Mais uma vez, pausadamente, a explicação do que aconteceu na quinta-feira (14/06) no cenário político em Berlim: a chanceler federal alemã, Angela Merkel, passou a noite toda reunida com seu ministro do Interior, Horst Seehofer.
E eles não foram capazes de chegar a um acordo sobre uma futura política comum para refugiados. Então tiveram início reuniões separadas da União Democrata Cristã (CDU, partido de Merkel) e da União Social Cristã (CSU, legenda de Seehofer e partido-irmão da CDU na Baviera). Só esse fato já é um escândalo na relação entre as duas legendas irmãs.
E na reunião da CSU, Horst Seehofer anunciou então que, se necessário, vai agir por conta própria a partir da próxima segunda-feira: Sim, fazendo o quê? Basicamente, fechando as fronteiras da Alemanha para requerentes de refúgio.
Aprovação unânime da CSU: a legenda bávara quer proibir a entrada na Alemanha de refugiados que tiverem entrado primeiramente em outro país da União Europeia (UE), já tendo pisado praticamente em solo europeu – algo que se aplica a quase todos os imigrantes.
Ainda não se sabe como a CSU pretende pôr isso em prática, mas esse não é o ponto em questão. Trata-se de Angela Merkel e de seu futuro como chanceler federal da Alemanha. E se ela deve tolerar tal espécie de afronta.
Porque Merkel não concorda com uma ação isolada da Alemanha e continua a defender uma solução com todos os parceiros europeus. E acima de tudo: ela quer uma proteção melhor para as fronteiras externas da UE, para que elas possam continuar tão abertas quanto hoje. Mas essa saída em nível europeu não está à vista, e a CSU simplesmente não pretende esperar mais por ela.
Que opções estão na mesa agora? A chanceler federal detém a competência de estabelecer diretrizes no governo. Uma expressão bonita e complicada, mas não se sabe direito o que Merkel pode fazer com isso. Ela pode demitir Horst Seehofer, que não defende a posição dela numa questão central da ação governamental. Esse também seria, no entanto, o fim desse governo.
Ela também pode pedir um voto de confiança ao Parlamento. Mas de uma forma ou de outra: Merkel não pode tolerar que Seehofer aja sem ela, pois então não se trataria mais do seu governo, do governo de Angela Merkel.
Frequentemente, este é o caso na política: a pressão de uma longa situação de conflito é descarregada em poucas horas, momentos – desde o início, a CSU foi contra a política de refugiados de Angela Merkel, inclusive quando a chefe de governo alemã deixou que os refugiados antes retidos na Hungria entrassem na Alemanha em 2015.
Apesar de toda a solidariedade com Merkel, também muitos políticos da CDU já perderam a paciência há muito tempo. Em seus distritos eleitorais, esses deputados vivenciam dolorosamente a falta de apoio que desfruta a política liberal de Merkel para os refugiados, uma política que já foi podada o tanto quanto possível.
E a disputa vai muito além da política de refugiados: vivenciamos um zeitgeist nacional-conservador. Ao menos é o que muitos sentem. Encurralados pelo sucesso dos populistas de direita da legenda Alternativa para a Alemanha (AfD), tanto a CSU quanto partes da CDU cobra sua conta perante Merkel: não somente com sua política de refugiados, mas com todo o sistema Merkel. No fim do ano, haverá eleições na Baviera. Manter a AfD sob controle é prioridade máxima da CSU. Se necessário, contra Merkel, contra o próprio governo.
Angela Merkel vai conseguir retomar o controle da situação? Algo, hoje, difícil de imaginar.
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