1. Pular para o conteúdo
  2. Pular para o menu principal
  3. Ver mais sites da DW

Nova fase da Lava Jato abre período crítico para o governo

Jean-Philip Struck4 de março de 2016

Ao mirar diretamente Lula e Dilma, operação atinge centro do poder petista e pode dar impulso ao processo de impeachment, a menos de dez dias antes de um protesto contra o governo.

https://p.dw.com/p/1I7dE
Dilma e Lula em outubro de 2014Foto: picture alliance/landov/R. Patrasso

A Operação Lava Jato entrou numa nova fase nesta sexta-feira (04/03), que atingiu em cheio o centro do poder petista e deve ter sérias implicações para o governo da presidente Dilma Rousseff e a política brasileira. O ex-presidente Lula foi levado por agentes da Polícia Federal (PF) e prestou depoimento durante mais de três horas.

Nos últimos cinco dias, a crise que parecia ter dado sinais de calmaria no início do ano, voltou com força redobrada, após surgirem suspeitas de que tanto Dilma como Lula estão pessoalmente envolvidos no escândalo de corrupção na Petrobras. Cientistas políticos afirmam que, diante da enxurrada de novas acusações e ações, as próximas semanas vão ser críticas para o governo.

A ação que teve Lula como alvo ocorreu um dia depois da publicação pela revista IstoÉ de uma reportagem segundo a qual Delcídio do Amaral, ex-líder do governo Dilma no Senado, disse ao Ministério Público que a presidente sabia das irregularidades na Petrobras. Ela teria tentado influenciar as investigações do caso e beneficiar empreiteiros presos.

Delcídio não confirmou nem negou ter feito as acusações, sobre as quais ainda existem dúvidas quanto ao peso legal. Mas a publicação da reportagem foi suficiente para criar um novo fato político e incendiar a situação. Foi a primeira vez que acusações desse tipo tiveram origem numa figura do próprio partido e que ocupou um cargo tão importante. E também foi a primeira vez em dois anos de investigações que Dilma foi implicada tão diretamente.

No caso de Lula, a reportagem da IstoÉ afirma que Delcídio revelou aos promotores que o ex-presidente ordenou que testemunhas fossem pagas para atrapalhar as investigações.

O cientista político francês Stéphane Monclaire, da Universidade de Sorbonne, aponta que Lula corre o risco de ser alvo de um mandado de prisão preventiva caso os investigadores do caso encontrem evidências de que ele realmente agiu para obstruir o trabalho da Justiça.

"Além de conduzirem Lula para o depoimento, os investigadores apreenderam documentos em sua casa e em seu instituto. A análise pode vir a confirmar que Lula agiu para atrapalhar o trabalho da polícia", disse Monclaire, lembrando que o próprio Delcídio foi preso em dezembro pela mesma acusação.

"Lulinha paz e amor"

O episódio envolvendo a delação de Delcídio foi apenas um dos cruciais ocorridos nesta semana. Dias antes, executivos da empreiteira Andrade Gutierrez, envolvida no escândalo da Petrobras, afirmaram que fizeram pagamentos ilegais à campanha de Dilma em 2010, quando a presidente disputou seu primeiro mandato. Nesta segunda-feira, o governo também foi abalado pela saída de José Eduardo Cardozo do Ministério da Justiça, pasta responsável pela Polícia Federal.

No entanto, a condução de Lula por agentes da PF foi o episódio mais simbólico do novo desdobramento da crise e que arrisca tornar o embate político ainda mais tenso.

A ação provocou os primeiros protestos espontâneos de militantes contra e a favor do governo. Alguns militantes chegaram a se enfrentar e a brigar em frente à residência do presidente, em São Bernardo do Campo, e do local em que foi tomado o depoimento. Até agora, protestos desse tipo só haviam ocorrido com convocação prévia e semanas de planejamento.

Membros do PT também prometeram chamara militância às ruas para defender o ex-presidente, afirmando que as ações da polícia e dos promotores são "perseguição".

A ação da PF foi realizada num momento em que Lula vinha fortalecendo uma ofensiva, que incluía o uso de um tom mais duro contra a imprensa e promotores para rechaçar as acusações de corrupção. No último sábado, o presidente disse que "acabou a fase Lulinha paz e amor" e declarou que e, se o PT entender que é "necessário", ele será candidato à Presidência em 2018.

Após o depoimento desta sexta-feira, no escritório da PF no aeroporto de Congonhas, o ex-presidente disse em tom desafiador que a elite não se conforma com o fato de "esse merda de metalúrgico" ter ousado ser presidente da República. O petista também prometeu "percorrer" o país para defender seu governo.

Segundo o brasilianista americano Peter Hakim, do Instituto de Análise Política Inter-American Dialogue, com sede em Washington, a imagem de Lula e do PT devem sofrer ainda mais abalos, mesmo que seja feita uma campanha durante anos. "Lula tinha um status de personalidade mundial, e agora se tornou um político que é conduzido pela polícia e tem sua casa revistada", afirma.

Acirramento da crise e protestos

As revelações desta semana também ocorreram a menos de dez dias de um grande protesto contra o governo Dilma, marcado para o dia 13 de março e visto como um teste para determinar o nível de apoio à saída da presidente.

Segundo Monclaire, o protesto deve ser analisado com atenção, já que provavelmente a nova fase da Lava Jato terá como consequência fortalecer novamente o andamento do processo de impeachment, que andou enfraquecido nos dois primeiros meses do ano. "Esses novos fatos são muito graves e devem deteriorar ainda mais a situação do governo", afirma.

Hakim também vê a situação como perigosa para Dilma. "É preciso perguntar: ela realmente agiu para atrapalhar as investigações? Se isso se confirmar, esse é um elemento que pode ser fundamental para impulsionar um processo de impeachment, muito mais do que problemas nas contas do governo e a má situação econômica", afirma.

"Se Dilma renunciasse, essa poderia ser uma saída, mas o problema continuaria. Quem entraria no lugar dela? Nenhum político brasileiro tem um plano", conclui o brasilianista.