Implantes provocam milhares de mortes no mundo
26 de novembro de 2018Problemas com implantes estão provocando cada vez mais mortes e complicações em pacientes de todo o mundo, revelou neste domingo (25/11) uma investigação do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ). Em todo o mundo são milhares de casos todos os anos.
A pesquisa investigativa, intitulada Implant Files, foi conduzida por mais de 250 jornalistas de 36 países, que analisaram milhares de documentos, concluindo que lacunas na regulamentação e controle de dispositivos médicos – como marcapassos, implantes mamários, contraceptivos, bombas de insulina ou próteses de quadril – provocam cada vez mais complicações, que são difíceis de identificar e quantificar.
Nos Estados Unidos, estima-se que complicações com esses dispositivos causaram 82 mil mortes e 1,7 milhão de feridos em dez anos.
Na França, de acordo com dados da agência nacional, o número de incidentes ligados a dispositivos médicos duplicou em dez anos, com mais de 158 mil complicações, sendo 18 mil casos só em 2017.
No Reino Unido, os reguladores receberam 62 mil queixas de incidentes com dispositivos médicos, entre 2015 e 2018, um terço dos quais tiveram repercussões graves no doente, e 1.004 resultaram em morte.
Na Alemanha foram registrados 14.034 casos envolvendo mortes e ferimentos ou outras complicações em 2017.
Após as revelações, a Comissão Europeia defendeu uma implementação mais rígida de regras e controles.
Problemas com a líder
De acordo com a investigação jornalística internacional, a líder de mercado em tecnologia médica, a Medtronic, pode estar associada a até 9.300 mortes e 292 mil pessoas feridas somente nos EUA.
Os produtos para implantes da Medtronic resultam em problemas em um em cada cinco casos, afirmou o ICIJ. A taxa de dispositivos médicos defeituosos da Medtronic seria, assim, o dobro da registrado em empresas concorrentes. Um relatório completo foi enviado às autoridades americanas.
A pesquisa investigativa apontou também que autoridades de Japão, Noruega e Austrália identificaram os produtos da Medtronic como a maior fonte de reclamações nos últimos cinco anos.
A Food and Drug Administration (FDA), a agência regulatória do Departamento de Saúde e Serviços Humanos dos EUA, explicou que o alto número de reclamações contra a Medtronic se deve ao fato de a empresa americana ser líder de mercado de dispositivos médicos.
No entanto, o ICIJ identificou vários casos em que a Medtronic foi acusada de má conduta legal e ética. Estes casos incluíram o uso controverso de implantes, assim como conexões dúbias com médicos que utilizam produtos da Medtronic ou que escrevem estudos sobre eles.
O porta-voz da Medtronic, Rob Clark, disse que as alegações do ICIJ "não são factuais" e não devem ser interpretadas como se a empresa tivesse violado "obrigações legais, éticas ou regulatórias". Segundo ele, todo produto médico acarreta algum risco.
A Medtronic fabrica dispositivos que visam ajudar a controlar o diabetes, lidar com dores crônicas e reduzir os efeitos do mal de Parkinson. Além disso, a empresa americana inventou um marcapasso sem fio do tamanho de uma pílula anticoncepcional.
Regulamentações mais rígidas na UE
Após as revelações do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos, a Comissão Europeia pediu uma melhor implementação de regras e controles. Em consequência do escândalo de 2017 em torno de implantes mamários rompidos, a União Europeia (UE) decretou um novo conjunto de regras, relatou uma porta-voz nesta segunda-feira. "Mas a história ainda não acabou. Como sempre, claro, a implementação é o ponto chave."
Os Estados-membros da UE, os fabricantes e os médicos foram solicitados a aplicar os mais rigorosos padrões de qualidade e segurança e a tornar seus trabalhos mais transparentes. A reforma visa principalmente controles mais rigorosos sobre dispositivos médicos antes e depois da colocação no mercado.
Para tal, foi criado o banco de dados Eudamed para ajudar na supervisão de dispositivos médicos. Segundo o relatório Implant Files, casos de dispositivos médicos suspeitos de causar ferimentos ou consequências fatais têm crescido fortemente. Na Alemanha, por exemplo, foram notificados no ano passado 14.034 casos de implantes ou próteses de quadril instáveis ou problemáticos.
No Estados Unidos, dispositivos médicos com defeito causaram 83 mil mortes e 1,7 milhão de ferimento na última década, segundo o relatório. Os jornalistas afirmaram que os implantes são feito para salvar e curar pessoas, mas a aprovação dos produtos é tão frouxa que estes podem destruir vidas.
Rede de laranjas como dispositivo vaginal
O Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos afirmou que, em muitos casos, não eram avaliados os produtos em si, mas apenas os documentos enviados. Além disso, os órgãos de registro e aprovação não agiam de forma independente, mas seriam comissionados e pagos pelos fabricantes.
Caso um órgão de certificação rejeitar um dispositivo médico, o fabricante pode tentar a certificação em outro. Na União Europeia existem cerca de 50 destes órgãos certificadores. Na Alemanha, por exemplo, apenas 84 dos 10.254 registros nos últimos oito anos foram negados. A certificação é feita por empresas privadas.
A pesquisa foi iniciada por uma jornalista holandesa. Em sua pesquisa, ela tentou obter o certificado de dispositivo médico para uma rede de laranjas, sob o argumento que seria implantado como uma rede vaginal em mulheres com queixas de dores no assoalho pélvico. Três órgãos de admissão sinalizaram com uma provável aprovação – ela então interrompeu o experimento.
A fim de evitar que danos de dispositivos médicos se tornem públicos, os fabricantes frequentemente sujeitam os pagamentos de indenizações a acordos de confidencialidade. Além disso, as empresas médicas pagaram nos últimos 10 anos aproximadamente 1,4 bilhão de euros para apaziguar acusações de corrupção e fraude.
O mercado de implantes é bilionário. Mundialmente, são movimentados 282 bilhões de euros por ano. E quanto mais velha se torna a sociedade, mais dinheiro pode ser feito por meio de dispositivos médicos.
PV/dpa/afp/lusa
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