Os italianos têm uma desconfiança profunda de seus políticos, que eles chama de "a casta". É raro um político italiano cumprir o que prometeu na campanha eleitoral. Uma vez no poder, o interesse próprio passa a ser prioridade, na maioria das vezes.
Em linhas gerais, essas são as regras imutáveis da política italiana. Agora, quem está no poder são populistas nacionalistas da extrema direita e de um movimento de viés esquerdista, e ambos prometem uma revolução histórica: se ocupar dos problemas dos cidadãos.
Então as regras imutáveis da política italiana não valem mais? Ou essa nova coalizão – que tem de autoconfiança o que lhe falta de experiência – vai logo esquecer as metas ambiciosas e em parte arriscadas de seu acordo de coalizão e, em vez disso, ocupar-se da manutenção do próprio poder?
Soa estranho, mas seria do interesse da Itália e da Europa que os velhos mecanismos voltassem a valer, e essa revolução nacionalista fracassasse.
É de se esperar que o desconhecido feito primeiro-ministro, um jurista do direito comercial, cuide para atenuar as ideias mais radicais dos populistas. Se o professor Giuseppe Conte não conseguir andar sobre a tênue linha do compromisso entre esses dois extremos, ele logo vai ser substituído.
Os líderes dos dois partidos, o antissistema Movimento Cinco Estrelas e o nacionalista Liga, prometeram coisas inacreditáveis a seus apoiadores: impostos baixos, auxílios sociais, idade baixa para aposentadoria, regras europeias mais favoráveis, menos burocracia e crescimento econômico – e isso, em parte, a crédito. Os machões Di Maio, do Cinco Estrelas, e Salvini, da Liga, tentarão transformar o premiê em marionete e usá-lo como cobertura em joguetes de poder populistas.
"A Itália em primeiro lugar" é o grito de batalha oco dos novos reis de Roma. Ele dá calafrios em qualquer europeu moderado. Se todo mundo passar a exigir isso, não vai sobrar muito da solidariedade entre os povos. "Ninguém precisa ter medo de nós", avisou Salvini. Precisa, sim, e pela União Europeia, pois os populistas podem abalar a zona do euro bem rapidamente com sua política fiscal irresponsável.
"A Itália não é a Grécia", dizem os novos parceiros em Roma. É verdade. A Itália, um país fundador da União Europeia, é bem maior do que a Grécia, mas também tem dívidas transbordantes. Tentar colocar os italianos dentro de um programa de resgate semelhante aos dos gregos seria quase impossível.
Na campanha eleitoral, os populistas fizeram do euro e dos "comissários do arrocho" alemães a origem de todos os males. Não dá para descartar que eles busquem uma crise financeira para se livrar do euro. Da noite para o dia, a Itália poderia introduzir uma moeda paralela e abandonar a zona do euro.
Os mercados financeiros preferem simplesmente ignorar os populistas. Por enquanto, o Banco Central Europeu mantém a Itália e outros Estados cambaleantes de pé com sua política de oferta excessiva de capital. Mas é questionável quanto tempo isso ainda vai durar. No mais tardar quando o Banco Central Europeu elevar os seus juros, a situação pode ficar incômoda para os italianos.
Na política migratória, a Liga pode torpedear todas as decisões da União Europeia. Com isso, um sistema sensato de distribuição de migrantes fica ainda mais distante. Além de fechar fronteiras e mandar embora estrangeiros, a Liga não tem muitas propostas. Como não ficar com medo diante disso? As promessas de Salvini soam ocas. A Itália vai mudar e tentar mudar a União Europeia. Até onde se pode fazer concessões aos novos radicais?
A União Europeia não deve de forma alguma reagir com nervosismo. Ataques alvoroçados, como o do ministro francês das Finanças no fim de semana, têm efeito contrário. Os italianos costumam reagir com irritação a críticas abertas de fora, e isso vale para todos, não apenas para os populistas. Também isso é uma lei não escrita da política italiana.
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