O contraste não podia ser maior: na Arábia Saudita, Donald Trump dança a dança da espada – um ritual de guerra, como o rei Salman explicou ao presidente americano. No Irã, por outro lado, a população dança animada nas ruas, festejando a significativa vitória do reformista moderado Hassan Rohani nas eleições presidenciais, assim como a derrota do linha-dura Ebrahim Raisi.
Mas, apesar – ou por causa – da dança bélica, alegria e júbilo imperam também na monarquia petroleira. Pois, com seu discurso do fim de semana, Trump inaugurou uma guinada na política americana relativa ao mundo árabe em geral e, em particular, à Arábia Saudita.
Não só ficou definitivamente enterrada a postura crítica do governo Barack Obama diante de Riad: ao mesmo tempo, o oponente geoestratégico Irã foi declarado vilão-mor da região, o qual cabe isolar – como na era Bush. Caso esse isolamento não baste, Trump trouxe, para seus anfitriões, armamentos no valor de 110 bilhões de dólares na bagagem – um negócio de proporções históricas.
É uma amarga ironia: justo na pátria dos autores dos atentados de 11 de setembro de 2001, Trump ameaça exclusivamente o Irã como apoiador do terrorismo. Sem menção permanece o fato de que seus anfitriões no Golfo Pérsico apoiaram maciçamente, com dinheiro e armas, o "Estado Islâmico" (EI) e outros jihadistas – como o próprio ex-vice-presidente Joe Biden declarou abertamente a estudantes da Universidade de Harvard, no segundo semestre de 2014.
Em seu discurso, Trump falou de uma "visão de paz, segurança e prosperidade na região". Se ele tivesse essa visão, seu pronunciamento teria transcorrido diferente. Mas diante da concorrência geoestratégica entre o Irã e a Arábia Saudita, não se escutou qualquer palavra de moderação, de conciliação: em vez disso, o chefe de Estado republicano aposta na confrontação.
Embora tenha dedicado quase um terço de seu discurso ao Irã, o decisivo pleito no país não foi mencionado com uma só palavra. Claro que Rohani também é um homem do sistema. Contudo, apesar de todos os pontos fracos seus e do sistema, em termos realistas ele é a maior esperança para o país de abertura, de mais direitos civis. Ele precisa de respaldo em seus esforços para conter os linhas-duras do aparato de segurança.
Em vez disso, o presidente dos Estados Unidos alimentou ainda mais o exagerado temor dos saudistas da influência iraniana na região. Ele legitimizou explicitamente o sangrento conflito dos Estados do Golfo no Iêmen como parte da "guerra contra o terror".
Se Trump fosse sincero em seu desejo de que "meninos e meninas muçulmanos possam crescer sem medo, protegidos da violência e do ódio", então deveria ter aproveitado a ocasião para deter os seus anfitriões.
Agora é a vez dos europeus: eles precisam se negar a participar da dança da espada. Apesar da conclamação ao isolamento, eles devem deixar abertos e ampliar os canais comunicativos e econômicos com Teerã. E deveriam tentam iniciar um diálogo regional para criação de uma nova arquitetura de segurança que faça jus aos interesses de todos os Estados da região.
Também no Oriente Médio, segurança é mais do que um jogo de soma zero, em que o ganho de um equivale à perda do outro. O fato de, já na manhã de sábado, a chefe da diplomacia da União Europeia, Federica Mogherini, ter sido uma das primeiras a parabenizar Rohani pela reeleição, já é um bom começo.