Eu me importo com o futuro, portanto me importo com o clima. Pertenço à vasta maioria dos cidadãos globais que, como demonstram tantas enquetes, está apreensiva com a direção para onde está indo o planeta, e entende a urgência e a natureza existencial da emergência climática iminente. As recentes inundações catastróficas na Europa Central e as temperaturas extremamente elevadas na América do Norte são apenas dois sintomas dessa ameaça.
Então, na minha família, nós fazemos algo a respeito, economizando e apertando o nosso orçamento carbônico: andamos a pé ou de bicicleta, em vez de de carro; comemos drasticamente menos carne do que a família média nos países industrializados; dispensamos aquela viagem transatlântica, mesmo querendo muito; cuidamos para não desperdiçar comida, além de compostarmos nossas sobras.
E aí, um ricaço dá uma volta pelo espaço, só para se divertir. Uma coisa incrivelmente egoísta, ou não? E que realmente desvaloriza, tanto do ponto de vista moral como material, os nossos esforços para proteger o clima.
A motivação para se agir contra a mudança climática definha quando se vê outros fazendo o que lhes dá na telha, sem atentar para as consequências. Para além dessa desmoralização, há a pegada carbônica concreta do turismo espacial.
1 hora e meia no espaço = quase 5 mil km de carro
Vejam só, eu não sou contra viagens espaciais, em princípio. Na verdade, sou até meio nerd da ficção científica, e fico super animada com as possibilidades de explorar o espaço. E sabe-se que todo turismo, mesmo na Terra, resulta em emissões de CO2. Não pretendo dizer que o turismo não deveria existir; mas o problema do turismo espacial é a proporção.
Tomemos como exemplo o voo da Virgin Galactic, de Richard Branson, em 11 de julho. A companhia afirma que as emissões carbônicas dessa volta suborbital de 160 quilômetros correspondem, mais ou menos, às de um passageiro numa viagem transatlântica de jato de ida e volta.
Segundo as informações disponíveis ao público, um voo de Londres a Nova York libera cerca de 1,24 tonelada métrica de CO2. Dito de outra maneira, uma voltinha de uma hora e meia pelo espaço foi o equivalente a dirigir 4.800 quilômetros num automóvel comum.
Se a Virgin Galactic está adicionando toda essa quilometragem de emissões carbônicas por um simples passeio para seis pessoas, isso desvaloriza os esforços de proteção ao clima – tanto do ponto de vista pessoal como da política. O problema pode se tornar especialmente agudo se o turismo espacial disparar, como tudo indica que em breve acontecerá: já foram feitas mais de 200 reservas com a Virgin Galactic, por preços que vão de 200 mil a 250 mil dólares por cabeça.
A empresa de Branson diz que atenta para a sustentabilidade ambiental – embora sem especificar o que isso envolve. Acho essa alegação muito duvidosa, sobretudo perante a pegada carbônica de seus voos.
Pelo menos bilionário Jeff Bezos, da Amazon, não tem só belas palavras para o meio ambiente: os foguetes de sua firma de viagem aeroespacial, a Blue Origin, são movidos a hidrogênio, que não emite dióxido de carbono. Mas não ignoremos o fato de que, embora possa ser produzido usando-se energia renovável, no momento o hidrogênio é gerado basicamente através da queima de – isso mesmo – combustíveis fósseis.
Uma proposta para os cowboys do espaço
É irônico: a imagem do planeta Terra visto a partir de sua órbita – uma joia de vida em meio ao vazio negro do espaço – tem a fama de inspirar o movimento ambiental contemporâneo. E agora a Blue Origin diz que sua visão é fazer o bem à Terra.
Com toda certeza foi essa a motivação para leiloar por 28 milhões de dólares uma passagem em seu voo atual a um super-rico arrematador secreto (o qual depois adiou sua participação para uma viagem futura). É para lá de irônico: eu diria que é cinismo.
Se as companhias de turismo espacial desejam realmente fazer jus às suas alegações verdes, sugiro o seguinte: para cada voo aeroespacial com turistas, que elas invistam uma quantia igual na proteção do clima. Desse modo, ricaços podem ter o barato deles, enquanto nós também tentamos consertar o clima.
O turismo espacial só deveria ser possível em troca de uma megacompensação, que garantisse um futuro nesta cintilante joia azul, verde e marrom. Afinal de contas, ela é a fonte das nossas vidas, e o único planeta capaz de nos manter.
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Sonya Diehn é jornalista da DW. O texto reflete a opinião pessoal da autora, não necessariamente da DW.