Opinião: A morte de Cecil serviu para alguma coisa?
O leão Cecil está morto. Quando ouvi a notícia, nesta terça-feira (28/07), pensei: outro animal belo e raro, morto sem razão.
Primeiro saíram algumas notícias sobre o tema. De repente, as comportas se abriram. O assunto foi se tornando viral: primeiro no Twitter e no Facebook, depois em outras mídias. A história estava em todos os lugares – e todo mundo parecia ter uma opinião sobre ela.
Então, pensei: ué, de repente todo mundo se interessa por leões? Na semana passada, a notícia de que dez leões morreram durante as enchentes na Índia não virou manchete. Considerando que restam apenas 500 leões asiáticos no mundo, isso é algo importante.
Mas a história de Cecil, claro, é muito mais palatável que um caso climático abstrato e mortal que pode ou não ter a ver com as mudanças climáticas.
Cecil, logo se soube, era uma espécie de celebridade da vida selvagem. Ele exibiu com orgulho sua juba para visitantes e pesquisadores do Parque Nacional Hwange, no Zimbábue, ao longo de 13 anos.
O resto da história foi aparecendo aos poucos. Primeiro, ele sumiu. Depois, o seu corpo esfolado e decapitado foi recuperado – do lado de fora do parque.
Mas o mundo inteiro parece ter sentado e prestado atenção ao que estava acontecendo quando foi revelado que um dentista de Minnesota pagou 55 mil dólares para caçar e matar Cecil como um troféu.
Foi noticiado que, com a ajuda de dois guias locais, o americano atraiu Cecil para fora do parque – dentro seria ilegal matá-lo – para primeiro ferir o leão com um arco e flecha e, quase dois dias depois, dar cabo dele com uma arma.
Uma morte horrível, em circunstâncias suspeitas, corrupção e húbris – o caso tem os elementos de um assassinato misterioso e intrigante. Mas, ao que parece, a virada provocada pelo fato de haver dinheiro envolvido, junto com uma aparente luta de poder entre o norte e o sul, é que fez a história "bombar".
No entanto, assim como outras notícias virais, essa vai gradualmente cair no esquecimento. A caça, porém, não vai desaparecer. Na verdade, a caça ilegal em escala global está crescendo, colocando em risco espécies inteiras. Como alguns já disseram: a extinção é para sempre.
O fato é que a caça, ilegal ou não, é um grande negócio. A caça permitida é um negócio multimilionário, que opera numa zona intermediária entre a lei e o contrabando. A caça ilegal, apesar de muitas vezes associada à pobreza, é comumente perpetrada por redes criminosas amplas e muito bem organizadas.
A caça ilegal atende à demanda por animais ou parte de animais, muitas vezes em regiões do mundo muito distantes dos últimos restos de habitat selvagem onde esses animais vivem.
O resultado de ambas, porém, é o mesmo: a morte de inúmeras criaturas selvagens – grandes e pequenas – para o entretenimento humano ou para alguns supostos benefícios. A morte de Cecil colocou nos holofotes como isso pode ser repugnante.
Mas vai fazer alguma diferença?
A caça ilegal é alimentada pela demanda, e esse comércio ilegal continuará até que as pessoas que querem fazer coisas como usar os chifres de rinocerontes para ter uma ereção finalmente concluam que isso é inútil.
Além de educação, a legislação pode ser uma ferramenta efetiva contra a caça ilegal – se ela for reforçada. Infelizmente – e esse costuma ser o caso com crimes ambientais – falta vontade política para aprovar e implementar leis contra a caça ilegal.
A morte de Cecil pode dar um empurrão para a aprovação dessas leis. O conhecimento público sobre o problema da caça ilegal, além de ter um efeito educacional, é um importante elemento na criação de pressão pública, que pode resultar em vontade política.
Por esse aspecto, o fato de isso ter acontecido e ter despertado tanta atenção é uma coisa boa. Na morte, Cecil pode manter seu status de celebridade, agora como um mártir contra a caça.
Mas, se continuarmos sendo um bando de hipócritas que só se importam com leões quando um dentista rico mata um animal famoso para pendurá-lo na parede, a morte de Cecil terá sido em vão.