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Opinião: Vitória da democracia na Coreia do Sul

Fabian Kretschmer
10 de março de 2017

Park Geun-hye concorreu com a promessa de pôr um fim às estreitas ligações entre as grandes corporações e o governo. Ficou provado que ela era parte do sistema corrupto, afirma o correspondente Fabian Kretschmer.

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Fabian Kretschmer trabalha como correspondente independente em Seul

Mais uma vez, as fissuras profundas da sociedade sul-coreana vieram à tona: quando os juízes do Tribunal Constitucional proferiram o seu veredicto sobre o impeachment da presidente Park Geun-hye, centenas de apoiadores dela choraram de tristeza no centro de Seul. A poucos metros de distância, do outro lado das barricadas policiais, manifestantes choravam de alegria. Ideologicamente, não há qualquer ligação entre os dois lados.

Mesmo assim, algo foi diferente desta vez: embora a divisão social da Coreia do Sul se estenda ao longo das duas alas políticas, nas últimas semanas muitos conservadores apoiaram a reivindicação de ativistas de esquerda. Também eles queriam tirar do cargo a chefe de Estado em que votaram há quatro anos com toda euforia. A decepção que Park Geun-hye causou em suas próprias fileiras políticas foi grande demais.

Em 2013, ela concorreu com a promessa de pôr um fim às estreitas ligações entre as grandes corporações e o governo. Mas ficou provado já há muito tempo que a política de 45 anos não só fracassou completamente em seus esforços de reforma como também era parte do sistema corrupto. Park Geun-hye não só extorquiu quantias milionárias de empresas como Lotte, Samsung etc em prol de dúbias fundações esportivas, como também cortou sistematicamente as subvenções para artistas indesejáveis e silenciou jornalistas críticos com processos de difamação.

Mesmo assim, um último grupo populacional continuou a apoiar a sua presidente, reverenciando-a como um ícone apesar de novos escândalos serem divulgados semanalmente: os idosos. Muitas das pessoas acima de 70 anos vivenciaram na própria pele a pobreza amarga do pós-Guerra. Com trabalho duro e lealdade coletiva à sua terra natal, elas lançaram as bases para o rápido crescimento econômico da Coreia do Sul. Sob o ditador militar Park Chung-hee, pai de Park Geun-hye, o país se ergueu das ruínas da Guerra da Coreia.

Hoje, boa parte dos idosos olha com nostalgia para um país rico, mas que no qual parece não ter mais espaço, como pessoas deixadas para trás. Entre os países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), a Coreia do Sul é o que apresenta o maior índice de pobreza entre a população de idade avançada, enquanto os laços familiares confucianos erodiram em grande parte na sociedade turbo-capitalista. Muitos idosos vivem solitários e carentes em favelas nas encostas da capital.

Mas a frustração dos idosos também é uma consequência de décadas de lavagem cerebral ideológica sob ditadores militares da Coreia do Sul. Até os anos 1980, a paranoia onipresente da Guerra Fria dominava a sociedade do país. Com a Coreia do Norte, o inimigo estava quase à porta. O regime em Pyongyang era responsabilizado por todos os males – também pela oposição política interna. Entre os apoiadores de Park, esse esquema de amigo-inimigo perdura até hoje. Quase de forma psicótica, eles suspeitam que, por trás de cada manifestação de esquerda, estejam agentes norte-coreanos ou comunistas ocultos.

No entanto, os protestos com velas, que acabaram levando ao impeachment da presidente, foram conduzidos pela juventude. Jovens que estão cansados de ver as elites corruptas, do setor econômico e da política, aparentemente acima da lei, enquanto eles têm que lidar com precárias relações trabalhistas e expedientes intermináveis de escritório. "Hell Chosun" é como eles chamam a sua pátria, em alusão à sociedade feudal coreana do século 19. Eles perderam a fé de que o trabalho duro e a educação seriam suficientes para a ascensão social. Para eles, o impeachment de Park Geun-hye também simboliza uma gratificação.

As manifestações à luz de velas, que neste sábado (11/03) chegam à sua 20ª e última edição, também foram responsáveis pela politização de uma geração acusada de hedonismo e materialismo. Os estudantes secundários e universitários do país estiveram na fileira de frente dos protestos pacíficos. Eles aprenderam que a sua participação pode ter resultados – mesmo contra a pessoa mais importante do país.