Morte de Teori afeta debate da descriminalização de drogas
20 de janeiro de 2017O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki tinha, por coincidência, sob seu controle exatamente os dois temas que mais perturbam o Palácio do Planalto. Um deles é óbvio e direto: a Operação Lava Jato, da qual Teori era relator no Supremo. O outro tangencia a crise que o presidente Michel Temer passou as primeiras semanas do ano tentando apaziguar: os massacres nos presídios e a evidente falência do sistema penitenciário brasileiro.
Em agosto de 2015, Teori pediu vista do julgamento do recurso extraordinário sobre a descriminalização do porte de drogas para consumo próprio. Trata-se de um recurso apresentado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo e que pede ao Supremo a absolvição de um réu por atipicidade da conduta – ele portava 3 gramas de maconha para consumo próprio e foi condenado à prestação de dois meses de serviços à comunidade.
O debate sobre a descriminalização das drogas voltou a ser visto com urgência pela sociedade civil e por autoridades públicas com a crise nos presídios. É quase consenso entre especialistas em segurança pública que o Brasil precisa discutir a diferença entre usuário e traficante de maneira clara para reduzir a superlotação em presídios. A Lei de Drogas de 2006, segundo especialistas, não solucionou o problema, gerando, na verdade, um efeito contrário, com condenações em série de usuários ou de chamados "microtraficantes”. A lei não determina critérios específicos para classificação de usuários e traficantes, abrindo espaço para avaliação subjetiva dos juízes. Dados do Departamento Penitenciário Nacional de 2014 apontam que 27% da população carcerária foi privada de liberdade por crime relacionado a tráfico de drogas.
Defensores da descriminalização viam com esperança o julgamento no Supremo, já que a tendência do Congresso, cujo perfil atual se mostra mais conservador, é endurecer penas e aumentar as possibilidades de encarceramento.
Havia forte expectativa de que o ministro despacharia o recurso de volta ao plenário até o final de 2016, permitindo ao Supremo retomar o julgamento. Em um de seus últimos e breves comentários sobre o recurso –o ministro evitava falar fora dos autos e sempre adotou a discrição na conduta–, ele esclareceu que analisava legislações de outros países.
Com a morte de Teori, caberá ao novo ministro do Supremo, que será indicado pelo presidente Michel Temer, deliberar sobre os pedidos de vista que estão no gabinete. A escolha do futuro ministro também poderá ter implicação direta no rumo das investigações da Lava Jato, que tem figuras importantes da República na mira do Ministério Público. O próprio Temer teria sido citado em uma das delações, o que vem a ser a principal causa da instabilidade política de seu governo. Porém, esse novo ministro também será figura crucial nos debates sobre o futuro do sistema carcerário. O julgamento final do Supremo poderá servir de norte para políticas públicas de segurança e contribuir para o arrefecimento de prisões por tráfico.
Dificilmente esse julgamento no STF será retomado no início do ano. O novo ministro deverá ser sabatinado pelo Senado apenas em fevereiro, na melhor das hipóteses. O Congresso estará com as atenções voltadas, nas próximas semanas, à sucessão nas presidências da Câmara e do Senado, que ocorre em 2 de fevereiro.
Após as escolhas dos comandantes das duas casas, os parlamentares precisam escolher os membros das comissões. A sabatina de indicados para o Supremo cabe à Comissão de Constituição e Justiça. Além da votação do nome do ministro na comissão, também há a análise no plenário do Senado, que precisa dar aval à escolha de Temer para a cadeira no Supremo.