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Opinião: Angola precisa de democracia além do dia da eleição

Johannes Beck
25 de agosto de 2017

Há tempos a oportunidade para um recomeço não era tão grande, mas nada indica que essa eleição fará de Angola uma democracia verdadeira, afirma o chefe da redação Português para a África, Johannes Beck.

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Eleitor vota em Angola
Foto: Reuters/S. Sibeko

Já no decorrer da eleição, vários membros do MPLA, partido no poder desde a independência de Angola, em 1975, elogiaram a organização do escrutínio. A Comissão Nacional de Eleições (CNE) reconheceu "pequenas irregularidades", mas fez um balanço positivo da organização do sufrágio.

É verdade que este pleito foi muito melhor em termos de organização do que o anterior, de 2012. Também não houve cenas de violência, como no Quênia. Mas grandes elogios não são justificados.

Johannes Beck
Johannes Beck é chefe da redação Português para a África

A CNE emitiu poucas credenciais aos delegados dos partidos da oposição, que não tiveram como controlar de forma efetiva a eleição num país tão vasto como Angola. Resultado da falta de transparência: a CNE vai ter que conviver com as acusações de manipulação por parte da oposição.

As autoridades angolanas também atrasaram sistematicamente o credenciamento de observadores europeus e norte-americanos até que estes desistiram ou chegaram apenas com minidelegações, incapazes de realmente monitorar o processo.

A predominância, ou melhor, a onipresença do MPLA nos meios de comunicação deixou pouco espaço para os partidos de oposição. Unita, Casa-CE, PRS e os outros não competiram em pé de igualdade com o partido no poder.

Em tempos modernos, o tempo na televisão e no rádio é um fator determinante para o resultado de uma eleição.

Nos últimos anos, a experiência de muitos angolanos foi:

– Quem exerce o seu direito à manifestação, consagrado no artigo 47 da Constituição, arrisca-se a ser espancado pela polícia.

– Quem milita em partidos da oposição anula as suas chances de carreira na administração pública ou nas muitas empresas privadas controladas por membros do MPLA ou pela família do presidente José Eduardo dos Santos.

– Mesmo quem apenas participar de uma discussão com amigos sobre um livro de métodos de resistência pacífica pode acabar preso nas cadeias angolanas, como mostrou o caso dos ativistas "15+2".

Quem olhar apenas para a Constituição pode até pensar que Angola é uma democracia exemplar, mas a realidade não tem muito que ver com o que está no papel. O MPLA criou um clima de medo e de repressão no qual uma democracia não pode crescer nem florescer.

E há tempos a oportunidade para um recomeço democrático não era tão grande. Afinal, depois de quase 38 anos no poder, José Eduardo dos Santos optou por não se recandidatar. Mas Santos permanece na liderança do MPLA. Só por causa disso, seu sucessor, João Lourenço, não se atreverá a tocar fundamentalmente nos interesses multibilionários da família Santos.

Talvez faça algumas correções cosméticas, como a destituição de Isabel dos Santos da presidência do conselho de administração da Sonangol, petrolífera estatal e maior empresa de Angola. Na altura, em 2016, a nomeação da filha do presidente tinha gerado fortes críticas mesmo dentro do MPLA. Com um novo administrador da Sonangol, Lourenço poderia abafar essas críticas.

Mas não acredito que haja mudanças maiores para democratizar o país, como o fim das repressões a ativistas cívicos e manifestações, a liberalização de meios de comunicação para que realmente haja pluralidade e a eleição direta dos governos provinciais e municipais.

Como ex-secretário-geral do MPLA e ministro da Defesa, Lourenço é um candidato do regime. Também não teceu um discurso reformista durante a sua campanha eleitoral.

São necessárias mudanças fundamentais para que realmente haja democracia em Angola.

Uma democracia real não se constrói apenas no dia de votação. Uma democracia verdadeira precisa de abertura, tolerância e de Estado de Direito – dia após dia!