O auge e declínio do chavismo
3 de dezembro de 2015Em vida, o ex-presidente venezuelano Hugo Chávez (1954-2013) prometeu a milhões de seguidores um futuro próspero e não tão distante, patrocinado pelo "socialismo do século 21".
Quase três anos após sua morte, o saldo desse projeto político é negativo, e seu partido teme um acerto de contas da população nas eleições parlamentares de 6 de dezembro.
A DW conversou com dois especialistas em Venezuela sobre a evolução do chavismo e o que as pesquisas locais descrevem como um minguante apoio popular.
Para o cientista político Jesús Azcargorta, Chávez criticou duramente o status quo que a maioria dos venezuelanos associava a corrupção e elitismo quando foi candidato à presidência em 1998.
"Chávez atraiu distintos grupos sociais e instrumentalizou muito bem a noção de 'povo' para se aproximar de cidadãos comuns, promovendo-se como seu interlocutor direto no Estado. Por outro lado, o mandato de Chávez (1999-2013) foi muito bem afortunado", comenta Azcargorta, autor do livro Los partidos monopólicos latinoamericanos.
Chávez, um político de sorte
O pesquisador explica, ainda, que a sorte desempenha um papel nada desprezível na política. Para ele, por contar tanto tempo com os altos preços do barril de petróleo no mercado internacional, Chávez teve a sorte que não tiveram seu predecessor na presidência, Rafael Caldera (1994-1999), nem seu sucessor, Nicolás Maduro.
"Além disso, Chávez chegou ao poder quando começava um novo auge da esquerda na América Latina e isso lhe garantiu apoios duradouros", afirma Azcargorta.
Claudia Zilla, do Instituto Alemão de Relações Internacionais e Segurança (SWP, na sigla em alemão), não está certa de que o isolamento progressivo dao chavismo na América Latina influencie a política interna do país a ponto de catalizar a atual queda de popularidade do governista Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV) que, de acordo com as pesquisas, deverá perder a sua hegemonia na Assembleia Nacional.
Mas, como Azcargorta, a especialista aponta que os fatores materiais não explicam, por si só, nem o período de ascensão nem o declínio do chavismo.
Uma nova exclusão
Para entender o que acontece com a "revolução bolivariana", é essencial fazer um balanço dos elementos tangíveis e intangíveis. Zilla afirma que o boom petroleiro permitiu a Chávez criar programas sociais e também desenvolver, por muitos anos, um discurso populista convincente.
"Esse discurso politizou fenômenos como a desigualdade econômica e chamou a atenção para a exclusão social de diversos setores da sociedade venezuelana, com a intenção de polarizar e fazer distinções entre o 'povo' e a 'elite'", afirma a especialista do SWP.
Ela acrescenta, ainda, que essa forma de política simbólica tem um alto poder de persuasão em países com carências notáveis, onde muitos estão ou se sentem excluídos em termos econômicos, sociais, culturais e de identidade.
"Além dos benefícios materiais que os setores marginalizados da Venezuela receberam, a argumentação de Chávez alimentou um sentido de pertencimento da população. Ele lhes disse 'vocês são o povo e agora governamos para vocês'", opina Zilla.
Mas, segundo a pesquisadora, esse processo de inclusão funcionou até que deixou de ser a prioridade. O objetivo do chavismo, que se impôs com o tempo, acabou se tornando uma nova exclusão: "a estigmatização pública, a agressão física e a detenção arbitrária de quem protesta contra os desatinos dos funcionários públicos ou criticam as políticas do governo, por exemplo".
"Esses desaforos do Estado estão causando problemas agora porque ninguém encontra leite no supermercado. O imaterial tem um peso maior para as pessoas apenas quando o material deixa de satisfazer suas necessidades", conclui Zilla.