Morte de líder da oposição causa revolta na Tunísia
7 de fevereiro de 2013Após violentos protestos pela morte do líder oposicionista Chokri Belaid, o primeiro-ministro tunisino, Hamadi Jebali, anunciou nesta quarta-feira (06/02) a formação de um governo de tecnocratas independentes. "Tomei a decisão de formar um governo de competência nacional, sem filiação política", disse Jebali em pronunciamento televisionado.
O partido islâmico Ennahda, que lidera a coalizão de governo, rejeitou nesta quinta-feira a proposta do premiê. "O primeiro-ministro não perguntou a opinião do partido", afirmou o vice-presidente da legenda, Abdelhamid Jelassi. "Nós achamos que a Tunísia precisa de um governo político", continuou. O partido pretende continuar negociando com outras agremiações a formação de uma aliança de governo.
Revolta popular
Cerca de mil pessoas se reuniram em frente ao hospital para onde o corpo de Chokri Belaid havia sido levado, nesta quarta-feira. O político oposicionista de esquerda foi morto a tiros no início daquela manhã, diante de sua casa.
O atirador, de identidade ainda desconhecida, literalmente o executou com cinco tiros na cabeça e no peito. A população está chocada e revoltada e mostrou sua revolta em alto e bom tom. "Somos todos tunisianos. Seja de direita, seja de esquerda, não importa. A Tunísia não é assim. Não dá para entender como algo assim pode acontecer em nosso país", gritou uma manifestante, com voz embargada. Foi a primeira vez desde a década de 50 que um político é baleado na Tunísia.
Na noite anterior ao seu assassinato, Belaid advertira, num programa de entrevistas na televisão, sobre assassinatos políticos. Ele mesmo havia recebido várias ameaças. Muitos políticos da oposição e representantes da sociedade civil foram protestar diante do hospital, assim como estudantes e universitários.
Ataque contra a revolução
Iyed Dahmani, deputado do partido de centro-esquerda Al Joumhouri, responsabilizou indiretamente o governo de coalizão, liderado pelo partido Ennahda, pelo assassinato. Dahmani disse que houve um atentado contra a revolução. "Responsáveis são aqueles que há meses vêm ignorando a violência política. Cada vez que avisávamos, eles diziam 'estes são nossos filhos, temos que dialogar com eles'. Hoje vemos que esse diálogo com os islamistas e os extremistas leva a assassinatos políticos."
Um cortejo fúnebre começou no hospital e atravessou o centro da cidade. Durante a tarde, milhares de pessoas se reuniram em frente ao Ministério do Interior em Túnis. "Pão e água, mas Ennahda não", gritaram os manifestantes, se referindo aos slogans da revolução, há dois anos. Eles exigiam a renúncia do governo e a convocação de uma greve geral, além de acusar os islamistas de serem culpados pelo assassinato.
Entre os manifestantes estava Mohamed, que votou no Ennahda nas eleições de outubro de 2011. "Votamos neles porque pensávamos que eles eram fiéis a Deus. Mas eles logo esqueceram a religião, ao invés disso, só estão interessados em seus cargos. Deus proteja nosso país", disse.
"Um homem do povo"
Belaid era um dos mais ferozes críticos da coalizão governista liderada pelo Ennahda. O comunista convicto, crescido num bairro pobre da capital, alertava para os perigos de uma nova ditadura. O político, de 48 anos, fundou ano passado, junto com outros partidos de oposição, a aliança partidária de esquerda Front Populaire, a terceira força política na Tunísia, de acordo com pesquisas.
O professor universitário Mohammed Souissi conhece Belaid desde os tempos de universitário. Ele ainda tenta entender o que aconteceu. "Ennahda e os salafistas o escolheram como alvo", afirmou, acrescentando que Belaid era um homem do povo, um político corajoso, temido pelos salafistas. "Belaid era alguém que inspirava a pensar, e isso é coisa de que a Tunísia precisa. Agora, o país acorda."
Souissi espera que o assassinato de Belaid venha a unir a sociedade tunisina, apesar de todas as diferenças políticas, e que as forças democráticas venham a lutar juntas por um Estado democrático.
Durante a tarde, a polícia desfez de forma violenta a manifestação em frente ao Ministério do Interior, que havia transcorrido de forma pacífica. Os policiais usaram cassetetes e gás lacrimogêneo contra a multidão. Até a noite ainda havia confrontos no centro de Túnis. Em outras regiões do país também ocorreram manifestações, escritórios do Ennahda foram atacados em várias cidades. Os partidos de oposição, por sua vez, suspenderam seus trabalhos na Assembleia Constituinte e convocaram uma greve geral para a sexta-feira, dia do enterro de Belaid.
Autora: Sarah Mersch, de Túnis (md)
Revisão: Alexandre Schossler