Onda de violência em meio ao processo de paz na Colômbia
24 de novembro de 2016Com o novo acordo com as Farc, o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, busca consolidar seu legado como pacificador, dando fim ao conflito mais longo das Américas, um esforço que lhe valeu o Prêmio Nobel da Paz dias após o revés do referendo.
Liderado pelo ex-presidente Álvaro Uribe, o movimento de oposição criticou o novo acordo, dizendo que ele não avança o suficiente na abordagem das falhas do primeiro acordo, rejeitado pelos eleitores em 2 de outubro.
Mas Santos afirma que a última versão levou em conta as objeções da oposição, fortalecendo as proteções aos direitos de propriedade, modificando a participação política das Farc e reforçando o mecanismo que levará à implementação do pacto.
"O novo acordo define com precisão o sistema de justiça transicional para ex-combatentes e estabelece parâmetros claros para que o sistema judicial possa determinar e impor sanções e outras medidas em cada caso", disse Santos.
Setenta assassinatos
Uribe rebateu as denúncias de que elementos linha-dura do movimento de oposição teriam fomentado a violência política na véspera e logo após o referendo, após cinco líderes comunitários que apoiavam o acordo de paz terem sido mortos a tiros na semana passada.
"O governo finge enganar os cidadãos, ao culpar pela violência aqueles que não aprovam seu acordo de impunidade com as Farc", afirmou Uribe, em comunicado divulgado na quarta-feira.
"Os maiores riscos de violência se devem ao abandono da segurança, ao desmonte da cooperação cidadã, à desmotivação das Forças Armadas, ao crescimento desmesurado do narcotráfico e à impunidade concedida às Farc, os seus dissidentes, ao ELN [Exército de Libertação Nacional] e às mais de 3.500 gangues criminosas", acrescentou.
A Comissão Permanente para a Defesa dos Direitos Humanos (CPDH) diz que pelo menos 70 líderes comunitários e ativistas que apoiaram a paz com os rebeldes marxistas foram mortos desde janeiro. Segundo a entidade, os ataques representam um "plano sistemático e claro de extermínio e um ataque ao atual processo de paz".
"Embora seja verdade que os períodos pós-conflito em todo o mundo têm sido sangrentos, é urgente não só fazer uma avaliação, mas é uma prioridade tomar as medidas apropriadas e relevantes para parar este ataque contra as forças de paz", apelou a CPDH em um comunicado.
A CPDH, membro da Federação Internacional dos Direitos Humanos, com sede em Paris, registrou 314 casos de violência relacionados ao processo de paz em 2016, incluindo 232 ameaças, 21 ataques e 70 assassinatos de líderes comunitários.
A última série de ataques levou as Farc a publicar na segunda-feira uma carta aberta pedindo ao presidente colombiano que ponha fim à impunidade dos assassinatos dos defensores da paz rural.
"A situação é dramática e preocupante: mais de 200 mortes até o momento neste ano, sob um manto total de impunidade. Um novo genocídio está em andamento contra líderes sociais e camponeses", afirmou o texto.
"A história está se repetindo"
Aída Avella, presidente do partido de esquerda União Patriótica, que escapou do assassinato na década de 1990 por um suposto grupo paramilitar de direita, disse que a última onda de assassinatos parece familiar.
"Eu tive que enterrar centenas de colegas naquela época, e na semana passada senti como se estivesse de volta às décadas de 80 e 90", disse Avella ao jornal Miami Herald. "Todos os dias, recebemos notícias de pessoas sendo mortas, desaparecidas, baleadas. Eu sinto como se a história estivesse se repetindo."
Mas o ex-presidente Uribe pediu na quarta-feira que "os cidadãos persistam em sua luta, que é para o futuro da democracia", alertando para novas ações contra a ratificação do acordo de paz. "Vamos estudar nos próximos dias um conjunto de ações de apelo às pessoas nas ruas e nos cenários da democracia", prometeu Uribe.
A estagnação do acordo com as Farc pode provavelmente levar a mais casos de assassinatos de partidários da paz, um retrocesso que lembra a violência que proliferou em toda a Colômbia durante os anos 80 e 90. Na opinião do presidente Juan Manuel Santos, o risco de novos incidentes aumenta a cada dia que se passa sem o acordo de paz.