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"Missão da ONU não mudará causas do conflito", diz especialista

Mirja Annawald (fm)24 de março de 2006

O envio de tropas européias ao Congo continua um tema controverso na Alemanha. Especialistas comentam as decisões políticas.

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Tropas da UE ajudarão no processo eleitoral no CongoFoto: AP

Um tema atual da política interna alemã é a discussão dos prós e contras do envio de soldados da União Européia (UE)para garantir a segurança das eleições no Congo, em junho próximo. Será que o apoio de tropas da UE à Missão das Nações Unidas (Monuc) realmente terá efeitos positivos para o processo de paz no Congo, um país em crise por causa do regime ditatorial e em guerra civil? Ou para a UE é apenas uma questão de mostrar como está determinada?

Wolf-Christian Paes, do Centro Internacional de Conversão de Bonn (BICC), questiona em entrevista à DW-WORLD o sentido e a finalidade da missão ONU, presente no Congo desde 1999, com 16 mil soldados.

Em junho próximo, devem acontecer as primeiras eleições democráticas na ex-colônia belga. Desde o início da guerra civil, em 2003, já morreram cerca de quatro milhões de pessoas. Isso deixou muitas seqüelas em um país cuja infra-estrutura ainda é pouco desenvolvida.

Outros motivos que contribuem para a desolada situação são, sobretudo, a corrupção e a incapacidade do governo congolês de controlar o país e as áreas de conflito. Enquanto isso, as milícias e os rebeldes, chamados de warlords (senhores da guerra), controlam regiões inteiras do país. "Assim surgiram mercados de violência nos quais o poder é utilizado para a obtenção de vantagens econômicas", esclarece Paes.

Joseph Kabila
O atual presidente do Congo, Joseph Kabila, tem boa chance de ganhar os eleiçõesFoto: AP

Na eleição do dia 18 de junho, devem participar cerca de 28 milhões de eleitores. Para garantir uma segura evolução do processo eleitoral, devem ser enviados, até o fim de maio, 1500 soldados da UE à República Democrática do Congo. As tropas devem ficar estacionadas principalmente na capital Kinshasa, onde, no momento, a situação é relativamente tranqüila. Por isso, Paes acredita que seria pouco provável que a eleição na capital se torne problemática.

O especialista em questões africanas enfatiza que "problemáticos seriam os locais controlados pelas organizações rebeldes até há poucos meses, porque eles têm motivos para supor que perderão a eleição". Justamente nestas áreas é que "vai haver tensões". Mas Paes não acredita que exista uma ameça direta aos soldados alemães.

Klaus-Jürgen Gantzel, professor emérito de Ciências Políticas da Universidade de Hamburgo, é de outra opinião, principalmente em relação ao fato de os soldados irem desarmados para o Congo. "Seria o maior disparate ir para a região sem armas. Até mesmo os soldados da ONU estacionados ali já sofreram ataques de grupos rebeldes. Eu não sei a que ponto chega a capacidade de análise dos nossos militares para interferir na grave situação de calamidade política, social e econômica deste país imenso. Eu receio que haja um desastre."

Flüchtlinge kehren in Kongo zurück
Refugiados africanos em caminho incertoFoto: AP

É difícil fazer prognósticos com relação a possíveis cenários após o encerramento da eleição, já que ninguém tem experiências em processo eleitoral no Congo. Por isso, para o diretor da missão da ONU, Albrecht Conze, podem haver conflitos no período que antecederá o pleito. Por outro lado, espera-se poder levar adiante o processo de paz no Congo através de uma evolução pacífica da votação.

"Face ao grande fluxo de refugiados africanos, torna-se de grande importância estratégica contribuir para a estabilização deste país da África Central", disse a chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, na última segunda-feira (20/03), em Berlim, assegurando o seu apoio ao envio de tropas.

Esta importância estratégica não existe para Paes. "Do nosso ponto de vista, o que está errado é a forma como a missão está sendo planejada. O problema não é tanto o fato de se enviar soldados das Forças Armadas alemãs, o que muitos criticam. O maior problema é a limitação tempo-espaço: quatro meses e somente em Kinshasa. Isso é simplesmente muito pouco."

Para Paes, trata-se muito mais de um "ato de exibicionismo para mostrar serviço" e atender aos pedidos de ajuda da ONU. "Desde o começo da missão, em 1999, a ONU tem pedido às nações européias, insistentemente, o envio de tropas. Até agora, estão lá principalmente soldados de países em desenvolvimento. Eles são mal treinados e – sobretudo – mal equipados.

bewaffnete Milizen/Warlords in Somalia
Milícias e rebeldes controlam regiões inteiras do paísFoto: AP

Para o especialista, é indiscutível a necessidade de ação de tropas de paz no Congo no futuro próximo. "Não seria ruim se os europeus se engajassem um pouco mais. Afinal, o Congo foi uma colônia belga", acrescenta Paes. Seria necessária também uma mudança na atual estratégia do governo alemão com relação à África, para que, segundo Gantzel, "o processo de democratização possa ser levado adiante em um continente tão heterogêneo".

Paes identifica uma postura reservada do governo alemão em relação aos países africanos. "Existe uma política bem clara de se manter afastado dos assuntos da África, porque as questões destes países não atingem nenhum interesse alemão". Isso se deve principalmente ao fato de que o Congo não é um país importante para a opinião pública, como o Kosovo ou o Afeganistão.

Em conseqüência, a exploração de recursos minerais e os crimes continuarão no futuro. Apesar das altas quantias enviadas pelo Ocidente, principalmente para projetos de desenvolvimento na área humanitária, "o processo de desmonte das milícias e das organizações rebeldes ainda está longe de acontecer", critica Paes.

"Problemas estruturais desencadeiam os conflitos. O envio de 1500 soldados europeus não vai modificar nada. A atual missão da ONU não está mudando nada. Está tudo estagnado", acrescenta. Para concluir, o especialista resume: "O envio de tropas vai ser muito dispendioso. No final, todos vão acabar se parabenizando, mas depois disso, não deverá haver mais nenhuma intervenção da nossa parte no Congo."