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Europa deve abolir fronteiras nacionais, afirma Lech Walesa

Barbara Cöllen / Bartosz Dudek (ca)29 de setembro de 2013

Em entrevista exclusiva, Prêmio Nobel da Paz e ex-presidente polonês Lech Walesa diz que o continente europeu deve ter mais solidariedade e se desenvolver na direção de uma república federativa.

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Foto: DW/B. Dudek

Por ocasião do seu 70º aniversário, o ex-chefe de Estado polonês Lech Walesa falou de seu projeto de uma Europa unida em entrevista à Deutsche Welle. Sua biografia é singular: originalmente eletricista, em 1980 assumiu a liderança do primeiro sindicato livre do bloco comunista na Europa Oriental, o Solidariedade de Gdansk. Dez anos mais tarde tornou-se presidente da Polônia, nas primeiras eleições livres em seu país após a queda do comunismo.

Para Walesa, a Alemanha, como peso-pesado no continente europeu, deveria continuar assumindo a responsabilidade pela superação das crises e pelo desenvolvimento de ideias para o futuro. O Prêmio Nobel da Paz de 1983 afirma, ainda, que países mais abastados deveriam ajudar Estados com menos dinheiro na construção da infraestrutura, por exemplo, sendo ressarcidos posteriormente. O ex-sindicalista afirma que "divisões e fronteiras pertencem ao passado". Para a integração europeia, no entanto, é preciso prosperidade em todo o continente.

Deutsche Welle: Muitos países do leste e do sul da Europa invejam a Polônia pela virada democrática e pelos avanços econômicos das últimas duas décadas, para os quais o senhor contribuiu decididamente. Apesar disso, dezenas de milhares de poloneses foram recentemente às ruas de Varsóvia protestar contra o governo liberal de Donald Tusk. O líder da oposição nacional conservadora, Jaroslaw Kaczynski, está à frente agora nas pesquisas de opinião. O que há de errado com os poloneses?

Lech Wałesa: Em primeiro lugar, nós não dispusemos de um século para o desenvolvimento da democracia e tivemos que acelerar o máximo possível para acompanhar o Ocidente. Muita coisa se acumula numa aceleração assim. Em segundo lugar: o que são algumas dezenas de milhares em relação a 40 milhões? Se tivéssemos reunido os descontentes em outro país, também nos Estados ricos, então tenho certeza que os protestos teriam uma dimensão ainda maior.

Em terceiro lugar: nossa democracia provou seu valor. Embora tenha havido manifestações, esses protestos foram exclusivamente pacíficos. Recolheram-se assinaturas e a conta pela insatisfação dos cidadãos deverá ser paga na próxima eleição. Ou seja, a Polônia passou no teste com a sua democracia e pode servir como modelo de como lidar com o descontentamento.

Em entrevista ao semanário alemão Die Zeit, o senhor expressou o desejo de que os alemães fossem mais corajosos e tivessem maior influência sobre o desenvolvimento e planejamento da Europa. Mas eles acabaram se tornando um bode expiatório, no esforço em combater a crise na Europa. A mídia grega, por exemplo, mostrou caricaturas de Angela Merkel usando uniforme nazista. Como o senhor vê a política alemã para a Europa?

Desde sempre os líderes políticos são criticados. E a Alemanha é um peso-pesado – e isso em todos os setores. Mas os alemães também assumem a responsabilidade pela superação das crises e desenvolvem ideias para o futuro. E eles devem continuar assim. Em tempos em que fronteiras são abolidas, tudo em gira em torno da Europa, não em torno da Alemanha ou Polônia. Nós não deveríamos mais pensar em termos de fronteiras nacionais.

Existem muitos temas novos, contemporâneos, como informação, ecologia, crises – por exemplo, a financeira. Aqui não se trata mais de um banco, mas de um comportamento responsável por parte dos bancos em geral. Então vem a questão do dinheiro: a Alemanha tem, os outros, não. Na Europa, por exemplo, precisamos de uma boa rede de autoestradas, também na Albânia. Ali e em outros lugares, falta dinheiro para tal, então a Alemanha deveria assumir esse encargo e receber o dinheiro de volta, ao longo dos próximos 50 anos. O dinheiro não deve ficar guardado nas meias.

DW Interview mit Lech Wałęsa
Pouco antes de completar 70 anos, Lech Wałesa (esq.) concedeu entrevista à Deutsche WelleFoto: DW

Em relação à Alemanha, muitos estereótipos e preconceitos são revividos, quase 70 anos após o fim da Segunda Guerra Mundial. Essa situação não se acirraria ainda mais se os alemães começassem a construir autoestradas pela Europa?

De jeito nenhum. Para a integração europeia, precisamos de prosperidade na Europa. Conflitos podem ser evitados somente se, por exemplo, construirmos autoestradas por todas as partes, então a situação vai melhorar em todos os lugares. Existe toda uma lista de tarefas, como, por exemplo, as redes de comunicação.

Os Estados que têm dinheiro também deveriam disponibilizá-lo para países mais pobres e depois ser lentamente ressarcidos. Isso é um bom negócio para todas as partes envolvidas. Esta geração deveria começar a construir o Estado europeu, mas deveria fazê-lo com muito cuidado.

Como esta geração devem proceder, exatamente?

Ninguém sabe ao certo. Para chegar até lá, precisamos de estruturas europeias maiores. Divisões e fronteiras pertencem ao passado. Em quase todas as nossas atividades, somos ainda assaltados por guerras e lembranças. Mas aos poucos nos distanciamos disso. É um processo penoso, mas temos feito grandes progressos. O importante é construir a Europa unida com base em valores comuns, que no momento ainda diferem de país para país.

Nós deveríamos esboçar uma espécie de catálogo de valores, uma espécie de decálogo com dez mandamentos, desenvolvido por fiéis de todas as crenças e também por ateus. O desenvolvimento da futura Europa deveria acontecer sobre este fundamento.

Neste domingo (29/09), o senhor está celebrando 70 anos. Olhando em retrospecto, sabe-se que contribuiu decididamente para a queda do comunismo. Hoje ainda existem muitas ditaduras que perseguem, até mesmo matam seus cidadãos. Qual é a sua receita, como se pode derrotar uma ditadura?

Minha receita se chama: solidariedade. Naturalmente, essa solidariedade difere de país para país. É particularmente importante que os EUA, a única superpotência que restou, também sejam encorajados a remodelar o mundo de forma que, quando antissemitismo, racismo, limpezas éticas ou armas químicas aparecerem em algum lugar, o mundo aja imediatamente e elimine os problemas.