Opinião: Os dois palcos da coalizão de governo alemã
12 de setembro de 2016Soou como antes, como naqueles bons tempos em que os políticos alemães se dedicavam a coisas que realmente interessavam ao cotidiano daqueles que residem entre os Alpes e o Mar do Norte: liderada por Angela Merkel, a grande coalizão de governo em Berlim – formada pela CDU/CSU (União Democrata Cristã/União Social Cristã) e pelo Partido Social-Democrata (SPD) – anunciou, após seu "encontro de cúpula" neste domingo (11/09), querer pôr em prática até o fim do ano os seguintes temas: reforma do imposto sobre herança; aposentadorias mais elevadas e mais flexíveis; equiparação salarial entre homens e mulheres ou ao menos uma melhora nesse sentido; novo abono familiar.
E a grande coalizão já conseguiu implementar uma série de coisas, como o salário mínimo. Mas de que serve tudo isso se os três personagens principais – a chanceler federal, o presidente do SPD e o líder da CSU – parecem dar a impressão de trabalhar constantemente uns contra os outros naquele tema que se sobrepõe a tudo: a política para refugiados?
Neste domingo, o tema refugiados simplesmente não foi abordado. Isso é bom para a paz na coalizão de governo, mas não é uma notícia boa. Os eleitores, afinal, gostariam de saber como as coisas vão se encaminhar.
A situação é a seguinte: há um ano, Merkel falou que nós vamos conseguir tomar conta da situação e, desde então a CSU, na prática, deixou a coalizão. É claro que ainda existem ministros sociais-cristãos, como Alexander Dobrindt nos Transportes e Christian Schmidt na Agricultura, mas a CSU se tornou, na realidade, oposição. Desde então, a coalizão fez duas alterações na lei de asilo, endureceu a política de deportações e ganhou com o fechamento das rotas de fuga para a Europa, levada a cabo por outros países. E a chanceler arquitetou um acordo com a Turquia.
Ou seja, a grande coalizão de governo em Berlim agiu, mas não são os fatos que importam. A grande coalizão existe agora em dois palcos: em Berlim, onde se governa de forma razoável, e no debate público sobre os refugiados. Os fãs da chanceler federal dizem agora que ela não deve ceder de forma alguma. E muitos desses fãs nem mesmo pertencem à CDU. Nesse rol estão muitos social-democratas e muitos verdes, como também os milhares de voluntários que trabalham em prol dos refugiados. "Nós vamos conseguir" deve continuar a valer, dizem.
Os opositores de Merkel querem que ela admita ter cometido um erro. Desses, muitos estão na CDU. Já na CSU, o erro tem nome: ausência de um teto máximo para o número de refugiados. Quando esses "galos de briga" se encontram em programas de talk show na TV, ninguém pode imaginar que fazem parte do mesmo governo. E a CSU, legenda-irmã da CDU na Baviera, tem em mente, sobretudo, o seu próprio eleitorado.
Todos estão altamente nervosos, não por não ter se conseguido nada ou muito pouco, mas porque a política de refugiados – esse "nós vamos conseguir" – despertou um diabinho. Xenofobia e ressentimentos sempre houve na Alemana, mas agora eles residem num endereço bem mais palatável para os eleitores do que agrupamentos anteriores. E, por isso, os membros da coalizão olham uns para os outros e dizem: "A culpa é sua!"
Seehofer fomenta o debate público sobre se a CSU deve lançar uma candidatura própria à Chancelaria Federal, se ele vai participar do congresso anual da CDU ou se Merkel será convidada para o da CSU – ao que parece, não.
O presidente do SPD, Sigmar Gabriel, afirma que Merkel só falou que nós iríamos conseguir, mas não fez nada. Bem, o SPD fez parte do governo todo esse tempo.
E Merkel não diz mais nada – falar muito nunca foi mesmo do seu feitio.
Que tal se as partes envolvidas fizessem um resumo do que realizaram quanto ao tema dos refugiados no último ano? O que foi bom, o que talvez foi longe demais? Que tal se explicassem o que os une e, principalmente, no que a sua forma de fazer política difere da campanha de medo perpetrada pela legenda populista AfD (Alternativa para a Alemanha). Então alguns teriam de novo a sensação de que, apesar das brigas, governa-se conjuntamente.
Eu sei que isso não vai acontecer. Mas essa não seria – ao menos teoricamente – uma má ideia, certo?