O papel da população na difícil luta contra a dengue
16 de setembro de 2019Waneska Barboza tem nas mãos um mapa do bairro Palestina, na zona norte de Aracaju. Os locais assinalados com pontos vermelhos serão inspecionados ainda hoje, afirma a secretária municipal de Saúde da capital de Sergipe. Eles indicam os potenciais locais de reprodução do Aedes aegypti, o mosquito transmissor da dengue. "Bacias, baldes, lavanderias, caixas d'água, tudo que tem reservatório de água – 80% dos problemas estão relacionados às casas", afirma.
Dias antes, uma equipe da Secretaria Municipal do Meio Ambiente fotografou o bairro da periferia com drones, e depois fez um mapa com as 989 fotos aéreas do local. Agora uma equipe formada por 50 agentes de combate às endemias e 70 da limpeza urbana realiza as visitas domiciliares.
Do jardim da moradora Elaine Lorenço, os funcionários retiram sofás velhos, pneus de carros e resíduos plásticos: os vizinhos os jogam por cima do muro, queixa-se. "A gente pede para que eles não joguem lixo, mas eles jogam de todo jeito: durante a noite ou de manhã cedo." Se água se acumula no lixo, ele se torna um local perfeito para a reprodução dos mosquitos da dengue.
Lorenço teme por sua família. Recentemente, um sobrinho ficou 15 dias no hospital com dengue, sua mãe também. E ela tem um bebê de nove meses e uma filha de seis anos, que poderiam ficar doentes; assim como Antony, de quatro anos, que também ajuda na arrumação, concentrado.
Duas ruas à frente, Ronisy Santos examina um quintal. Os cães da moradora idosa sequer queriam deixá-la passar pelo lavatório. O que ela procura primeiro? "Reservatório com água, a lavanderia, para ver se tem algum foco", frisa Santos. E as grandes caixas d'água azuis que a maioria das casas tem no telhado. "E, geralmente, eles os deixam abertos, aí tem focos. Sempre estamos nas casas das pessoas educando, mas, infelizmente, elas não compreendem."
Os funcionários da Secretaria Municipal de Saúde já sabem onde estão as maiores dificuldades. "São as pessoas mais velhas, que não acreditam que a dengue realmente exista. Elas não têm essa aceitação, por mais que a gente converse", explica a agente comunitária de saúde Edina Andrade Pereira. "É a mesma coisa da vacina: são eles que não querem tomar a vacina, porque acham que vai fazer mal para eles", acrescenta a secretária Waneska Barboza.
Em 2019, a dengue se alastrou em Sergipe do interior seco para a costa chuvosa, explica Sidney Sá, gerente do núcleo de epidemias da Secretaria de Saúde do estado. Por que nas regiões secas? "É a falta d'água que muitos municípios enfrentam, o que obriga as pessoas a armazenarem água, e elas armazenam de forma errada", frisa Sá. Várias caixas d'água não têm tampa. Em seguida, os funcionários da equipe de Sá aplicam inseticidas nos recipientes de água.
Alguns habitantes filtram ou fervem a água antes de beber, para matar as larvas, pois não entendem que a dengue é transmitida pela picada do mosquito e não pela ingestão de água contaminada. "A compreensão da população é um fator primordial para nós. Nós estamos pedindo a cooperação da população", informa Sá.
Mas muitas vezes a cooperação não existe. Há anos a equipe de Sidney Sá atravessa o estado, realizando um trabalho de conscientização da população. Mas a dengue persiste: a expansão não planejada das cidades, a destruição da natureza e o clima descontrolado, com suas estações chuvosas atípicas, são fatores de que os mosquitos se aproveitam.
Além disso, de vez em quando falta pessoal adequado, bem como dinheiro para as campanhas. E às vezes até mesmo inseticida para o controle dos mosquitos. Ao lado dessas dificuldades, há os hábitos dos cidadãos. Pneus velhos de carros, copos de iogurte descartados, máquinas de lavar quebradas: o lixo se acumula em todos os lugares nos quintais e jardins das casas, e, nos entulhos, a água. Assim, o atraso e a falta de conhecimento se tornam fatídicos para a população, resume Sá.
"É uma questão cultural", diagnostica Waneska Barboza. Em algumas casas encontram-se montanhas inteiras de entulho. "Na consciência deles, isso não está errado. É um risco para toda a comunidade", analisa. Agora, os piores acumuladores de entulho passarão a receber tratamento psicológico, a fim de mudar seu comportamento, acrescenta a secretária de Saúde de Aracaju.
Atualmente Sergipe conta cerca de 4 mil casos de dengue. Embora outras regiões apresentem números muito mais altos, Sidney Sá está preocupado: "O risco é grande, pois estamos com um comportamento diferenciado da última epidemia de 2008, quando tivemos mais de 70 mil casos e 56 óbitos. Neste ano, temos um número reduzido de casos, nem 4 mil ainda, mas já estamos com 12 óbitos confirmados."
A maioria dos casos é de dengue tipo 2, extremamente agressiva, explica Sá: "A dengue está se apresentando com muito mais agressividade e levando as pessoas a óbito em pouco tempo, a partir do início dos sintomas." Para as equipes nas cidades e regiões rurais, o controle dos mosquitos se torna, assim, uma corrida contra o tempo.
______________
A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos no Facebook | Twitter | YouTube
| App | Instagram | Newsletter