Opinião: Merkel e Putin, adversários confiáveis
18 de agosto de 2018O formato diz tudo: declarações à imprensa apenas antes do encontro. Não são permitidas perguntas. Nos dez minutos em que apareceram em público, os dois travam um diálogo de surdos, como um velho casal de políticos. Não é surpreendente, depois de mais de uma década de estreita coexistência política.
Quando Merkel fala da grande "responsabilidade" que Berlim e Moscou têm em conflitos como a Síria ou a Ucrânia, isso significa, acima de tudo, estabilidade para o retorno dos refugiados à Síria. É a pressão por causa da discussão interna sobre política de migração. Já em seus esforços para estabilizar a Ucrânia por meio de garantias russas para o fornecimento de gás, ela acaba sendo repelida por Putin.
Tudo porque o presidente russo continua a chamar o gasoduto Nord Stream 2 de um "projeto meramente econômico". Bem, Merkel também levou anos para admitir publicamente que um gasoduto que só deve ser construído para contornar a Ucrânia como país de trânsito possui uma dimensão política. É certamente possível encontrar "outras" áreas para cooperação econômica, diz Putin. Mas isso não é fácil. A UE é contra isso de qualquer maneira, e os EUA já têm sanções contra a Nord Stream 2 engatilhadas.
A confiabilidade tem seu valor
O que nos leva ao terceiro protagonista invisível desse encontro. Desde que Donald Trump passou a saturar o mundo com seu fogo político cruzado, as relações entre Berlim com Moscou subitamente não parecem tão ruins assim. E elas já foram muito ruins. Desde a anexação da Crimeia pela Rússia, coube sempre a Merkel organizar as sanções contra a Rússia. Mas, com Trump, ambos os lados perceberam que esses tempos ruins eram na verdade os bons e velhos tempos de posições confiáveis. Posições claras acabaram se tornando valiosas.
Apesar da interferência russa nas eleições dos EUA e do possível envolvimento de Moscou no ataque com veneno no Reino Unido, eles ainda precisam um do outro. Juntos, é possível evitar o pior, como mostra a posição conjunta sobre o fim das negociações nucleares com o Irã.
O diabo está nos detalhes
Há muito tempo ficou claro para Berlim que a situação na Síria só pode ser estabilizada com a ajuda de Moscou. Talvez até com a participação do ditador Bashar al-Assad. Isso não vai sair barato para a Alemanha, Putin já deixou isso claro quando falou da importância da ajuda humanitária para permitir o retorno dos refugiados e mencionou especificamente o fornecimento de água e aquecimento – ou seja, a reconstrução da infraestrutura.
As pessoas se conhecem bem o suficiente para precisar apenas sugerir as coisas em público. Para muitos parceiros de longa data, a louça voa a portas fechadas.
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