítimas. Elas brincavam na margem ocidental do rio Spree e acabaram caindo na água, morrendo afogadas a seguir. Como o leito do rio pertencia à Alemanha Oriental, ninguém do lado ocidental podia salvá-las.
As biografias de oito soldados de fronteira, mortos por fugitivos ou por companheiros, também estão documentadas. Para os pesquisadores, essas mortes também devem constar do livro, por estarem relacionadas com a política de fronteiras da Alemanha Oriental.
Os historiadores se dedicaram, contudo, apenas aos mortos relacionados ao Muro de Berlim. Para toda a extensão da fronteira entre as duas Alemanhas, o trabalho ainda está por ser feito, mesmo passados 20 anos da queda do Muro.
Autora: Nina Werkhäuser
Revisão: Soraia Vilela