ONU suspeita de aumento nos abortos seletivos de meninas na Europa
10 de janeiro de 2013Para cada 112 meninos, nascem hoje na Albânia 100 meninas. Logo atrás, vêm Kosovo e Montenegro, com 110 e 109 meninos para cada centena do sexo feminino, respectivamente. Os números são de um recente estudo do Fundo de População das Nações Unidas. De acordo com especialistas, um modelo familiar arcaico explica tal cenário. Enquanto os meninos são considerados os filhos e herdeiros, mantendo o nome e a tradição, as mulheres deixam a família após o casamento.
Franziska Brantner, deputada do Partido Verde e membro da Comissão pelos Direitos das Mulheres no Parlamento Europeu, aponta uma combinação de diferentes fatores. "A pobreza. e com isso a falta de prevenção, além de uma forte discriminação contra as mulheres". Na Albânia, por exemplo, Brantner diz que o acesso a métodos contraceptivos está no nível de um país em desenvolvimento.
Consequências fatais da falta de mulheres
As consequências sociais devastadoras do excesso de meninos são indiscutíveis. "Se poderia pensar que, numa sociedade dominada pelos homens, as mulheres seriam tratadas como princesas, mas a realidade mostra que, para elas, a situação fica mais violenta e desagradável", considera Brantner.
Para Doris Stump, deputada suíça na Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, em Estrasburgo, há uma correlação entre a prostituição e a falta de mulheres. "A disponibilidade de mulheres é assegurada por outros meios, através da importação de mulheres de outros países como se fossem uma mercadoria, por assim dizer ", afirma.
Além disso, o estudo do Fundo de População das Nações Unidas constatou que o número de casamentos forçados de menores, como também a taxa de suicídios entre as mulheres estão aumentando.
Desenvolvimento chocante na Ásia
Biologicamente é normal haver uma proporção sexual de 105 meninos para cada 100 meninas nascidas. Esse desequilíbrio natural é compensado, mais tarde, por uma maior mortalidade de recém-nascidos e crianças do sexo masculino. No entanto, em algumas regiões da Índia ou da China, atualmente, essa proporção já é de 120 a 130 meninos para cada 100 meninas.
Em toda a Ásia, faltam cerca de 117 milhões de mulheres, segundo estimativas do especialista em demografia Christophe Guilmoto, do Instituto de População e Desenvolvimento da Universidade Paris-Descartes.
Guilmoto vem investigando há anos a proporção mundial entre os gêneros e participou do atual estudo da ONU. Dado o desenvolvimento internacional e fazendo referência à palavra genocídio, os demógrafos já utilizam o conceito de "generocídio", ou seja, o assassinato pelo gênero.
Consequências do diagnóstico pré-natal
Os avanços médicos impulsionam, infelizmente, o aborto seletivo. Assim, através de imagens de ultrassom, os médicos podem determinar o sexo do feto a partir da 14ª semana de gestação. No entanto, em muitos países europeus, o aborto é proibido no segundo trimestre da gravidez, assim como também é proibido abortar uma criança em função do sexo.
Mas as estatísticas de gênero em países como a Albânia ou Macedônia apontam para um cenário distinto. Os números indicam que as leis são amplamente violadas, ou seja, que o aborto é praticado ilegalmente ou que a interrupção da gravidez é justificada por outros motivos que não seja o sexo.
Feministas também veem uma tendência de seleção do sexo nos Estados-membros da União Europeia (UE). Nesse contexto, a mídia dinamarquesa relata um verdadeiro turismo de aborto para a Suécia, onde é legalmente possível interromper a gravidez até a 18ª semana de gestação.
Estudos da Noruega e do Reino Unido constataram um excedente de meninos entre os imigrantes de culturas asiáticas, especialmente no segundo ou terceiro filho. A suspeita de abortos deliberados não se deixa, no entanto, comprovar através de taxas nacionais de natalidade.
Seleção por inseminação artificial
Também no diagnóstico genético pré-implantacional (PGD, na sigla em inglês) há uma seleção de sexo, disse a presidente do Conselho de Ética alemão, Christiane Woopen. "Segundo as estatísticas europeias, existem casais que, após três filhos do mesmo sexo, realizam um PGD, e somente um embrião do sexo oposto é transferido para o útero."
No PGD, os genes dos óvulos fecundados são analisados in vitro. Nesse processo, o sexo também é determinando. "Temos que garantir que o PGD continue sendo exceção", alerta Woopen sobre a Alemanha. O problema é que em outros países europeus o PGD é tratado, em parte, de forma mais relaxada do que na Alemanha, onde cada caso deve ser ouvido por um conselho de ética.
Recurso legal difícil
"A seleção pré-natal em função do sexo atingiu proporções preocupantes", constatou o Conselho da Europa em uma resolução de novembro de 2011. Mas a UE não dispõe de nenhum recurso legal para agir, já que as leis de aborto, assim como a perseguição judicial de infrações, estão sujeitas à política de saúde de cada país.
Assim, a UE também não pode exigir uma melhora da situação de países candidatos à admissão no bloco, como a Albânia e a Macedônia. Brantner lamenta que o Parlamento Europeu não tenha se ocupado do tema até hoje, porque se trata "não somente de uma questão de saúde, mas também de direitos humanos."
A parlamentar não defende leis mais rígidas de aborto. Além de melhorias sociais e do combate à pobreza, ela exige, sobretudo, uma mudança de consciência social. "É preciso, principalmente, uma mudança de consciência a favor da igualdade de direitos entre mulheres e homens", considera.
A Coreia do Sul é motivo de esperança. Através de leis e campanhas de mídia no país asiático, a proporção sexual no nascimento, que já foi de 115 meninos para cada 100 meninas, foi reduzida para 107 meninos para cada 100 meninas.
Autora: Claudia Hennen (ca)
Revisão: Luisa Frey