Enquanto os líderes da União Europeia realizavam uma cúpula especial sobre a situação em Belarus e se recusavam a reconhecer o resultado da eleição, Alexander Lukashenko entrou subitamente em ação.
Agora que a UE lhe negou legitimidade, ele está livre para se comportar como quiser. Não há mais necessidade de fingir que a voz de Bruxelas é importante. Na reunião de seu conselho de segurança, ele exigiu que a polícia "reprimisse" as manifestações da oposição na capital Minsk – ou "distúrbios", como ele as chamou.
De forma um tanto previsível, Lukashenko também culpou a "interferência estrangeira" pelos protestos antigovernamentais e ordenou que seus diplomatas advertissem os líderes ocidentais, inclusive a chanceler federal alemã, Angela Merkel, que os responsabilizaria por "ingerência" em Belarus.
Essa assertividade redescoberta pode ser o resultado de quatro conversas telefônicas que teve com Vladimir Putin. O presidente russo é o único verdadeiro aliado que o homem forte de Minsk ainda tem. Apesar da percepção de antipatia pessoal um pelo outro, Putin fará tudo a seu alcance para ajudar Lukashenko a sobreviver politicamente.
O líder russo se vê como o campeão dos regimes autoritários sitiados do mundo: desde sua intervenção na Síria para socorrer Bashar al-Assad, seu firme apoio a Nicolás Maduro na Venezuela, até a revolução em Belarus. Entretanto, a seus olhos, nada se compara à Belarus.
O país é quase totalmente dependente economicamente e está ligado à Rússia por uma série de tratados. Os dois Estados têm um sistema comum de controle de fronteiras externas, bem como um sistema conjunto de defesa aérea. Grande parte dos russos vê os bielorrussos (erroneamente, como a maioria dos bielorrussos apontaria) como seus parentes étnicos com uma mentalidade semelhante.
Se Lukashenko sucumbir a uma revolução popular, isso representará um duro golpe para o prestígio de Putin. A ideia de "poder do povo" lhe é estranha: ele está preocupado que seu próprio povo possa adotar a ideia de que é OK revoltar-se contra um regime autoritário, e que o Ocidente usaria o descontentamento para removê-lo.
O chefe do Kremlin também está preocupado que a classe política russa, até então servil, possa ver a queda de Lukashenko como um sinal de declínio político e de fraqueza, algo que ele abomina. Putin não pode permitir uma mudança de liderança em Belarus que ele não tenha sancionado.
Por enquanto, o Kremlin provavelmente se absterá de enviar tropas russas para fornecer "assistência fraterna" a Belarus, mas isso não pode ser completamente descartado. O risco de resistência civil e derramamento de sangue é alto demais.
Além disso, a ideia não é popular entre os russos, e o Kremlin está bem ciente disso. Mas há muitos outros instrumentos à disposição – guerra eletrônica e recursos de vigilância eletrônica, dinheiro e uma gigantesca máquina de propaganda – para serem colocados à disposição de Lukashenko. Moscou pode ajudar os serviços de segurança bielorrussos e chamar a cooperação de "missão consultiva".
Se Lukashenko sobreviver com a ajuda de Moscou, ele terá que pagar o preço e ceder às antigas exigências da Rússia: desde o reconhecimento da anexação da Crimeia até a concessão a Moscou do direito de construir bases militares em Belarus e a unificação das políticas fiscais com a Rússia.
Isso transformaria Belarus uma província russa de fato. No entanto, se Lukashenko for forçado a deixar o cargo, Putin provavelmente recorrerá a seu plano B: quando houver novas eleições presidenciais, o Kremlin escolherá e pressionará fortemente por um candidato pró-Rússia leniente, seja ele quem for.
O pior medo de Putin é a emergência de uma Belarus democrática, orientada para o Ocidente e amiga da União Europeia. Isso pode não parecer muito provável, mas ele não quer correr nenhum risco.
A grande aposta de Putin é que a UE e os Estados Unidos não ousarão desafiá-lo sobre o que ele considera seu terreno, e que, se ele aguentar o tempo suficiente, com ou sem Lukashenko, europeus e americanos acabarão se distraindo com outros problemas e deixarão Belarus para ele.
E essas esperanças não são completamente infundadas, com a continuação da pandemia do novo coronavírus, a aproximação das eleições presidenciais dos EUA e as constantes diferenças entre os membros orientais e ocidentais da União Europeia no tocante à política para a Rússia.
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