'Amsterdá do Leste'
6 de abril de 2011Para alguns, a vida começa somente à noite, na capital da República Tcheca. Um point bem movimentado é o Cross Club, com três andares e apresentações de DJs e bandas musicais.
O clube acabou se transformando no local ideal para bandas alternativas e novos músicos que experimentam um estilo musical próprio e, vez por outra, também outros estados de consciência: "A cultura musical está muito associada ao uso de drogas. Sempre foi assim", diz o dono da casa noturna, Tomas Zdenek, ou "Lorenzo", como chamam os habitués do Cross.
"Muitos músicos só chegaram onde estão graças às drogas. Alguns dos que se apresentam aqui fumam maconha, e o público também, claro", diz o proprietário tcheco.
Sem medo da polícia
Localizado no bairro de Holešovice, o Cross Club não é somente um ponto de encontro. Ele incorpora um estilo de vida, pois em Praga nasceu e se desenvolveu todo um milieu, com restaurantes, clubes e lojas próprios.
Para o público jovem e alternativo, Praga tornou-se uma referência. Os visitantes vêm de todas as partes do mundo curtir a música, fumar maconha e experimentar uma sensação de liberdade.
Um terço dos frequentadores do Cross Club vem do exterior, calcula Lorenzo. "Muitos gostam de poder fumar maconha livremente nas ruas e nos bares e clubes. Isso não existe nos seus países de origem, onde têm de se esconder, pois têm medo de ter logo que passar uma noite na delegacia, por causa de uns gramas de maconha. Felizmente aqui é diferente", pondera.
Estatísticas
Os entorpecentes são proibidos na República Tcheca, mas a lei define limites bem "camaradas" para quem for pego com drogas. Embora representando infração, o porte de 15 gramas de maconha, um grama de cocaína ou 1,5 grama de heroína não implica consequências penais.
Entre os adeptos dos entorpecentes o clima é de euforia. No Cross Club estima-se que pouco a pouco Praga vai empatando com outros paraísos das drogas, como a holandesa Amsterdã.
Entretanto a polícia da capital tcheca acompanha a tendência com preocupação. A estatística mais recente aponta o crescimento do cultivo da cannabis, a planta da maconha. Em 2010 foram iniciadas 145 plantações para fins comerciais, dois terços a mais que no ano anterior.
O meio das drogas mudou drasticamente na República Tcheca, constata Jakub Frydrych, coordenador de um comando especial da polícia na luta contra o narcotráfico. "No início dos anos 1990, a coisa era até romântica, os pequenos cultivadores trocavam as ervas entre si, o clima era mais espiritual-filosófico", analisa o agente.
Atualmente, no entanto, o crime organizado é que domina a cena. O comando antidrogas de Frydrych dispõe de 180 funcionários, distribuídos por toda a República Tcheca. Traficantes de países vizinhos como a Alemanha e a Polônia também acorrem para se abastecer com a droga.
Pela legalização da maconha
A maconha é, hoje, um fenômeno de massa. Porém Frydrych se preocupa mesmo é com a heroína e a anfetamina pervitin. O estimulante sintético é produzido em laboratórios da República Tcheca sem necessidade de equipamento muito caro ou complicado: "Qualquer um pode produzir pervetin. Há fabricantes até mesmo em vilarejos. É difícil para nós controlarmos", relata Frydrych.
Tanto os políticos quanto a polícia rejeitam veemente o rótulo "Amsterdã do Leste" dado à capital tcheca. O que não prejudica em nada a atratividade de Praga entre os consumidores. Para Frydrych, o grande problema é a tolerância social para com as drogas no país. Tradicionalmente o consenso maior é em relação à maconha: quase ninguém se importa que se fume um baseado em público.
E este é o ponto de partida dos defensores da legalização irrestrita da maconha. Todos os anos eles organizam uma grande passeata em Praga, sempre na primavera. Este ano o grupo pró-cannabis pretende mobilizar cerca de 8 mil pessoas para a manifestação.
Autor: Kilian Kirchgessner (br)
Revisão: Augusto Valente