Fim da era Kirchner se anuncia
29 de outubro de 2013O "modelo Kirchner", uma mistura de controle estatal interno maciço e isolamento externo, já é obsoleto. Dois terços dos argentinos sinalizaram isso com o seu voto, neste fim de semana. Somente os próprios interessados – a presidente Cristina Fernández de Kirchner e sua coalizão de governo da Frente para a Vitória (FPV) – ainda não querem perceber.
Senão, como explicar que, após a avassaladora derrota, altos funcionários da FPV se vangloriaram de ser a principal força política do país, deduzindo a partir daí que deveriam dar prosseguimento ao "modelo". Essa forma da perda de realidade faz lembrar a teimosia dos funcionários do governo da antiga era soviética.
Resultado de uma política arrogante
O bom desempenho do peronista de direita Sergio Massa na importante província de Buenos Aires, e do prefeito conservador da capital, Mauricio Macri, não significam, de forma alguma, que a Argentina tomou o caminho da direita.
Nas cinco províncias em que o governo perdeu a eleição, ele foi superado por todo o rol de forças políticas nacionais, abrangendo até mesmo aquelas bem à esquerda. Não foram somente eleições com vista a um recomeço, foi também um voto contra uma década sob o regime de um clã e seus seguidores devotos.
Com sorte e também com habilidade, há dez anos Néstor Kirchner, esposo e antecessor da atual presidente, conseguiu tirar a Argentina da falência. No entanto, o mais tardar desde a ascensão de sua esposa, Cristina, ficou cada vez mais claro o que está por trás do chamado "kirchnerismo": a mera manutenção e ampliação do próprio poder – disfarçada como política abertamente esquerdista, voltada também à inclusão dos desfavorecidos da população. Na realidade, o nome "Kirchner" designa uma política arrogante, dogmática e agressiva, cujo pensamento "em preto-e-branco" dividiu profundamente o país e o isolou bastante do exterior.
Programas bilionários de bem-estar social para os pobres não alcançaram nada mais do que melhorias de curto prazo. A longo prazo, a pobreza na Argentina piorou. Em vez de demonstrar um intento construtivo, tem características de vingança a perseguição dos supostamente ricos com novas restrições, proibições e regulamentos, prejudicando enormemente as médias empresas.
O fato de este país imenso e rico ter de pagar pelos caprichos políticos de seus líderes, conta entre os momentos trágicos em sua história. A política energética do governo Kirchner, nacionalista e totalmente equivocada, fez com que a Argentina rica em petróleo tivesse de importar a matéria-prima a preços altos. E, em contrapartida, o país não dispõe da tecnologia para explorar suas próprias fontes de petróleo.
A responsabilidade do vencedor
A lista das falhas kirchnerianas é longa: ela vai da má gestão, da infraestrutura miserável e inflação, passando pela corrupção e indo até um cinismo indiferente frente à crescente criminalidade. Agora, o governo está pagando a conta. Mas a derrota da situação não é por si só uma solução.
A responsabilidade que cai sobre os vencedores da eleição Massa e Macri é enorme. Eles ainda não precisam se preocupar muito com o próximo passo: o governo está muito de distante de uma maioria de dois terços que possibilite uma mudança constitucional. Assim, está descartada uma eventual reeleição de Cristina Kirchner.
Massa e Macri anunciaram – um com uma mensagem clara, o outro com insinuações enigmáticas – suas candidaturas para as eleições presidenciais de 2015. De acordo com as pesquisas de opinião, quase metade dos argentinos não quer como chefe de Estado nenhum peronista e tampouco um kirchnerista.
A classe média não peronista nascente quer menos intervenção estatal. E ela também não quer políticos que abusem do Estado como se ele fosse uma loja self-service. Isso deve ser levado a sério pelos candidatos. De outra forma, a era deles pode chegar ao fim antes mesmo de ter começado.