A invasão do Capitólio, em Washington, há exatamente um ano, não deveria ter sido uma surpresa.
Mesmo antes de os locais de votação na disputa presidencial terem sido abertos, o então presidente Donald Trump já havia anunciado que, se perdesse a corrida à Casa Branca, só poderia haver uma razão: fraude eleitoral. Ele e milhares de apoiadores não aceitariam uma derrota.
À beira de um golpe
Trump perdeu. E seus apoiadores radicais invadiram o Capitólio no dia em que o Congresso deveria confirmar formalmente a eleição do vencedor, o democrata Joe Biden. As imagens abalaram o mundo já na época. Mas somente há algumas semanas sabe-se quão perto os EUA estiveram de um verdadeiro golpe de Estado.
Foi somente graças à capacidade de reação de alguns poucos funcionários que um banho de sangue no prédio do Parlamento foi evitado. Poderíamos até mesmo ter visto a morte de um vice-presidente, assassinado por se ater às regras democráticas, e não às ordens do presidente. Foi por muito pouco.
O que deveria ter sido um sinal de alerta para todas as forças democráticas, independentemente da filiação partidária, tornou-se apenas mais uma peça no destrutivo espetáculo político americano. Até hoje, os republicanos tentam impedir que os acontecimentos daquele dia sejam esclarecidos.
Em vez de bom senso e de um retorno a uma disputa política pelo argumento mais convincente, na qual fatos e o respeito por uma opinião diferente desempenham um papel, a guerra de trincheiras se aprofundou.
Democratas divididos
Desde o primeiro dia da era Biden, os republicanos se preparam para a próxima campanha eleitoral pela presidência. Enquanto os democratas no poder se perdem nas brigas entre suas várias alas, até mesmo a mortal crise do coronavírus é explorada politicamente. Os republicanos bloqueiam importantes ajudas financeiras federais para que o governo Biden não marque nenhum ponto para a próxima campanha eleitoral.
O mais perigoso, no entanto, é a mudança dos distritos eleitorais, o que restringe os direitos democráticos fundamentais de negros e outras minorias. A isso se somam diferentes requisitos que, em última análise, têm todos a mesma finalidade: impedir que potenciais eleitoras e eleitores democratas possam votar.
Pilares ameaçados
Os Estados Unidos tinham, justificadamente, orgulho das conquistas do movimento de direitos civis. Por mais imperfeito que o país continue a ser, os pilares básicos de uma democracia pareciam estar seguros com o direito de voto para todos os cidadãos.
Mas esse não é mais o caso. É preciso se preparar para o pior em um país onde, graças às redes sociais, que mudaram as regras do jogo, é mais fácil para teóricos da conspiração racistas do que para o presidente em exercício dominar o clima político. Pelo menos por ora, ninguém parece ter uma resposta sobre como deter populistas dispostos a derrubar o sistema para garantir poder duradouro para si.
--
Ines Pohl é chefe da sucursal da DW em Washington. O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente da DW.