Turquia x EUA
12 de outubro de 2007A Turquia pode fazer o que quiser, mas ainda vai demorar muito até que ela seja encarada à mesma altura pelos demais países da comunidade ocidental. Há dois motivos principais para isso: primeiro, porque ela internamente ainda não adquiriu a maturidade necessária para ocupar-se de forma serena também com os capítulos sombrios da história do Império Otomano. Segundo, porque ela se presta muito bem a servir de joguete a populistas ocidentais.
Conseguem-se votos dos eleitores e se ganha simpatia quando a Turquia − por exemplo agora na Comissão de Exterior da Câmara norte-americana e como já aconteceu em vários parlamentos na Europa − é confrontada com o fato de que a perseguição e o banimento de armênios na Primeira Guerra Mundial são considerados genocídio.
A política errada em relação aos curdos, praticada já há várias décadas, e a brutalidade no confronto militar com o Partido Trabalhista do Curdistão (PKK), que há 23 anos luta por um Estado curdo autônomo, engrossam a lista das sérias acusações de violações aos direitos humanos, opressão e ignorância em relação a direitos democráticos elementares.
O fato de a Comissão da Câmara dos EUA ter aceito a resolução sobre o genocídio é um sinal de que cresceram as chances de que ela seja aprovada. Em um ano, será eleito um novo presidente nos Estados Unidos e os democratas querem derrubar George W. Bush. E aí apostam justamente nos votos do forte lobby armênio e sua grande influência.
Foram em vão todas as advertências de Bush e de sua secretária de Estado sobre o importante papel da Turquia como membro da Otan e na luta contra o terrorismo internacional, devido à sua vizinhança direta com o Irã, Iraque e Síria.
Estimulada pelos fatos em Washington, também na Europa a diáspora armênia sinaliza querer incluir o reconhecimento do genocídio na lista das condições para continuar negociando o ingresso da Turquia na União Européia.
Como pode-se evitar agora que a Turquia, argumentando autodefesa, se decida por uma grande ofensiva contra bases do PKK na região curda do norte do Iraque? Isto desestabilizaria a única região do Iraque que no momento ainda tem certa segurança.
Mas, pior do que isso, é a ameaça de um confronto direto dos militares da Turquia com curdos iraquianos do Iraque, que são treinados e armados pelos EUA. O que aconteceria se um grupo de manifestantes aproveitasse um eventual protesto contra o Ocidente para semear conflitos?
Como se pode evitar uma redução do já pequeno número de defensores do reconhecimento do Chipre no âmbito de uma união alfandegária?
Como evitar, entre a opinião pública turca, o crescimento da simpatia pelo Irã e pelos islâmicos, já que ambos atacam os Estados Unidos e o Ocidente?
Não poderia ter sido mais inoportuno este momento de agravamento das relações da Turquia com o Ocidente a partir dos EUA. Mais tarde, quando o conflito no Iraque estivesse encerrado e o Oriente Médio navegasse em certa estabilidade, poderia ser preparado terreno para confrontar a Turquia com os capítulos sombrios do Império Otomano.
O fundador da república turca e presidente Mustafa Kemal Atatürk, que no âmbito de suas reformas comprometeu seu país a orientar-se pelos valores ocidentais, embora difamado por obstinados nacionalistas kemalistas e amaldiçoado por islâmicos fanáticos, não fez nenhuma viagem internacional durante os 15 anos de seu mandato.
Apesar disso, ele conseguiu selar a paz com todos os antigos inimigos, como a Grécia, o Reino Unido, a França e a Rússia – porque os chefes de Estado europeus reconheceram a importância da Turquia, por estar cercada por áreas em conflito, e por isso o visitaram em solo turco.
As resoluções sobre o genocídio podem ser justas, mas são inapropriadas para serem usadas no discurso em favor da Turquia como um elemento importante na política internacional de paz. (rw)
Baha Güngör é chefe da redação turca da DW-RADIO.