Copa do Mundo
28 de junho de 2011No gramado do centro esportivo nos arredores da cidade de Düsseldorf, na Alemanha, a seleção brasileira de futebol feminino começa a ensaiar os passos rumo a uma possível conquista inédita: a vitória na Copa do Mundo. O treino comandado pelo técnico Kleiton Lima é intenso. O sol do verão germânico, implacável.
No cantinho do campo, deitada de bruços, uma das jogadoras recebe tratamento rotineiro de recuperação muscular na coxa direita, com um pequeno aparelho de contração. É Marta, a estrela do time. Sorridente, ela observa no visor do aparelho o tempo que ainda falta para seguir recebendo os pequenos choques. "Podemos conversar agora, pode ser?", diz a alagoana à reportagem da Deutsche Welle, segundos antes de um dos integrantes da equipe técnica da seleção despejar sobre a cabeça da atleta uma pequena garrafa com água. "É batismo!", brinca o colega, diante dos risos de todos.
O clima de descontração ganha ar mais sério quando a alagoana de 25 anos começa a falar de sua determinação em levar para casa o troféu de campeã do mundo. "Está mais do que na hora de a gente chegar a essas finais e fazer diferente", sentencia, confiante.
Apesar do estupendo desempenho individual de Marta – eleita por cinco anos consecutivos a melhor jogadora do mundo – o time brasileiro vem sentindo nos últimos anos apenas o gosto amargo do segundo lugar: o vice-campeonato da Copa do Mundo de 2007, na China, e duas medalhas de prata nos Jogos Olímpicos de Atenas, em 2004, e de Pequim, em 2008. "No Brasil, o segundo lugar não é considerado. Claro que não é um título, mas para o futebol feminino, que já passou por vários momentos difíceis, chegar a duas finais de olimpíada e uma de mundial é grande coisa", diz a atacante.
Atualmente jogando no New York Flash, dos Estados Unidos, a "Rainha Marta" avalia que, apesar da força do futebol norte-americano, são as alemãs que oferecem mais perigo neste mundial. "Quando você tem a torcida a seu favor, dá uma motivação a mais", explica. Ela garante, no entanto, que o grupo não vai se intimidar se topar com as alemãs ao longo da competição. "Temos que estar preparadas para enfrentar qualquer equipe", diz.
Deutsche Welle: Vocês estão otimistas com esta Copa na Alemanha? É a vez do Brasil?
Marta: Estamos super animadas e o otimismo existe sempre quando se trata de uma competição de alto nível, como é uma Copa do Mundo. E pelo fato de a gente vir já há muitos anos se destacando mundialmente nos torneios mais importantes, vai crescendo cada vez mais a vontade de conquistar um título de alto nível. A equipe está bem representada, tem meninas novas e também outras com bastante experiência. Espero que essa mistura de experiência de juventude possa trazer bons resultados já na estreia, para que a gente possa começar bem.
Como controlar a ansiedade neste momento?
Estou super tranquila, tento passar isso para as meninas também, para que quando chegar o momento certo a gente possa definir as coisas e não ter nada que atrapalhe psicologicamente. Agora vamos ter mais uma chance. Está mais do que na hora de a gente chegar a essas finais e fazer diferente. Já passamos por finais, já sabemos como é jogar em uma. Então encaramos de uma maneira não mais fácil, mas mais tranquila.
Das três equipes adversárias desta primeira fase (Austrália, Noruega e Guiné Equatorial), qual deve ser a mais dura?
Todas serão bastante difíceis, são adversárias que nós não temos tanto conhecimento. A não ser a Noruega, sabemos o estilo de jogo delas – um estilo bem forte, uma pegada bastante intensiva, com muita marcação. A Austrália vem se preparando já há algum tempo, é a atual campeã da Ásia, tem meninas novas, com alto nível. E por ser estreia também vai ser bastante difícil.
Existe a pressão da estreia?
Sem dúvida, a pressão sempre existe quando se trata de Brasil. E isso acontece devido aos destaques que viemos conquistando ao longo do tempo, como o vice-campeonato mundial (2007), e as duas medalhas de prata nas Olimpíadas (2004 e 2008). A pressão vem não apenas por parte do público brasileiro, mas também do público mundial, que já tem uma visão diferente da equipe brasileira.
Qual seleção deste mundial deverá dar mais trabalho para o time brasileiro em futuros confrontos?
Sem dúvida será a Alemanha, por estar jogando em casa. Sem menosprezar as outras equipes, mas quando você tem a torcida a seu favor, é lógico que isso dá uma motivação a mais. E também pelo fato de a Alemanha ser bicampeã mundial e estar sempre se destacando em competições de alto nível. É uma escola que já há muitos anos está em primeiro e segundo lugar no ranking. Mas o Brasil neste momento está pensando na estreia, nas três equipes que vai entrar no seu grupo nesta primeira fase. Temos que pensar uma coisa de cada vez. Mas se vier a Alemanha, ou os EUA, ou qualquer outra equipe que seja, temos que estar preparadas para encará-las.
Vocês chegaram a ver a partida da Alemanha contra o Canadá?
Vimos muito pouco. Aproveitei quando fui para a coletiva de imprensa, vi alguma coisa, mas não dava para me concentrar nas perguntas e ver o jogo ao mesmo tempo. Mas vimos que o Canadá é uma equipe muito forte, tanto que a Alemanha ganhou de 2 a 1, num jogo bem apertado. Sabemos que este Mundial será assim: com equipes fortes, um nível muito alto.
Como você está preparando para a marcação individual cerrada que os treinadores das equipes adversárias do Brasil provavelmente estão planejando?
Eu já convivo com esta pressão há muito tempo. A partir do momento em que você se destaca, recebe maior atenção por parte da imprensa e das adversárias. Em vez de colocar uma na marcação, eles colocam duas, uma na sobra. Acho que não vai ser diferente neste Mundial. Mas, se isso acontecer, espero que abra espaço para as outras meninas e elas possam aproveitar bastante.
Uma vitória nesta Copa poderia ajudar a mudar o cenário do futebol feminino no Brasil?
Essa é uma esperança que a gente tem: poder conquistar um título de alto nível, como uma Copa do Mundo, ou brigar por uma medalha de ouro nas Olimpíadas, para que a gente possa ter algo em mãos para reivindicar. Em geral, no Brasil, o segundo lugar não é considerado. Claro que não é um título, mas para o futebol feminino, que já passou por vários momentos difíceis, chegar a duas finais olímpicas e uma de Mundial é grande coisa. Mas a gente não quer só isso. Queremos ser campeãs mundiais para que realmente possamos ter um futuro melhor para a modalidade dentro do país.
Autora: Mariana Santos
Revisão: Alexandre Schossler