Intervenção dos EUA na Síria pode fortalecer Al Qaeda, aponta especialista
25 de agosto de 2013Cresce a tensão entre a Síria e as potências ocidentais. No que concerne o país árabe assolado pela guerra civil há quase dois anos e meio, a pergunta central no momento é: o regime de Bashar al-Assad empregou ou não armas químicas contra a população?
A oposição acusa o ditador de haver causado a morte de 1.300 civis, ao utilizar, na última quarta-feira, gás dos nervos em grande escala, em bombardeio contra localidades sob o controle dos rebeldes, nas cercanias da capital, Damasco.
A mídia estatal síria rebate a imputação com fotos e declarações do Exército, supostamente provando terem sido os insurgentes a empregar gás tóxico. Neste domingo (25/08), Damasco concedeu à Organização das Nações Unidas permissão para examinar os locais dos presumíveis ataques químicos.
Em agosto de 2012, o presidente norte-americano, Barack Obama, traçara uma "linha vermelha" no conflito entre o regime e os rebeldes sírios: caso ficasse comprovado o emprego de armas químicas, isso justificaria uma intervenção militar dos EUA na guerra civil.
Em conversa telefônica neste sábado, Obama e o premiê britânico, David Cameron, mostraram-se preocupados com a situação na Síria. Ambos concordam que, caso se confirme uma ofensiva química, a comunidade internacional deverá responder com uma reação séria. A Casa Branca diz que, antes de uma eventual intervenção, pretende seguir coletando e verificando os fatos "em coordenação com parceiros internacionais".
Günter Meyer é professor do Instituto Geográfico da Universidade de Mainz e diretor do Centro de Pesquisa do Mundo Árabe (ZEFAW, na sigla em alemão). Em entrevista à Deutsche Welle, ele analisa e adverte sobre as consequências de uma possível intervenção dos EUA na guerra civil da Síria.
Deutsche Welle: Qual é a probabilidade atual de que ocorra uma intervenção militar dos Estados Unidos na Síria?
Günter Meyer: Uma mobilização militar dos EUA é altamente improvável. É o que denotam, por um lado, as declarações do presidente Barack Obama, extremamente cautelosas. Por outro lado, o chefe do Estado-Maior norte-americano, Martin Dempsey, desaconselha expressamente uma missão militar. É certo que haveria a possibilidade de intervir agora, mas não há uma estratégia de retirada. É muito grande o perigo de, caso o regime seja derrubado, o poder cair em mãos dos fundamentalistas islâmicos, dos combatentes da Al Qaeda. Eles compõem, de longe, a maior força militar dentro do país, depois do Exército sírio.
Mas, como se configuraria uma eventual missão militar dos EUA na Síria?
A Secretaria de Defesa quer evitar por todos os meios mobilizar soldados para o local. Uma outra possibilidade seria decretar uma zona de exclusão aérea sobre a Síria, mas tal só é possível com a permissão das Nações Unidas. Isso daria muito trabalho, já que toda a defesa aérea síria teria que ser posta em nocaute. Ela foi equipada com mísseis ultramodernos da União Soviética, portanto trata-se de uma operação militar muito trabalhosa, de custos bilionários.
Uma solução mais simples, que foi proposta, seria destruir os campos de pouso das Forças Armadas sírias. Isso seria perfeitamente plausível, pois aí os aviões de combate não teriam mais como pousar. No entanto, uma pista de aterrissagem destruída se reconstrói bem rápido. Também para uma operação do gênero seria necessária a permissão das Nações Unidas, e a Rússia e a China [membros do Conselho de Segurança com direito a veto] provavelmente não estarão dispostas a tal.
Qual seria a meta de uma intervenção militar?
Caso se institua realmente uma zona de exclusão aérea, isso significa um enorme enfraquecimento do regime de Bashar al-Assad, pois suas vitórias militares se baseiam, acima de tudo, no fato de deter a soberania absoluta do espaço aéreo da Síria. Caso não se possa mais garantir essa soberania, e também com o bombardeio das pistas de pouso, aí ficará mais difícil para o regime se afirmar perante os rebeldes.
Até que ponto uma operação militar externa alteraria a situação na Síria?
Ficaria, de fato, muito difícil para o regime se manter no poder. Mas também é grande o risco que a Rússia intervenha de forma ainda mais intensiva, e, claro, também é de se esperar um revide por parte dos iranianos. Além disso se criaria um vácuo de poder, que seria preenchido pelo lado mais forte, que no momento são os adeptos da Al Qaeda.
A vitória da oposição não só desencadearia uma carnificina contra os seguidores de Assad, como possibilitaria o estabelecimento de um califado fundamentalista islâmico na Síria, com a mais forte concentração de membros da Al Qaeda em todo o planeta.
Haveria consequências para os países vizinhos da Síria?
Quanto mais intensos os combates e quanto mais regiões forem envolvidas, maior será o número de refugiados, sem dúvida.
Como a população dos Estados Unidos encara uma possível ação militar?
Os meios de comunicação de massa nos EUA são, em enorme proporção, manipulados pelos republicanos. Estes exigem com veemência a mobilização de tropas norte-americanas para a Síria, de forma a enfatizar ainda mais o poder dos EUA e sua responsabilidade enquanto potência hegemônica.
E como os sírios veem a situação?
Eles estão divididos. De um lado, temos uma parte do povo sírio que continua do lado do regime [Assad]; do outro lado, a maioria da população, que é contra. Estes saudariam uma intervenção. E aí há os rebeldes, cujo entusiasmo pela causa definhou bastante, desde que a Al Qaeda se transformou num pólo de oposição forte.