Desta vez, os pseudossocialistas em Caracas foram longe demais. Foi absolutamente transparente a tentativa de impedir a reeleição de Juan Guaidó como presidente da Assembleia Nacional, bloqueando simplesmente a entrada de parlamentares da oposição, que detém a maioria no Parlamento venezuelano. Muito claro também ficou o total desprezo dos chavistas pela democracia e sua instituição mais importante: o Parlamento livremente eleito.
Também não é novidade que o regime venezuelano espezinha os direitos humanos, desrespeita consequentemente os princípios do Estado de Direito e mina a separação de poderes. E desta vez, provavelmente, o chefe de Estado Nicolás Maduro também sairá ileso, seu poder ainda parece estável no aparato estatal. Mas ele está enfraquecido internacionalmente e acabou fortalecendo seu adversário mais perigoso até agora.
Há quase um ano, o jovem e então desconhecido deputado Juan Guiadó se autoproclamou presidente interino da Venezuela, conseguindo sua legitimidade por meio de sua primeira eleição como presidente da Assembleia Nacional.
Vale lembrar: com sua esmagadora maioria oposicionista, a representação popular é a única instituição ainda legitimamente democrática na Venezuela, depois que os chavistas colocaram o Supremo Tribunal e a autoridade eleitoral sob seu controle, instalando posteriormente um "parlamento" alternativo e confirmando Maduro como presidente num pleito altamente controverso.
Dependendo da forma de interpretação, a Venezuela não possui mais um chefe de Estado legítimo e, neste caso, a Constituição estabelece que o presidente do Parlamento assuma o poder e restaure a ordem constitucional. Guaidó aproveitou a chance – e fracassou. Sua reeleição como presidente da Assembleia Nacional neste domingo (05/01) poderia não ter dado certo ou ter sido bastante apertada; aparentemente, a conspiração chavista uniu novamente a oposição.
A julgar por suas promessas, o líder da oposição até agora não conseguiu nada. Guaidó assumiu o poder para realizar novas eleições – teoricamente, elas deveriam ter sido convocadas dentro de 30 dias – e restaurar a separação de poderes na Venezuela. Mas embora quase 60 países, incluindo a Alemanha, tenham reconhecido Guaidó sem restrições mesmo após esse prazo, o mantra do "fim da usurpação" não se concretizou.
Os militares continuam a apoiar Maduro, e a confirmação, por meio de relatório da ONU, de quase 7 mil execuções extrajudiciais e outras violações maciças dos direitos humanos não mudaram nada no fato de o chefe de Estado estar seguro em seu cargo.
Recentemente, Maduro conseguiu até mesmo acalmar a desesperada situação econômica do país – não apenas com ajuda russa e chinesa, mas também permitindo negócios com o dinheiro dos odiados americanos e, assim, por fim, explorando o êxodo em massa também a seu favor. Com suas remessas, os refugiados venezuelanos estão agora contribuindo oficialmente para que alguns bens de consumo possam voltar a ser vendidos neste pobre país petrolífero.
Milhares de venezuelanos continuam a deixar o país todos os dias; as Nações Unidas estimam que seis milhões deverão ter fugido até o final do ano, o que levaria Maduro a ter expulsado um quinto da população durante seu mandato. A grande esperança, que Guiadó despertou no início do ano passado, parece ter entrado em colapso. Quando, nas últimas semanas, a oposição tentou organizar novamente protestos maiores na Venezuela, sob a influência das manifestações em massa no Chile e na Colômbia, a resposta foi tímida.
No entanto, o plano dos chavistas de finalmente tirar Guiadó do páreo fracassou. Ele foi reeleito presidente do Parlamento, numa sessão organizada apressadamente em outro lugar e com mais apoio do que o esperado.
Internacionalmente, a condenação da encenação chavista foi bastante unânime. Quando se trata de defender o Parlamento, as democracias do mundo estão unidas. Até a Argentina e o México, os dois pesos-pesados populistas de esquerda da América Latina que não reconhecem Guaidó, condenaram o bloqueio da Assembleia Nacional.
Trata-se de uma derrota sensível para Maduro, e, principalmente, uma derrota completamente desnecessária. Isso poderá enfraquecê-lo em suas próprias fileiras. E talvez os venezuelanos ganhem coragem novamente. Eles precisarão dela, porque somente eles poderão mudar seu país.
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