Na conferência de cúpula extraordinária da União Europeia (UE) da última segunda-feira, discutiu-se por horas, por causa do veto alemão, se a formulação final incluiria ou não o fechamento completo da rota dos Bálcãs. A chanceler federal Angela Merkel conseguiu impor que a formulação fosse um pouco abrandada, pois ela continua fantasiando uma solução comum europeia para a crise migratória.
Apenas 24 horas depois, dois Estados-membros da UE, a Eslovênia e a Croácia, simplesmente fecharam suas fronteiras, de forma total e oficial, com nada de ação conjunta. Tudo indica que a chefe de governo da Alemanha perdeu definitivamente o que ainda tinha de autoridade na Europa. Esta ainda é a sua Europa, Sra. Merkel?
Agora as palavras de ordem são isolar e deportar, nos termos do acordo que se anuncia entre a UE e a Turquia, e como ficou claro nesta quarta-feira (09/03) no Parlamento Europeu. Tanto a Comissão Europeia como o Conselho Europeu – ou seja, a representação dos chefes de Estado e governo do bloco – só enviaram seu segundo escalão. Sem convicção, os vices recitaram frases feitas. A transferência do problema dos refugiados para a Turquia e os retoques finais na "fortaleza Europa" foram vendidos como "solução europeia".
Isso é triste. Sim, é desumano, pois as pessoas que já estão retidas na Grécia, diante das portas fechadas da Europa, sequer foram mencionadas nas declarações oficiais.
A chefe da bancada dos partidos de esquerda no Parlamento Europeu, Gabi Zimmer, foi a única a mencionar o nome da cidade grega de Idomeni, na fronteira com a Macedônia, símbolo da miséria dos refugiados, e a denunciar o repugnante comércio com as vidas dos refugiados e as deportações em massa que estão em via de ser negociadas entre Bruxelas e Ancara.
A Grécia não é capaz ou não está em condições de se ocupar dessa tragédia humana aguda em suas fronteiras. As verbas prometidas pela UE só começam a fluir dentro de alguns meses, pois primeiro é preciso uma emenda das leis orçamentárias. A Comissão Europeia não está colocando em marcha uma ajuda emergencial de verdade para os migrantes detidos na Grécia, embora os acordos da UE permitam que o fizesse já. Por quê?
Em sua declaração no Parlamento em Estrasburgo, o alto comissário das Nações Unidas para os refugiados, Filippo Grandi, acusou a União Europeia de infração planejada das leis e de estar na trilha da desumanidade. Consciente e intencionalmente, a UE e seus candidatos à filiação nos Bálcãs vão montando uma catástrofe para os seres humanos na fronteira greco-macedônia. O que ainda precisa acontecer para que algo parecido com consciência se manifeste entre os chefes de Estado e governo responsáveis?
As circunstâncias na Grécia já são muito piores, agora, do que na Hungria em setembro de 2015. Na época, os chanceleres federais da Alemanha e da Áustria – também numa iniciativa isolada, é preciso reconhecer – mostraram senso de humanidade, deixando que os refugiados ingressassem em seus países.
Hoje não há nem sinal disso. Pelo contrário: as atrozes imagens das famílias em meio à lama em Idomeni são até desejadas para desencorajar novos migrantes, requerentes de asilo ou refugiados.
Três meses após iniciar-se o fechamento da fronteira, as Forças Armadas gregas ainda não estão em condições de distribuir pão e água? Diante de tal cinismo, a eurodeputada verde Ska Keller formulou aos chefes de Estado e governo a única pergunta pertinente: "Vocês ainda conseguem mesmo dormir em paz à noite?"
No momento é incerto se vai funcionar o vacilante plano de, em conjunto com a Turquia, reduzir a zero a migração descontrolada para a UE. Para alguns Estados, as exigências de Ancara são excessivas. Outros são, por princípio, contrários à necessária redistribuição dos refugiados entre os diversos países da UE.
O que quer que se barganhe na cúpula da UE do fim da próxima semana, as resoluções de nada servirão às pessoas em Idomeni que, com seus cartazes de papelão, apelam a "Mama Merkel". Elas são reféns de uma União Europeia desunida, prestes a colocar nas mãos do autoritário governo turco o direito de asilo na Europa. E o número dessas pessoas aumenta a cada dia.
Mesmo que essa estratégia de isolamento dê certo, para quem tenha um mínimo de senso está claro que os refugiados procurarão novos caminhos. Não mais atravessando o Mar Egeu, mas pela Bulgária ou Albânia, Lampedusa ou Malta. Os valores humanitários e cristãos, que os políticos da UE tanto gostam de enfatizar em seus sermões de domingo, perdem-se totalmente nos dias atuais de debate sobre como rechaçar os refugiados. A Europa mostra o seu coração frio.