Opinião: Ao escolher Pequim, COI contraria as próprias metas
31 de julho de 2015Não havia um candidato ideal para sediar os Jogos Olímpicos de Inverno – isso já estava claro antes da escolha, em Kuala Lumpur. Tanto no Cazaquistão, que concorreu com Almaty, como na China, que, depois dos Jogos de verão de 2008, queria levar para Pequim também os de inverno, a situação dos direitos humanos deixa a desejar.
Democracia, liberdade de imprensa e liberdade de opinião para valer não há nesses países, mas, com seus sistemas autocráticos, eles oferecem a possibilidade de que tanto os jogos como os preparativos transcorram sem atritos.
A escolha recaiu sobre Pequim, o que foi "espontaneamente" celebrado com uma festa, encenada na melhor tradição comunista, diante do Ninho de Pássaro, o Estádio Olímpico de 2008.
A decisão dos membros do Comitê Olímpico Internacional (COI), a favor de Pequim e contra Almaty, não é uma surpresa, ainda que o resultado de 44 a 40 tenha sido mais apertado do que o esperado. Tudo indicava que a capital chinesa seria a vencedora.
Mas é difícil entender como essa escolha, depois dos caros Jogos de Sochi em 2014, possa significar uma melhora ou uma mudança coerente com a Agenda 2020 do COI.
Os Jogos de Inverno de Sochi, que o presidente Vladimir Putin tentou usar para polir sua imagem, teriam engolido cerca de 50 bilhões de euros. Uma reserva natural foi destruída para a construção das instalações esportivas e da infraestrutura. Graves danos ambientais foram o resultado, e as instalações e hotéis quase não são usados.
A Agenda 2020, iniciada pelo presidente do COI, Thomas Bach, e aprovada por ampla maioria em dezembro de 2014, defende menos gigantismo e mais sustentabilidade e consideração por aspectos regionais. A proteção ambiental também deve estar no topo das prioridades.
A escolha de Pequim para sediar os Jogos de Inverno coloca essas exigências bem para baixo. Nunca neva em Pequim, e por isso a cidade não tem tradição em esportes de inverno nem instalações esportivas apropriadas. Fora os ginásios para as competições no gelo, que deverão acontecer nas instalações construídas para os Jogos de 2008, tudo terá que ser construído para as demais modalidades.
As competições de esqui alpino serão disputadas em Yanqing, uma região montanhosa distante cerca de 90 quilômetros de Pequim e que necessita de uma ampla reconstrução para a prática de esportes olímpicos de inverno. Exatamente apropriada ela não é, pois as diferenças de altura das largadas mal atendem às exigências mínimas da Federação Internacional de Esqui (FIS).
Já os atletas do salto de esqui, biatlo e esqui de fundo vão ficar ainda mais longe – para ser exato, a 190 quilômetros de distância, na região de Zhangjiakou. Lá, assim como em Yanqing, quase nunca neva o suficiente para a realização de competições de esportes de inverno. Os principais fabricantes mundiais de canhões de neve já podem, portanto, se alegrar com a alta demanda que deverá vir da China nos próximos anos.
Almaty, ao contrário, é uma cidade de esportes de inverno. As instalações para a maioria das competições já existem e distam não mais de 40 quilômetros umas das outras.
Oficialmente, os chineses planejam separar um orçamento de 3,08 bilhões de euros, relativamente modesto. Só que a ampliação das conexões com trens de alta velocidade entre Pequim e as áreas de esqui para as competições alpinas e nórdicas deverá engolir bilhões, e também a construção dos locais para a prática dos esportes deverá custar algo.
Por isso pode-se seguramente partir do princípio de que esse orçamento vai explodir, assim como os dois vilarejos que terão que desaparecer para dar lugar a novas pistas. Não é à toa, portanto, que cidades como Saint Moritz, Oslo, Estocolmo e Munique desistiram de suas candidaturas.
Jogos de baixo custo, que privilegiem a sustentabilidade, o meio ambiente e as distâncias curtas, poderiam fazer esses potenciais candidatos mudar de ideia e voltar a se candidatar no futuro. Mas, ao optar por Pequim, o COI deixou escapar essa oportunidade.