Opinião: Aproximação de Modi e Sharif mira negócios
Há apenas alguns meses, o vice-ministro indiano da Informação e Radiodifusão, Rajyavardhan Singh Rathore, declarava que Nova Déli realizaria "ataques cirúrgicos onde e quando decidisse", numa aparente advertência a Islamabad. Os choques de fronteira ao longo da região dividida da Caxemira haviam tensionado ao extremo as relações indo-paquistanesas, e os políticos de ambos os países acirravam substancialmente a retórica de guerra.
O relacionamento entre as duas nações vizinhas no sul da Ásia nunca foi amigável, desde que ambas ganharam independência do domínio britânico, em 1947. Ainda assim, os atentados de 2008 em Bombaim, que a Índia atribui a radicais islâmicos com base no Paquistão, provavelmente constituem a maior rebordosa recente para os esforços de paz na região.
Contudo, quando o nacionalista Narendra Modi assumiu o governo indiano, em 2014, começou um degelo das relações. O político hindu deu o primeiro passo, convidando seu homólogo paquistanês, Nawaz Sharif, para sua posse em Nova Déli. Este retribuiu o gesto, visitando a Índia, apesar da oposição em seu país, tanto por parte dos grupos islamistas quanto das poderosas Forças Armadas.
Agora Modi acaba de novamente mostrar imensa coragem e estatura de estadista, ao fazer uma breve parada em Lahore, a caminho para Nova Déli. Foi uma visita simbólica, de significado claro: o premiê indiano deseja se conectar com a liderança civil do Paquistão e aprofundar os laços bilaterais.
Ele não esteve naquela metrópole para assinar acordos comerciais ou para discutir o conflito em Caxemira, mas como portador de uma mensagem de paz. E o fato de Sharif o receber de braços abertos prova que também o seu governo deseja relações cordiais com Nova Déli.
Modi e Sharif são líderes populares em seus respectivos países, mas também são homens de negócios. As políticas econômicas de Modi para a Índia não estão livres de críticas, mas ele é conhecido como um líder que coloca os interesses da economia acima da política.
Sharif também quer iniciar comércio com o país vizinho e abrir as fronteiras. Seu gigantesco grupo industrial Ittefaq seguramente iria se beneficiar de negócios com uma potência econômica em ascensão como a Índia. Mas o que, ou melhor, quem está impedindo ambos de lançarem uma era de paz e prosperidade na Ásia Meridional?
Enquanto os dois chefes de governo lucrariam com uma melhora das relações entre a Índia e o Paquistão, o Exército paquistanês tem interesse estratégico e financeiro em manter hostis as relações bilaterais. O conflito da Caxemira, a guerra no Afeganistão e o avanço do extremismo islâmico no país conferem aos generais primazia nas políticas interna e externa.
Os conflitos também permitem aos militares reservarem para si a parte do leão do orçamento nacional. Em última instância, A paz com a Índia reduziria o tamanho do Exército. Isso é o que Sharif quer, mas ele tem pouco poder para confrontar os generais.
O político tentou melhorar os laços com a Índia durante seu segundo mandato, no fim da década de 90, mas a tentativa foi claramente sabotada pelas Forças Armadas paquistanesas, que lançaram uma guerra não declarada contra a nação vizinha na região de Kargil, no norte.
Em 2014, quando a situação indo-paquistanesa estava melhor, os militares fomentaram um movimento contra o governo de Sharif. Desde então, grande parte do tempo e da energia do premiê têm sido canalizados para lidar com as manifestações e protestos de rua organizados pelo ex-jogador de críquete Imran Khan. Agora que a situação doméstica está mais favorável para Sharif, após sua vitória nas eleições municipais, ele deseja voltar novamente o foco para a economia e o comércio.
A breve passagem de Modi pelo Paquistão e seu encontro cordial com Sharif despertarão oposição dos partidos religiosos paquistaneses, que contam com o respaldo do Exército. Khan também tentará se aproveitar das circunstâncias para pressionar Islamabad. Provavelmente ele vai se unir aos grupos fundamentalistas muçulmanos para iniciar um novo movimento de massa contra o premiê. Isso poderá forçar Sharif a recuar mais uma vez.
Tanto ele como seu homólogo enfrentarão resistência interna ferrenha se prosseguirem com a política de paz e bom relacionamento. O papel das Forças Armadas na política indiana é mínimo, portanto o desafio de Modi não é tão grande como o de Sharif. Mas também este tem que manter sob controle os extremistas hindus em seu partido, Bharatiya Janata.
Negócios e extremismo não combinam. Para Sharif, é hora de sair de vez das sombras do Exército, e de ou ele confrontar os generais e os grupos anti-Índia, ou esquecer de vez os interesses econômicos. Ele conta com apoio para sua agenda política: afinal de contas, assim como Modi, também ele é um primeiro-ministro eleito.