Kluge recebe o mais renomado prêmio literário da Alemanha
13 de maio de 2003“Com Alexander Kluge, a Academia Alemã de Língua e Literatura honra um autor que se distingue dos poetas, romancistas e dramaturgos que já receberam o principal prêmio literário alemão. Afinal, Kluge não é nada disso. Ele também não é ensaísta, historiador, nem autor de obras científicas. A busca da verdade é uma variante em seus escritos, não seu programa. Sua obra é a literatura – por muito tempo ao lado do cinema e da TV –, contudo uma literatura que não aceita a distinção entre fato e ficção. Pela primeira vez na história deste prêmio, a Academia optou por um autor cuja prática narrativa dificilmente se deixa reduzir a um nome.”
Inclassificável – Assim resume o Frankfurter Allgemeine Zeitung o efeito-surpresa da premiação de Kluge, também registrado em outros importantes jornais alemães. Como um dos principais representantes da literatura documental dos anos 60 e 70, Kluge certamente já faz parte do cânon literário alemão. Neste sentido, a premiação chega até como homenagem tardia. Por outro lado, a repercussão do fato revela a ousadia da escolha. Apesar de a ruptura de gêneros e as manifestações intermídia não representarem nenhuma novidade, a opinião pública alemã certamente ainda encontra dificuldade em digerir aquilo que escapa a categorias e rótulos tradicionais.
Aprendiz de Adorno e Lang – O jurista nascido em Halberstadt, em 1932, foi aluno de Theodor Adorno na Universidade de Frankfurt, na mesma época que o filósofo Jürgen Habermas, e fez suas primeiras experiências com cinema como assistente de Fritz Lang. Após ter feito alguns curtas e documentários, Kluge contribuiu para a renovação do cinema alemão, lançando o Manifesto de Oberhausen, com Edgar Reitz e Peter Schamoni. Ele se tornou internacionalmente conhecido com seus dois longas, Abschied von Gestern (Despedida de Ontem, 1966) e Die Artisten in der Zirkuskuppel: ratlos (Os Artistas na Cúpula do Circo: Perplexos, 1968).
Livros – Ao publicar suas primeiras obras literárias (Lebensläufe / Trajetórias, 1962; Schlachtbeschreibung / Descrição da Batalha, 1968), Kluge já era conhecido por seus filmes. Ele escreveu contos e ensaios. Em co-autoria com o sociólogo Oscar Negt, surgiram livros como Öffentlichkeit und Erfahrung (Opinião Pública e Experiência), Geschichte und Eigensinn (História e Obstinação) ou Massverhältnisse des Politischen (Proporções do Político). No ano 2000, a editora Suhrkamp lançou sua obra narrativa completa sob o título Chronik der Gefühle (Crônica de Sentimentos).
Mídia e inovação – À frente de outros cineastas, Kluge descobriu as possibilidades inovadoras da televisão, esta mídia de massa encarada com ceticismo pela geração de 68. Desde a propagação da TV privada na Alemanha, a partir de 1984, Kluge já proclamava uma “televisão de editores”. Como diretor da produtora DCTP (Development Company for Television Programs), ele se uniu a editoras renomadas e conseguiu obter licença e abrir espaço para seus programas em importantes emissoras privadas.
TV de autor – Com mais de 70 anos, Alexander Kluge ainda faz programas de cultura para a TV. De forma artesanal, sem muito aparato técnico além de uma blue box, ele transformou seu apartamento em Munique num miniestúdio, realizando o programa 10 para as 11 (emissora VOX) praticamente sozinho e assumindo as funções de roteirista, diretor e produtor. “O processo do filme de autor é abdicar da divisão de trabalho”, declarou uma vez o artista, denominado por Habermas “o único inventor de projetos de grande porte” na Alemanha.
Ao lado de Dürrenmatt – O prêmio Georg Büchner é concedido desde 1923 a “escritores de destaque que contribuíram para constituir o atual ambiente cultural da Alemanha.” Entre os os autores premiados, estão Friedrich Dürrenmatt, Erich Kästner, Botho Strauss, Günter Grass, Wolf Biermann, George Tabori e Wolfgang Hilbig. Alexander Kluge receberá o prêmio Büchner, dotado em 40 mil euros, no dia 25 de outubro, em Darmstadt.