O Brasil na imprensa alemã (31/08)
31 de agosto de 2022Süddeutsche Zeitung – Me bate (30/08)
"Estar preso, estar morto ou a vitória", assim o presidente brasileiro de extrema direita Jair Bolsonaro vê seu futuro após a eleição. Depois de seu primeiro duelo na televisão com Lula, pode-se dizer que o destino poderá ser a prisão.
No fim, ele participou. Domingo à noite, num estúdio de televisão em São Paulo, câmeras, holofotes espalhados pelo local. No palco, seis candidatos atrás de púlpitos lado a lado. Poderia ser um game show, mas aqui não se trata de dinheiro e sim da Presidência do Brasil.
É o primeiro debate da campanha eleitoral. Já se passou uma hora e meia e, até agora, o atual presidente Jair Bolsonaro não se saiu nada mal. Mas então vem a pergunta sobre a queda da taxa de vacinação no Brasil, cada vez menos pessoas tem se vacinado contra o sarampo e a poliomielite, diz a jornalista Vera Magalhães. [...]
"Vera, não podia esperar outra coisa de você", diz Bolsonaro, cuja gravata com listras brancas e pretas treme suavemente. Ele voltou a colocar os óculos que, em outros momentos, segurou na mão ou deixou sob o púlpito. "Acho que você dorme pensando em mim. Você tem alguma paixão por mim". Silêncio.
O candidato Ciro Gomes ri incrédulo, depois balança a cabeça, coloca a mão na testa, como se não pudesse acreditar. Só agora Bolsonaro está com a corda toda. Toda a pergunta foi baseada numa mentira, diz Bolsonaro, com os olhos arregalados e as mãos gesticulando no ar. "Você é uma vergonha pro jornalismo brasileiro", diz então ele...
De fato, é bastante provável que Bolsonaro, caso perca as eleições, tenha que responder a uma série de processos por corrupção e por sua gestão catastrófica da pandemia. 700 mil brasileiros morreram de covid-19, em parte, porque o presidente sempre minimizou o vírus e seus riscos. [...]
Seu governo escancarou subitamente os cofres estatais, milhões foram destinados a programas sociais e para subsídios de combustíveis. Presentes da campanha eleitoral. E viu assim a diferença contra seu adversário Lula encolher. Neste meio tempo, um segundo turno é dado como certo e sua reeleição parece possível. Mas quanto mais apertada fica a corrida, mais tenso fica o clima. Os nervos estão à flor da pele, principalmente os do próprio presidente. [...]
A primeira rodada [do debate] termina, a segunda começa e então vem o ponto, no qual, segundo avaliaram comentaristas depois, Bolsonaro perdeu o debate: depois de uma pergunta crítica, Bolsonaro ataca a jornalista Vera Magalhães, uma mulher. Nas últimas semanas, porém, Bolsonaro cortejou muito propositalmente as mulheres.
A diferença de Bolsonaro e seu adversário é enorme entre as eleitoras. A retórica machista de Bolsonaro não as agrada. O político de direita e ex-capitão fez no passado frequentes comentários depreciativos sobre as mulheres. [...]
O ataque de Bolsonaro novamente a mulheres ao vivo para milhões de telespectadores deve ter destruído parte destes esforços [o aceno ao eleitorado feminino]. Nas redes sociais, irrompe ainda durante o debate uma onda de indignação. No estúdio, as candidatas, as outras apresentadoras e o candidato Lula, em suas palavras finais, solidarizam-se com a jornalista. [...]
Depois de três horas, acabou. Para os comentaristas está claro: o desempenho de Bolsonaro foi miserável.
A questão agora é quanto esse resultado terá influência no final. Muitos dos brasileiros, como mostram as pesquisas, já se decidiram. Os fãs de Bolsonaro aplaudem sua atuação, como sempre. [...]
die tageszeitung – O primeiro debate antes das eleições no Brasil (30/08)
Oficialmente, a campanha eleitoral no Brasil começou em 16 de agosto, mas para muitos ela só engrenou no domingo. Em São Paulo, ocorreu o primeiro debate eleitoral.
O presidente ultradireitista Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do partido de esquerda PT, haviam indicado que se manteriam distantes dos debates televisivos. Mas pouco antes do debate, ambos declaram surpreendentemente que participariam – e assim ficariam frente a frente pela primeira vez e junto com outros quatros candidatos.
Como esperado, muitas perguntas foram dirigidas a Bolsonaro, que defendeu suas políticas, atacou Lula chamando-o de "mentiroso" e "ex-presidiário", mas parecia às vezes nervoso. Segundo uma pesquisa não representativa do instituto Datafolha, ele foi o candidato que se saiu pior. Bolsonaro causou indignação ao afirmar que a jornalista Vera Magalhães era "uma vergonha pro jornalismo brasileiro". Quase todos os candidatos se solidarizaram com Magalhães.
Seu adversário Lula falou muito sobre seus dois mandatos, mas proporcionou poucos momentos brilhantes ou novas ideias. Ele também quase não aproveitou as poucas chances de falar sobre o tema central desta campanha eleitoral: a crise econômica e o empobrecimento da população. [...]
Apesar do debate, tudo indica um duelo entre Lula e Bolsonaro. [...]
Lula ainda tem uma clara vantagem, mas nas últimas semanas Bolsonaro avançou. Isso provavelmente se deve ao Congresso ter aceito recentemente a declaração de emergência proposta pelo governo, que suspendeu o teto de gastos. Isso possibilita mais gastos com benefícios sociais. Embora limitado a três meses e criticado pela oposição – cuja maioria apoiou a medida – como "manobra eleitoral", Bolsonaro deve se beneficiar com isso.
Frankfurter Allgemeine Zeitung – O amplificador de Bolsonaro (27/08)
O empresário brasileiro e bilionário Luciano Hang é dono de uma das maiores redes de lojas de departamento do Brasil e não esconde seu apoio ao presidente Jair Bolsonaro – pelo contrário. [...]
Nenhum outro empresário do Brasil possui uma relação tão íntima com Bolsonaro. E nenhum vai tão longe pelo presidente nacionalistas de direita. Com frequência, Hang aparece ao lado de Bolsonaro. Há alguns dias, os dois comeram juntos numa churrascaria em São Paulo e depois foram ao estádio ver uma partida de futebol. [...]
Hang não precisa da proximidade com políticos. Ele tem boas condições. Há anos, Hang, de 62 anos, aparece na lista de bilionários da Forbes. Sua fortuna atualmente é estimada em 4,8 bilhões de dólares. [...]
Além da rede de lojas, Hang é proprietário de postos de gasolina, uma imobiliária, um fundo de investimentos e até uma usina hidrelétrica. Quase ninguém sabia quem era o proprietário da Havan. Mais isso mudou em 2016, quando surgiram na internet boatos sobre o proprietário. Hang não se importava se pensavam que sua empresa era chinesa, americana ou coreana. Mas quando a Havan foi relacionada a políticos e ao PT, o empresário se preocupou e interveio. [...]
Dois anos depois, surgiu Jair Bolsonaro, que era praticamente desconhecido até então, - um político com o qual Hang gostaria de ser associado. [...]
Hang e Bolsonaro parecem inseparáveis. E isso apesar de alertas de assessores de ambos os lados sobre essa grande proximidade. Alguns diretores da Havan temem que a imagem da rede possa sofrer com a queda da popularidade de Bolsonaro nos últimos anos. Hang não está preocupado. Desde que se tornou um ativista político, ele disse não ter notado queda no faturamento. Ele se preocupa muito mais com o Brasil. Mas também no Palácio do Planalto, alguns assessores pedem prudência. O motivo: Hang é alvo de uma série de investigações e processos judiciais por sonegação de impostos, lavagem de dinheiro e outros crimes. As investigações revelaram uma rede de empresas de fachada e offshores que foram usadas para ocultar transações. Em 1999, a empresa foi condenada a pagar 100 milhões de reais em impostos retroativos – um recorde na época. A Havan conseguiu parcelar a dívida em 115 anos. Tudo isso não se enquadra na autodescrição de Hang nas redes sociais: um "patriota que luta pelo Brasil".
cn/bl (ots)