Opinião: Por que Trump agrada a autocratas árabes
13 de novembro de 2016Em seu profundo ceticismo frente ao vencedor das eleições presidenciais americanas, muitos políticos europeus tomaram muito cuidado com o texto de suas mensagens de congratulações a Donald Trump. Mas não o presidente egípcio Abdel Fattah al-Sisi. Ele se apressou com tanta ambição e notável alegria, que a mídia estatal egípcia anunciou, pouco tempo depois, que Sisi foi o primeiro líder a parabenizar por telefone o futuro presidente americano pela vitória eleitoral.
Por que governantes árabes como Sisi apostam justamente num político como Trump, conhecido por suas declarações negativas sobre muçulmanos? Especialistas como Bachir Abdelfatah, do Centro Al-Ahram de Estudos Políticos e Estratégicos, no Cairo, dizem ver muitos motivos para tal.
Primeiramente: as relações turbulentas entre os dois Estados desde a queda do ex-presidente Mohamed Morsi e os subsequentes conflitos no país. Barack Obama preferiu, claramente, distanciar-se, enquanto o presidente eleito parece não se incomodar com a situação no Egito.
Em segundo lugar, mesmo antes da eleição, houve uma espécie de flerte entre os dois políticos: Trump não fez nenhum segredo de seu apreço por Sisi como fator de estabilidade regional – e o poupou de demandas desagradáveis quanto ao tema dos direitos humanos.
O terceiro ponto: a posição clara de Trump frente à Irmandade Muçulmana, arqui-inimiga de Sisi, deve exercer um papel decisivo. O magnata não a vê como um parceiro difícil de um diálogo necessário, mas sim como uma organização terrorista.
Além de Sisi, a vitória do republicano também deve agradar ao ditador sírio Bashar al-Assad – mesmo que o vencedor das eleições americanas não lhe confira, oficialmente, a mesma estima que o egípcio.
"Eu não gosto de Assad de forma alguma", declarou Trump num de seus duelos televisionados com Hillary Clinton. "Mas" – expressando assim uma restrição muito importante – "Assad está matando o EI!" Ou seja, o chamado "Estado Islâmico".
As atrocidades e crimes a que o povo sírio está exposto diariamente – principalmente por parte de Assad –, não receberam nenhuma menção do magnata republicano. Em Damasco, isso foi visto pelo regime, aparentemente, como uma forma de aproximação cautelosa. "A esperada reviravolta", escreveu o Al-Baath, jornal oficial do partido governista sírio, de forma notavelmente positiva sobre a vitória de Trump.
Outros analistas ligados a Assad e aos seus aliados já se alegram com o fato de que, com Trump, o tema da mudança de poder em Damasco está finalmente fora de cogitação. E, provavelmente, eles têm razão. Pois o político republicano quer combater o EI principalmente porque o grupo terrorista mata cidadãos americanos.
O fato de, ao mesmo tempo, centenas de milhares de árabes, curdos e outros grupos étnicos serem assassinados, tanto por atos criminosos do regime quanto por milícias controladas externamente, deve ser de pouco interesse do novo presidente americano, enquanto Assad não aja violentamente também contra americanos.
Os governos da Arábia Saudita e do Iraque também podem ter esperanças de poder cooperar de forma ao menos relativamente boa com o novo homem à frente da Casa Branca – mesmo que, certamente, nem todas as afirmações políticas e anúncios de Trump sejam do agrado deles.
No entanto, eles não teriam preferido de forma alguma Hillary Clinton. Os sauditas estão principalmente contentes com o fato de que Trump põe agora em questão o acordo nuclear com o arquirrival Irã. E, com a vitória do republicano, o primeiro-ministro iraquiano, Haidar Al-Abadi, espera um apoio ainda maior dos EUA no combate ao "Estado Islâmico".
Vale a pena comparar os parabéns oficiais dos árabes à vitória de Trump com as felicitações cuidadosamente ponderadas que a chanceler federal alemã, Angela Merkel, deu em forma de comunicado de imprensa em frente das câmeras.
Merkel também parabenizou Trump. Mas deixou bem claro que a cooperação deve continuar com base em valores comuns, como a democracia, a liberdade e a dignidade humana. A líder alemã pode se dar ao luxo de uma afirmação tão forte, orgulhosa e autoconfiante, porque ela própria foi eleita de forma livre e democrática.
Por outro lado, as diversas tentativas de aproximação com o futuro presidente americano por parte de estadistas árabes parecem desajeitados gestos de bajulação, principalmente quando se leva em conta que, durante a campanha eleitoral, Trump não fez questão de esconder a sua rejeição a muçulmanos.
Assim, os chefes de Estado árabes não somente apresentam ao seu povo uma imagem patética de si mesmos, mas também se sentem incentivados em suas próprias políticas opressivas, apesar de que, diferentemente de Trump, não tenham chegado ao poder através de eleições livres, justas e democráticas.
Hoje, infelizmente, só pode haver uma constatação: a vitória eleitoral de Trump é um incentivo para os autocratas no mundo árabe. Trata-se de uma tendência perigosa. E outra experiência deprimente para todos que os que lá, no mundo árabe, apesar de todas as dificuldades, continuam a se engajar por reformas.
Naser Schruf é chefe da redação em árabe da DW.