O doente imaginário
3 de setembro de 2003Sintomas leves de doenças modernas tornam qualquer um interessante e sexy. E esta nova tendência de querer chamar a atenção com doenças nada graves já sustenta todo um setor industrial. Esta é, pelo menos, a opinião do médico e jornalista de ciência Werner Bartens, que já provocou grande indignação entre pacientes, médicos e lobby farmacêutico.
Quem precisar...
Que sintomas são esses – pergunta-se Bartens, sem disfaçar uma ponta der sarcasmo – senão os mais corriqueiros incômodos reinterpretados como terrível sofrimento? “A capacidade de aceitar sofrimento e privação como parte da nossa existência está desaparecendo”, explica ele, laconicamente. A quem estiver procurando sintomas adequados para compensar qualquer coisa, recomenda-se a leitura se do livro de Bartens, intitulado O que será que tenho? – As melhores doenças do mundo (Was habe ich bloss? – Die besten Krakheiten der Welt). Na forma de “bulas” irônicas, o autor mostra “indicações e contra-indicações” de tais doenças.
Ajudar quem...
Os inúmeros grupos de auto-ajuda para n doenças diferentes são uma pedra no sapato de Bartens. Na sua opinião, eles fazem com que certas doenças psicossomáticas se tornem alvo de atenção pública, sem que o grau de risco dos pacientes justifique tal projeção. “Em Freiburg foi formado um grupo de ajuda para crianças que choram”, cita Bartens um exemplo. É bem verdade que as crianças continuam chorando – ora mais, ora menos –, mas nada disso importa, pois o essencial é poder formar um grupo que permita basicamente uma coisa: conversar sobre isso.
Quem acreditar...
Nos últimos anos, apareceram cada vez mais doenças – e isso, não só na Alemanha. Uma hora, é a “síndrome do zezinho espoleta” entre crianças inquietas, outra, a menopausa do homem, e agora se fala até da “síndrome do tigre na jaula”. Calcula-se que 20% dos jovens pais de família já sofram desta moléstia. No entanto, esta é apenas mais uma das inúmeras invenções da indústria farmacêutica, denuncia o jornalista Jörg Blech. Afinal, a “síndrome do tigre na jaula”, cujos sintomas são nervosismo e dificuldade de tomar decisões, infelizmente não conseguiu se estabelecer. Com isso, os calmantes de ervas naturais continuam nas prateleiras da farmácia, intocados.
Quem sentir falta...
Até os médicos parecem bastante tolerantes e abertos em relação às novas doenças, conta Bartens com humor, em seu livro: “Numa revista de medicina, um médico descreveu de brincadeira o quadro de uma nova doença: ’distúrbio de entusiasmo generalizado’. Na verdade, ele só fez isso para testar seus colegas, mas acabou recebendo respostas indignadas de outros médicos, reclamando a sério que tinham comprovado em seus pacientes sintomas completamente diferentes para este distúrbio.”
Estatísticas indicam que cada vez mais pacientes vão ao médico com sintomas psicossomáticos. “Na Alemanha, entre 300 mil e 1,5 milhões de pessoas de todas as faixas de idade sofrem de doenças difíceis de serem diagnosticadas”, afirma o porta-voz da Federação de Seguros de Saúde (KBV), Roland Stahl. Quanto às verdadeiras causas, só existem especulações vagas. “Por um lado, alguns capitulam diante das exigências de uma sociedade movida a produtividade e concorrência. Por outro, a supersensibilidade de algumas pessoas parece revelar um novo fenômeno sociológico, uma tendência de querer se assegurar contra todos os riscos possíveis.”