Imprensa se divide sobre reproduzir capa do "Charlie Hebdo"
15 de janeiro de 2015O aviso "Plus de Charlie Hebdo" ("Charlie Hebdo esgotado") foi pendurado em muitas bancas de jornal na França na manhã de quarta-feira. A nova edição do semanário satírico se esgotou rápido na maioria das bancas do país. Três milhões de cópias foram impressas – 50 vezes mais do que antes do ataque.
A empresa francesa MLP, responsável pela distribuição do semanário, disse à DW que a publicação está agora disponível em seis países adicionais aos que já recebiam o jornal antes dos ataques. Entre outros, Estados Unidos, Reino Unido e Noruega receberam exemplares. Ao todo, 26 países constam na lista da MLP, a maioria deles na Europa. E a lista deve aumentar: a distribuidora recebeu pedidos do Líbano, Camarões, Cingapura, Chile, República Dominicana e outros cinco países.
Mas os leitores que não conseguiram comprar uma cópia original puderam de qualquer forma ver – ou foram confrontados com – os desenhos produzidos pela equipe sobrevivente do semanário. A capa do Charlie Hebdo foi amplamente reproduzida pela mídia ocidental, mas também fortemente criticada como blasfêmia por muitos muçulmanos em todo o mundo.
Europa
A maioria dos meios de comunicação franceses decidiu reproduzir a capa, que traz uma charge do profeta Maomé chorando, sob o slogan "tudo está perdoado". Entre eles, estavam os jornais de grande circulação Le Monde, Libération e Le Figaro.
Muitas publicações europeias conhecidas decidiram seguir o exemplo. Na Alemanha, Der Spiegel e Frankfurter Allgemeine Zeitung, que estão entre os veículos mais importantes do país, usaram a charge em seus sites. O Süddeutsche Zeitung dedicou duas páginas para as caricaturas; O Frankfurter Rundschau foi um dos jornais que imprimiram a capa do Charlie Hebdo em sua primeira página. O esquerdista Die Tageszeitung dedicou toda a sua capa ao Charlie Hebdo. A DW também mostrou imagens da capa da revista.
No Reino Unido, The Times of London e The Guardian também reproduziram a capa. O site do The Guardian incluiu o aviso: "este artigo contém a imagem da capa do jornal, que alguns podem achar ofensiva". The Independent também mostrou a charge em sua versão impressa, enquanto o The Daily Telegraph não. A BBC mostrou a capa em seus telejornais.
Na Espanha, os principais jornais diários publicaram a imagem em suas páginas online e a emissora estatal mostrou-a em seus noticiários. Na Dinamarca, o jornal Jyllands-Posten que provocou polêmica ao imprimir caricaturas de Maomé em 2006, não reproduziu a capa.
Mundo muçulmano
O jornal turco pró-secular Cumhuriyet publicou na quarta-feira quatro páginas com trechos do Charlie Hebdo, mas sem incluir a capa controversa mostrando a caricatura do profeta Maomé. O jornal afirmou que a polícia havia permitido distribuição só após verificar que não havia imagens de Maomé impressas. Depois de um pequeno grupo de estudantes pró-islâmicos fazer um protesto do lado de fora da redação jornal em Ancara, guardas protegem o prédio.
Dar al-Ifta, no Cairo, um dos centros mais importantes em questões de direito religioso islâmico, chamou de capa de uma "provocação injustificada" para milhões de muçulmanos e alertou que a charge provavelmente vai desencadear uma nova onda de ódio.
As grandes emissoras internacionais árabes Al-Arabiya e Al-Jazeera decidiram não mostrar a capa. O Irã, que condenou veementemente o ataque da semana passada contra o Charlie Hebdo, chamou a nova capa da revista de um insulto ao Islã. A porta-voz do Ministério do Exterior iraniano, Marzieh Afkham, disse que a publicação "provoca os sentimentos dos muçulmanos de todo o mundo".
Américas
Nos Estados Unidos, muitos meios de comunicação foram relutantes em mostrar a imagem. The New York Times, o segundo jornal mais lido dos EUA, informou na capa sob o título "Capa desafiadora com Maomé do Charlie Hebdo acende debate sobre liberdade de expressão". O jornal preferiu fazer um link para a cobertura no site do francês Libération, em vez reproduzir a capa ele mesmo. A agência de notícias Associated Press tem uma política de evitar imagens ofensivas a religiões e, por isso, não mostrou o desenho. As redes ABC e CNN não mostraram a capa.
As imagens, entretanto, foram exibidas em programas da CBS, assim como nas edições online do The Wall Street Journal e USA Today, respectivamente, os números um e três nos EUA, em termos de circulação. The Washington Post, assim como tabloides como o New York Daily News ou o The New York Post, estavam entre os que mostraram a charge.
A capa foi amplamente divulgada na América Latina. O museu sobre jornalismo Newseum, baseado em Washington, afirmou que 12 dos 58 jornais brasileiros, a maioria deles jornais Metro, publicaram a capa. A imagem do profeta apareceu nas edições online de jornais de destaque em todas as Américas, entre eles, o jornal de maior circulação na Argentina, Clarín, a Agência Brasil, o jornal peruano líder Peru 21, além de La Nacion, na Costa Rica, e El Universal, do México.
África
Na África, muitos jornais não destacaram a mais recente edição do Charlie Hebdo como um de seus assuntos mais importantes em suas primeiras páginas. Muitos meios de comunicação do continente reproduziram na quarta-feira em seus sites matérias de agências de notícias sobre o jornal. A maioria deles decidiu não mostrar a capa. No Quênia, o jornal Daily Nation mostrou uma foto de pessoas em pé na fila para comprar a última edição em Paris. O Conselho de Imãs e Pregadores do Quênia condenou as caricaturas de Maomé como blasfêmia.
Ásia
Na Índia, o canal de televisão de notícias hindi Aaj Tak publicou as caricaturas de Maomé do Charlie Hebdo em seu site. O Diário do Povo Chinês, o jornal oficial do governo, apresentou a capa do jornal em seu site. Sediado em Tóquio, o Yomiuri, um dos jornais com maior tiragem do mundo, fez como muitos outros meios de comunicação: mostrou o alto da capa do Charlie Hebdo, sem mostrar a imagem do profeta Maomé.
Austrália
The Australian, mais vendido jornal de circulação nacional do país, publicou em sua capa uma foto do líder da comunidade islâmica Keysar Trad segurando a última edição do Charlie Hebdo. "Embora as caricaturas possam ser ofensivas para alguns muçulmanos, a revista tem feito a mesma coisa com os líderes religiosos e vem fazendo isso há anos", disse Trad, de acordo com The Australian.